A Medida Provisória 615 publicada em maio, que regulamenta o sistema de pagamento móvel e autoriza as operadoras de telecomunicações a oferecer esses serviços, estabeleceu parâmetros para o m-payment, que até agora caminhava meio timidamente apoiado em parcerias fechadas entre operadoras de telecom e instituições financeiras. Com a organização do setor, o mercado agora pode dar impulso a iniciativas que ainda estão sendo testadas comercialmente.
Só a meta de inclusão financeira pode atrair cerca de 56 milhões de pessoas que movimentam um bolo de R$ 600 milhões ao ano, têm mais acesso a dispositivos móveis do que a contas bancárias e estão acostumadas a lidar com cartões pré-pagos recarregáveis, as bases do sistema de m-payment, em grande parte focado em soluções no mesmo modelo usado para as 8 milhões de recargas de celulares diárias no país.
A expectativa é que o sistema use a capilaridade das teles e alcance pelo menos metade das 260 milhões de linhas de celulares ativas. Como os volumes são brutais, a meta é manter tudo barato pelo celular e partir para a massificação e para a interoperabilidade. Isso pode ajudar a derrubar também o custo de transações para pequenas empresas que ainda evitam o sistema. "A falta de interoperabilidade entre plataformas é uma das barreiras", diz Renato Pasquini, líder de telecomunicações da Frost & Sullivan.
Outros obstáculos são o ecossistema ainda embrionário para aplicações móveis que demandam terminais e as máquinas no pontos de vendas, os POS, a falta de confiança do consumidor na segurança de serviços digitais e o custo do desenvolvimento e implementação das aplicações.
O segmento tem sido alvo de discussão entre os diferentes players. "Ninguém vê, mas bancos, operadoras e cartões estão em uma verdadeira mobile fobia", descreve o diretor executivo de produtos Percival Jatobá, da Visa. "Mas ainda não se chegou a um modelo que conjugue todos os interesses." O que ele chama de "revolução silenciosa" fez surgir um extenso número de iniciativas, duas delas dias antes da publicação da MP - o Zumm pela MFS, joint venture entre Vivo e Mastercard, e o Oi Carteira, fruto da joint venture entre a operadora e a Cielo em parceria com o Banco do Brasil. Os dois são pré-pagos e revertem as tarifas cobradas por operações em minutos para celulares.
O Zumm é um serviço de pagamento via celular que dá acesso a conta pré-paga por tecnologia Unstructured Supplementary Service Data (USSD), que cria uma sessão em tempo real com a operadora e elimina a possibilidade de delay, o retardo de sinais, do SMS. O usuário pode adquirir também cartão pré-pago MasterCard para acesso à mesma conta, para compras e saques. O usuário paga R$ 0,99 por transferência e R$ 6 por retirada. Mas o sistema mira só pessoas físicas. "Se for empresa tem de ter um POS", diz o presidente da MFS, Marcos Etchegoyen.
O cartão pré-pago recarregável Oi Carteira funciona no celular e no cartão. "O sistema funciona com SMS, passando por canal prioritário", diz o diretor de segmentos da operadora, Eduardo Aspesi. A tarifa mensal é de R$ 8 e a emissão do cartão R$ 10.
A Oi lançou seu primeiro cartão de crédito no celular, o Oi Paggo, em 2007, e tem parceria com o Banco do Brasil desde 2011, para emissão de cartão de crédito tradicional e por celular que atingiu 600 mil emissões em fevereiro último. As máquinas da Cielo são habilitadas para aceitar a transação móvel, mas os interessados em eliminar este custo agora podem receber pagamentos por transferência com o Oi Carteira.
MasterCard e Cielo protagonizaram outros lançamentos deste ano. A primeira apresentou a carteira digital móvel PayPass, em parceria com Itaú, Tim e Redecard, que permite compra digital com cartões pré-cadastrados por celular por browser ou por tecnologia de aproximação (NFC, na sigla em inglês). Depois apresentou iniciativa de mobile money que funciona em qualquer telefone e visa o público não bancarizado, em acordo comercial com Tim e Caixa Econômica Federal. "Até o fim do ano será lançada a Masterpass, carteira que integra todos os canais", diz o vice-presidente de produtos para Brasil e Cone Sul Marcelo Tangioni.
A Cielo oferece desde 2010 o Cielo Mobile, aplicativo gratuito para permitir vendas com cartões por dispositivos móveis disponível para iOS, Android e BlackBerry e que já teve mais de 100 mil downloads. A taxa de filiação custa R$ 60, com tarifa mensal de R$ 11 no primeiro ano e R$ 21 nos seguintes. A companhia tem mais de 500 mil máquinas habilitadas a receber transações por aproximação.
A tecnologia é utilizada pela Visa, que criou em 2008 o MobilePay em parceria com Banco do Brasil e Cielo para captura transações por site, celular ou POS a partir da digitação do número do célula e, depois, o Visa PayWave, sistema NFC com Banco do Brasil, Bradesco e Claro usando celulares Nokia - agora, sua parceira em dispositivos é a Samsung. Para Percival Jatobá, as iniciativas mostraram a necessidade de segurança, conveniência e interoperabilidade. "Não consigo ver ninguém brigando nesta questão para ser unilateral", diz.
"A interoperabilidade é menor em telecom, mas tem de ser plena", diz o diretor da área de cartões do Itaú, Marcos Magalhães. A instituição avalia iniciativas como QR Code, códigos que podem ser lidos por celular, para pagamento de varejistas on-line, como a Cultura e o Polishop, com 30 mil clientes habilitados e tecnologia Mastercard, e carteira digital para e-commerce, associada a cartão e viabilizada por celular - com base em protocolo aberto de troca de mensagem, atende a qualquer operadora.
O Bradesco, por sua vez, firmou parceria com a Claro no fim do ano passado. Da iniciativa surgiram o Bradesco Celular via SMS, com serviços como saldo e recargas pelo celular; um cartão pré-pago co-branded, que permite pagamentos, com foco no público não bancarizado; e testes de pagamentos via NFC com cartões Bradesco nos celulares Claro. Em breve será anunciado piloto do banco com Tim e Cielo, com bandeira Visa.
Por Martha Funke | Para o Valor de São Paulo
Fonte: Valor Econômico (31.05.2013)