Aproximadamente um terço da produção global de alimentos é desperdiçada, segundo dados da FAO. Esse dado bem feio contrastou com a bela paisagem do Museu de Arte do Rio (MAR), que recebeu o Seminário Sem Desperdício, no dia 31 de outubro. Mais de 40 instituições de diferentes elos da cadeia agroalimentar estiveram representadas no evento, aberto pelo Diretor de pesquisa e desenvolvimento da Embrapa Celso Moretti. A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) e a Associação Brasileira de Embalagens (Abre) anunciaram durante o encontro o compromisso de fortalecer o engajamento dos setores no combate ao desperdício.
Os vídeos com as palestras do seminário, que teve inscrições esgotadas e foi transmitido ao vivo pela internet, estão disponíveis no perfil da iniciativa Sem Desperdício, no Facebook.
“O varejo tem o papel de comunicar-se tanto com o produtor rural quanto com o consumidor urbano. Somos um elo importante no combate ao desperdício e a convenção da Abras, em 2018, pode abrir espaço para os parceiros envolvidos no tema de redução do desperdício”, salienta Marcio Milan, superintendente da Abras.
Para Luciana Pellegrino, diretora da Abre, que representa 200 empresas de toda cadeia produtiva de embalagens, o setor pode contribuir com a redução do desperdício com aplicação de mais tecnologia e educação do consumidor. “Ofertar porções individuais, embalagens que refecham e ampliam tempo de vida dos produtos ajudam o consumidor a consumir tudo o que compra”, destaca. A diretora ressaltou ainda a importância do setor estar engajado em iniciativas como a Save Food e elogiou a ação da Embrapa e parceiros no projeto dos Diálogos Setoriais União Europeia – Brasil.
Estratégias governamentais
A preocupação dos governos com a má utilização dos alimentos ainda é recente, boa parte dos programas que visa combater a prática surgiu há menos de 10 anos. A plataforma da Comunidade Europeia sobre desperdício foi criada em 2016. Na Espanha, por exemplo, a estratégia Mais Alimento, Menos Desperdício começou em 2013, mesmo ano no qual a França (veja as iniciativas francesas em www.agriculture.gouv.fr/antigaspi) passou a encarar o tema. Os franceses pretendem reduzir pela metade o desperdício até 2025, em consonância com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 12.3, “reduzir pela metade até 2030 o desperdício de alimentos per capita mundial, em nível de varejo e do consumidor, e reduzir as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo as perdas pós-colheita”. Por sinal, a Embrapa é integrante da coalização global pela ODS 12.3.
Os principais vilões da perda e desperdício de alimentos são a armazenagem e transporte inadequados e os maus hábitos dos consumidores. “Nos países mais desenvolvidos o comportamento da população é o principal fator, enquanto nos países mais pobres armazenagem e transporte têm peso maior”, revelou o representante da FAO no Brasil, Alan Bojanic. Entre os “maus hábitos” de quem compra alimentos está a rejeição aos alimentos com aparência incomum. A FAO tem incentivado o consumo de frutas ou hortaliças amassadas/feias. No Rio de Janeiro, as cadeias de supermercados Superprix e Zona Sul também aderiram à causa. No Superprix, a campanha “As Aparências Enganam” ajuda crianças e jovens de comunidades locais. A rede disponibiliza beterrabas, batatas doce, inhames, chuchus e cenouras de aparência incomum, mas alto valor nutritivo, com 30% de desconto. Já o Zona Sul, como parte da iniciativa Zona Sul Sustentável, utiliza os alimentos “feios“ no refeitório dos empregados.
Por sinal, como os supermercados são responsáveis pela compra de 70% das frutas e hortaliças no Brasil é vital envolvê-los. Nestes estabelecimentos quem mais sofre com as perdas são frutas, legumes e verduras, o que contribui para que 2.10% do faturamento líquido seja perdido. “Quase 18% do que o Brasil produz com cítricos de mesa, laranja, limão e tangerina, é desperdiçado na hora da colheita”, revelou Márcio Milan, superintendente da Abras. O setor tem mostrado preocupação com o assunto, atualmente quase 60% das cadeias possuem uma área de prevenção de perdas. Outra demanda dos supermercados é uma legislação mais amigável em relação às doações. Por sinal, na França, lojas de varejo acima de 400m2 são proibidas de destruir alimentos.
Ainda pouco conhecidos no Brasil, mas de importância reconhecida pela FAO e muito presentes na Espanha, os bancos de alimentos podem ajudar muito no melhor aproveitamento dos recursos naturais. Eles aprimoram os processos de captação e distribuição dos alimentos doados, para proporcionar maior efetividade, com redução das perdas. A Rede Brasileira de Bancos de Alimentos, que conta com o apoio da Embrapa, contabiliza 228 destes bancos (107 públicos e 111 privados). “Nossa preocupação não é apenas com o combate à fome, também promovemos a alimentação saudável”, revelou Kathleen Machado, coordenadora-geral de Equipamentos Públicos do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA).
Diálogos Setoriais
O seminário faz parte de projeto aprovado pela plataforma Diálogos Setoriais, parceria estratégica entre União Europeia e Brasil para favorecer o intercâmbio de conhecimentos, experiências e melhores práticas sobre temas de interesse mútuo, e foi enquadrado na categoria Top-Down por se tratar de área prioritária e de diálogo político de alto nível entre os governos envolvidos. O projeto é coordenado pela Embrapa em parceria com a WWF Brasil.
Fonte: Grupo Cultivar