A atualização monetária configura recomposição do valor da moeda corroído pela inflação, sem traduzir efetivo ganho ou remuneração do capital. Assim, sua ocorrência nas aplicações financeiras não pode ser alcançada pela incidência do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
Essa foi a tese proposta pela ministra Regina Helena Costa à 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça na terça-feira (14/4), em caso que busca definir se é legítima a incidência da tributação sobre a parcela correspondente à inflação verificada nos rendimentos de aplicações financeiras.
A tese foi apresentada como proposta de mudança jurisprudencial. Até então, tanto a 1ª como a 2ª Turma do STJ, que julgam matéria de Direito Público, entendiam como possível essa tributação, porque a diferença de correção monetária acrescentaria valor nominal da moeda. Ainda assim, essa posição variou ao longo dos anos e conforme transformações econômicas do país.
O voto da ministra Regina ocorreu no segundo pedido de vista no caso, o que deu acesso aos autos de forma coletiva a todos os integrantes da 1ª Turma. Ainda assim, pela relevância e inovação da tese, os ministros decidiram prorrogar a análise se aproveitando do fato de que o prazo regimental para a vista ainda não havia se exaurido.
O relator do recurso é o ministro Napoleão Nunes Maia, que se aposentou em dezembro de 2020. Em maio daquele ano, ele já desafiou a jurisprudência das turmas ao dar provimento monocraticamente ao recurso. Curiosamente, em outubro ele relatou outro precedente (REsp 1.581.332) no qual a 1ª Turma confirmou posição contrária, admitindo essa tributação. Na 2ª Turma, o precedente é o REsp 1.899.212.
Em 24 de novembro, ao levar o caso ao colegiado, o relator negou provimento ao agravo interno da empresa contribuinte. O ministro Gurgel de Faria pediu a primeira vista e, em fevereiro de 2021, divergiu para reconduzir o caso conforme a jurisprudência pacífica das turmas de Direito Público do STJ. Ainda não votaram os ministros Benedito Gonçalves e Sérgio Kukina.
Não é para todo caso
Conforme voto da ministra Regina Helena Costa, cobrar IPRJ sobre a correção monetária em rendimentos financeiros fere o artigo 43 do Código Tributário Nacional, que define tributação sobre renda que tenha como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica decorrente de acréscimo patrimonial.
Seu afastamento, no entanto, só deve ser admitido no caso em que for possível decotar do valor total o montante referente à correção monetária. Isso não ocorre em todas as modalidades de aplicações financeiras.
O voto trata exclusivamente do Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica porque, embora a impetração tenha abrangido também a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), esse último tributo não foi questionado nas razões pela empresa contribuinte.
A ministra usou o princípio da capacidade contributiva e doutrina sobre a matéria para concluir que a correção monetária decorrente da inflação provoca crescimento nominal dos valores, acarretando enriquecimento falso. Sua tributação significa ignorar a efetividade da capacidade de contribuir a ser considerada.
"A meu sentir, tal ajuste consubstancia desdobramento do princípio constitucional de proteção à propriedade, voltado à preservação do valor do dinheiro diante da depreciação inflacionária. Não atualização do capital provoca aumento do imposto em analise por via oblíqua, desconsiderado efeito inflacionário verificado no período, estar-se-á gerando uma capacidade contributiva irreal ficta e, consequentemente, tributação injusta", explicou.
REsp 1.660.363
Danilo Vital – Correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 15/04/2021