BC vira regulador do mercado de cartões

Leia em 4min 40s

O Banco Central (BC) passou ontem a ser, oficialmente, o "xerife" de todos os agentes do mercado de pagamentos eletrônicos e não apenas dos bancos. A Medida Provisória nº 615, publicada no Diário Oficial da União, deu poder à autoridade monetária para regulamentar e fiscalizar, entre outras, empresas como as bandeiras de cartões (Visa e MasterCard, por exemplo) ou as credenciadoras de pagamentos eletrônicos (como Cielo e Redecard). Paralelamente, a MP também lançou as primeiras bases legais para o desenvolvimento dos pagamentos móveis, via dispositivos como o celular.

 

"Faltava ao BC esse mandato legal de regulamentar o setor de credenciamento de lojistas", afirmou o diretor de política monetária do Banco Central (BC), Aldo Mendes, em entrevista coletiva sobre a medida. "Havia uma assimetria de regulamentação. Com a MP, o BC normatiza não apenas um lado do mercado [as instituições financeiras que emitem os cartões]."


A própria autoridade monetária já havia sinalizado, no ano passado, que ampliaria o escopo de sua supervisão sobre o setor de cartões. A questão agora é quão profunda será a interferência do BC nesse mercado. Em 180 dias, o Conselho Monetário Nacional (CMN) deve publicar a regulamentação da medida, podendo realizar consulta pública sobre os atos normativos que serão editados. O Congresso tem até 120 dias para apreciar uma MP.


Segundo Mendes, a autoridade vai encaminhar uma proposta ao CMN definindo quais arranjos de pagamento têm importância sistêmica e, portanto, serão regulados pelo BC.

 

Por "arranjos de pagamentos", entenda-se a série de procedimentos montados entre bancos emissores de cartões, bandeiras, credenciadores, lojistas e consumidores que regem o funcionamento do mercado de pagamentos eletrônicos.


Mendes afirmou que em alguns desses "arranjos", não é necessária uma regulação tão pesada. É o caso, por exemplo, dos cartões de lojas ("private label", em inglês) e as moedas sociais, situações em que não há importância sistêmica. "São meios restritos a um ambiente pequeno", afirmou.


Com os poderes que ganhou na medida, o BC poderá, se julgar necessário, regular também atuação de operadoras de telefonia em pagamentos eletrônicos, as empresas que oferecem vales-refeições e outras companhias não-financeiras que atuam em cartões, como as administradoras de cartões pré-pagos.


Isso significa que a autoridade passa a ser capaz de aprofundar a abertura do mercado de cartões, iniciada em 2010, com o fim das exclusividades de captura entre Cielo/Visa e Redecard/MasterCard. Em outubro do ano passado, o próprio Aldo Mendes pressionou pelo fim dos acordos exclusivos de captura remanescentes entre credenciadoras e empresas de vale-alimentação. Hoje, por exemplo, os vales da Alelo (antiga Visa Vale) só são capturados pela Cielo. A MP também dá poderes para que o BC possa intervir sobre taxas como as que as credenciadoras cobram de lojistas, entre outras tarifas.


A MP 615 também muda a regulamentação do sistema de pagamentos brasileiro para incluir oficialmente a possibilidade de empresas de telecomunicações oferecerem serviços de "mobile payment" (pagamentos por meio de dispositivos móveis, como celulares). As quatro maiores operadoras de telefonia do país já têm algum tipo de produto na área de pagamentos móveis, seja cartão de crédito ou pré-pago. Claro, Tim e Oi têm parcerias com bancos. Já a Vivo /Telefônica tem com a Mastercard uma "joint-venture".


Segundo o texto da medida, o BC, o CMN, o Ministério das Comunicações e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) serão responsáveis por "adotar medidas de incentivo ao desenvolvimento de arranjos de pagamento que utilizem terminais de acesso aos serviços de telecomunicações de propriedade do usuário". O objetivo da autoridade, expresso na medida, é avançar no processo de inclusão financeira no Brasil.


O Ministério das Comunicações reforçou essa meta. O secretário de telecomunicações da pasta, Maximiliano Martinhão, disse, em entrevista coletiva, que a intenção do governo é usar a capilaridade das empresas do setor para ampliar a oferta de serviços financeiros a uma parte da população brasileira que não tem acesso a bancos. "Essa é uma agenda importante para o país porque permitirá que um número grande de pessoas alheias ao sistema financeiro possa ter acesso a meios de pagamentos eletrônicos", afirmou.


O secretário avaliou que a população brasileira está preparada para essa tecnologia. Os pagamentos via celulares, segundo ele, serão tão fáceis como enviar um SMS. Atualmente, são enviados 260 milhões de SMS por dia, segundo Martinhão.


Mendes, do BC, reforçou que a MP permite que empresas não-financeiras façam parte do universo de pagamentos móveis. Tanto que a medida cria a "conta de pagamento móvel", que será uma espécie de conta corrente eletrônica para os clientes de pagamentos móveis. As tais "contas de pagamento" não se confundem com contas bancárias e não dependem delas para ser abertas junto a instituições que vão tornar disponível o novo serviço. O dinheiro depositado nessas contas eletrônicas será apartado dos ativos próprios da empresa, não podendo ser oferecido em garantia de nenhuma operação e ficando fora da massa falida em caso de liquidação.


Não há ainda previsão de uma garantia individual aos portadores da "contas de pagamento". Em princípio, elas não são cobertas pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC) porque não são contas bancárias, mas o BC estuda maneiras de criar tais seguranças.


Por Felipe Marques, Mônica Izaguirre e Murilo Rodrigues Alves | De São Paulo e Brasília

 

Fonte: Valor Econômico (21.05.13)

 

Segue o link para a íntegra da Medida Provisória nº 615:

 

 


 


Veja também

Quem reduzir consumo de energia terá bônus na conta, diz secretário

Bônus será para quem economizar 10% de energia com relação a 2020   O Brasil passa pel...

Veja mais
Confaz prorroga até 31 de dezembro a isenção de ICMS sobre transporte no enfrentamento à pandemia

Convênios prorrogados também amparam empresas, autorizando que os estados não exijam o imposto por d...

Veja mais
Mapa estabelece critérios de destinação do leite fora dos padrões

PORTARIA Nº 392, DE 9 DE SETEMBRO DE 2021   Estabelece os critérios de destinação do le...

Veja mais
Empresa não deve indenizar por oferecer descontos apenas a novos clientes

Não há vedação legal para que fornecedores de serviços ofereçam descontos apen...

Veja mais
Justiça do Trabalho é incompetente para execução das contribuições sociais destinadas a terceiros

A 9ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ), ao julgar um agravo de petiç&...

Veja mais
Corte Especial reafirma possibilidade de uso do agravo de instrumento contra decisão sobre competência

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu embargos de divergência e reafirmou o entend...

Veja mais
Partidos questionam MP sobre remoção de conteúdo das redes sociais

Seis legendas buscam no STF a suspensão dos efeitos da norma assinada pelo chefe do Executivo federal.   O...

Veja mais
Consumo das famílias cresce 4,84% em julho, diz ABRAS

Cebola, batata e arroz foram os produtos com maiores quedas no período   O consumo das famílias bra...

Veja mais
Lei que prorroga tributos municipais na epidemia é constitucional, diz TJ-SP

Inexiste reserva de iniciativa de projetos de lei versando sobre matéria tributária, a teor do dispos...

Veja mais