Depois de obterem no Superior Tribunal de Justiça (STJ) decisão que isenta do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) os produtos dados em bonificação (gratuitos), as indústrias conseguiram outra importante vitória na disputa contra os Estados. A 1ª Turma entendeu que as empresas também têm o direito de reaver os valores recolhidos indevidamente nos últimos dez anos.
A isenção foi garantida em recurso repetitivo julgado em 2010 pela 1ª Seção do STJ. O caso analisado era de uma indústria de cosméticos. A bonificação é uma modalidade de desconto que consiste na entrega de uma maior quantidade de produtos em vez de conceder uma redução no valor da venda.
Agora, a 1ª Turma garantiu à Danone o direito de usar créditos do ICMS dos últimos dez anos no cálculo do imposto a ser recolhido. "Muitas empresas não desembolsaram o dinheiro para recolher o imposto sobre as saídas por bonificação, mas lançaram os créditos em sua contabilidade. E, agora, querem usá-los", diz o advogado Daniel Szelbracikowski, da Advocacia Dias de Souza.
Segundo advogados, a decisão do STJ é um importante precendente para as indústrias, que têm investido cada vez mais em promoções do tipo "leve 3 pague 2" para alavancar a venda de seus produtos em supermercados. No caso da Danone, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) reconheceu que não deveria ser cobrado ICMS sobre mercadorias dadas em bonificação. Mas negou à companhia o direito de recuperar o imposto.
A discussão jurídica gira em torno do artigo 166 do Código Tributário Nacional (CTN). A restituição de tributos que são repassados no preço ao consumidor - como o ICMS ou o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) - não é autorizada. A norma abre, porém, duas exceções: quando o contribuinte prova que não repassou o tributo no preço ou quando há autorização daquele que, de fato, arca com o custo do imposto - o consumidor, por exemplo.
O entendimento do TJ-SP é que para reaver o dinheiro, a Danone deveria provar que não repassou ao consumidor o ICMS nas vendas por bonificação. Ou seja, que não incluiu o imposto no preço final da mercadoria.
Para os ministros da 1ª Turma do STJ, porém, a previsão do artigo 166 não pode ser aplicada aos casos em que a mercadoria é repassada ao consumidor gratuitamente. Isso porque, de acordo com a interpretação do relator do caso, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, não foi cobrado nenhum valor, logo não há imposto a ser recolhido ou repasse do ônus a terceiros. "O STJ acertou em cheio no conceito das operações", diz o tributarista Igor Mauler Santiago, do Sacha Calmon Misabel Derzi Consultores e Advogados.
A Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo informou que vai definir se recorrerá da decisão após a publicação do acórdão do STJ.
Para advogados, a decisão poderá ter reflexos em duas outras discussões travadas no Judiciário. A primeira é sobre a restituição do IPI nas saídas de produtos por bonificação.
Em março de 2009, a 1ª Turma do STJ decidiu que uma empresa poderia reaver os valores pagos indevidamente de IPI. Em agosto de 2011, a 2ª Turma da Corte, porém, teve entendimento diferente, no sentido de que a fabricante só teria direito à devolução se provasse não ter repassado o custo do imposto no preço.
A decisão recente poderá ter reflexo ainda na discussão sobre a possibilidade de retirar os bens oferecidos de graça do cálculo do ICMS recolhido por meio de substituição tributária. Por esse regime, o fabricante antecipa o pagamento do imposto para todos os envolvidos na cadeia de consumo. "O entendimento do STJ nesse caso é desfavorável ao contribuinte. Os ministros entendem que as mercadorias devem ser incluídas no cálculo", diz o advogado Aldo de Paula Junior, do escritório Azevedo Sette.
Procurada pelo Valor, a Danone não retornou até o fechamento da edição.
Por Bárbara Pombo | De Brasília
Fonte: Valor Econômico (07.05.13)