Para a Juíza, o salário é um direito indisponível e não cabe aos sindicatos a determinação da realização de descontos obrigatórios, sem amparo legal e sem o consentimento expresso do empregado.
“A cobrança de contribuição confederativa e assistencial ou qualquer outra com o mesmo objetivo, como o ‘desconto negocial’, objeto da presente demanda, de empregados não sindicalizados, ainda que prevista em norma coletiva (ou Termo Aditivo à CCT), e o seu recolhimento pelo empregador, através de descontos nos salários dos empregados, sem a expressa autorização, ofende a liberdade de associação e sindicalização protegida pela Constituição Federal, nos artigos 5º, XX e 8º, V. No mesmo sentido, o Precedente Normativo 119 e OJ 17, ambos da SDC do C. TST, e Súmula Vinculante 40 do STF”.
Com esse entendimento, a Juíza Priscila Rajão Cota Pacheco, na 16ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, julgou improcedentes os pedidos formulados pelo Sindicato dos Oficiais Alfaiates, Costureiras e Trabalhadores nas Indústrias de Confecções de Roupas, Cama, Mesa e Banho de Belo Horizonte e Região em Metropolitana em face de uma confecção de roupas da capital.
O sindicato pedia o repasse, pela ré, de valores relativos a contribuições de desconto negocial (cota negocial) previstas em termo aditivo à convenção coletiva, nas porcentagens de 2% dos salários dos empregados de outubro, 1,5% de porcentagem referente a novembro e 1,5% de dezembro do ano de 2019. Em defesa, a confecção argumentou que jamais foi notificada a fazer a retenção da cota negocial ou o desconto e o repasse. Sustentou, ainda, não haver obrigatoriedade de uma contribuição negocial a empregados não sindicalizados em favor de entidade sindical, invocando violação do princípio da livre associação.
Ao analisar os documentos dos autos, a julgadora constatou que o sindicato-autor ajuizou ação em face do Sindicato das Indústrias do Vestuário de Minas Gerais. Em audiência de mediação de conciliação pré-processual, as partes firmaram um termo aditivo à convenção coletiva, prevendo o desconto, pelas empresas empregadoras da categoria, de parte dos salários dos empregados, para custeio do sindicato profissional e em decorrência da negociação coletiva.
No entanto, a Magistrada não encontrou prova de que tenha havido a homologação da mediação, não reconhecendo o título judicial. Ainda conforme observou, não houve prova do registro do termo aditivo nos órgãos competentes para o registro da convenção coletiva de trabalho. Esses documentos não foram apresentados nos autos.
Por outro lado, a Magistrada destacou não haver obrigação de recolhimento de contribuições que não possuam natureza tributária, como no caso, para empregados não associados, conforme jurisprudência. Nesse sentido, apontou a Súmula 666 do STF, com previsão de que: "A contribuição confederativa de que trata o artigo 8º, IV, da Constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo".
Valendo-se do princípio da livre associação (artigo 5º, XX e artigo 8º, V, da CR/88), pontuou que empregados não sindicalizados não podem sofrer os descontos mencionados. A exemplo da contribuição confederativa, a contribuição assistencial, a contribuição social e o "desconto negocial", instituídos pelos sindicatos, somente podem ser exigidos de seus filiados.
Desconto impositivo ilegal - Na decisão, a Magistrada chamou a atenção para o fato de o sindicato-autor não ter indicado empregados sindicalizados pertencentes à empresa ré, rejeitando a possibilidade de desconto também por esse motivo. A julgadora também ressaltou que o desconto impositivo ilegal no salário do empregado fere o princípio da intangibilidade salarial previsto no artigo 462, caput, da CLT, bem como o preceito constitucional da irredutibilidade salarial, estipulado no artigo 7º, VI, da Constituição Federal de 1988.
“O salário é um direito indisponível, não cabe aos sindicatos versarem sobre tal direito, sobretudo no que tange à remuneração do empregado, determinando a realização de descontos obrigatórios nos salários, sem o consentimento expresso do trabalhador”, registrou na sentença.
Com relação à previsão de oposição trazida pelo termo aditivo, no prazo de 20 dias, entendeu não suprir a questão de manifestação voluntária na sindicalização. A julgadora registrou que a manifestação em contrário, por si só, não tem o condão de legitimar a cobrança, devida apenas pelos sindicalizados, sobretudo após o Precedente Normativo 74 do TST.
Natureza jurídica da contribuição - A Magistrada repudiou o argumento da empresa de que o sindicato não teria observado os requisitos legais para a constituição do crédito. É que, conforme explicou, a parcela objeto da ação, denominada “desconto negocial”, não possui a natureza jurídica de crédito tributário. Desse modo, os preceitos legais estabelecidos nos artigos 142 a 145, do Código Tributário Nacional, não precisam ser cumpridos, para a constituição e formação de crédito.
Conforme esclareceu, no texto celetista vigente antes da Lei 13.467/2017, admitia-se quatro tipos de contribuição para as entidades sindicais: a contribuição sindical (artigo 578 da CLT), a contribuição confederativa (inciso IV, do artigo 8º da CR/88), a contribuição assistencial (alínea "e", do artigo 513, da CLT) e a mensalidade sindical. Destas, apenas a contribuição sindical era obrigatória para toda a categoria, independentemente da filiação, por possuir natureza tributária (até a vigência da Lei 13.467/2017). Assim, a única contribuição prevista em lei é a contribuição sindical e daí advém sua natureza tributária, parafiscal, obrigatória.
“As contribuições confederativas e assistenciais ou cotas negociais têm natureza jurídica contratual, requerendo, portanto, apenas o acordo de vontades entre as partes envolvidas, com cobrança sem observância no trâmite tributário”, explicitou.
Quanto à exigência de publicação de editais, prevista no artigo 605 celetista, pontuou se tratar de condição essencial à eficácia do procedimento de recolhimento da contribuição sindical, para cumprimento do princípio da publicidade, também não sendo necessária no caso, que tem natureza jurídica diversa.
Não cabe mais recurso da decisão. O processo foi arquivado definitivamente.
Processo
PJe: 0010196-74.2020.5.03.0016 — Data: 26/06/2020.
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Fonte: TRT 3ª Região – 20/10/2020