Dança das cadeiras no mercado varejista brasileiro aponta para novos domínios de redes em meio a expansão dos atacarejos
A negociação para a venda de 24 lojas da rede de atacado Makro, localizadas em São Paulo, para o Grupo Muffato avançou nas últimas semanas, e inclui, além dos pontos, a sede da rede e o centro de distribuição em Cajamar (SP). Os representantes do Makro iniciaram as sondagens a potenciais interessados avaliando os ativos em cerca de R$ 3 bilhões, mas o mercado projeta que o negócio deve ser fechado num preço abaixo desse patamar, na faixa dos R$ 2 bilhões.
Também há informações circulando no mercado de que o Grupo Pereira, dono da Fort Atacadista, teve interesse na operação, chegou a tratativas iniciais, mas o Muffato teria tido a preferência e acelerado as conversas no último mês.
Há uma expectativa de que a transação com o Muffato possa ser fechada nas próximas semanas, caso as conversas continuem avançando no ritmo atual. O Santander assessora os donos do Makro, o grupo holandês SHV, como antecipamos em abril. Se o acordo for concluído, será a entrada na capital paulista do Muffato, controlado pela família de mesmo nome, pois a empresa passaria a ter pontos nos bairros do Butantã, Lapa, Interlagos e Vila Maria.
Até o momento, o Muffato, com 82 unidades no país, opera apenas no interior de São Paulo e no Paraná, onde lidera o mercado de varejo alimentar. Cerca de 80% de seus pontos estão no Sul. No interior paulista, o Muffato tem sete unidades da bandeira Max Atacadista e nove do Super Muffato. Procurados, Muffato, Makro e Santander não comentaram o assunto.
Esse movimento deve ser um novo fator de pressão para o mercado de atacarejo em São Paulo, o maior e mais concorrido do país. Dois executivos de redes rivais ouvidos dizem que nem todos os pontos à venda são cobiçados, mas as unidades no Butantã e Vila Maria são lojas “bem competitivas”.
O aumento da força do Muffato no Estado não deve mexer só com o segmento de atacarejo, mas tornaria a rede mais combativa também em supermercados. Quem ficar com as lojas do Makro adiciona em vendas anuais (e em poder de barganha com a indústria) cerca de R$ 3 bilhões (o mesmo valor pedido pela operação).
Se o Muffato levar o negócio, pulará da sexta posição geral do ranking para o quinto lugar, superando os Supermercados BH, e logo atrás do Grupo Mateus. Também se distanciaria mais do Pereira, sétimo na lista geral. Os dados consideram o faturamento das redes em 2021, publicado pelo ranking da Abras, a entidade do setor.
“Ainda seria uma forma de o Muffato mostrar ao mercado que não deve ficar parado vendo a Cencosud voltar a crescer”, diz o CEO de uma rede concorrente. A empresa descolaria dos chilenos da Cencosud, que subiu no ranking e praticamente empatou em vendas com o Muffato após a compra do Giga Atacado, concluída neste mês, por R$ 500 milhões.
Segundo uma fonte, a Cencosud foi sondada pelo Santander para apresentar proposta pelo Makro, mas não houve interesse. Em entrevista neste mês, Sebastián Los, presidente da Cencosud no país, disse que a empresa não avaliaria o ativo.
É pouco provável que a venda do Makro chegue nos R$ 3 bilhões pedidos, por conta de litígios judiciais e porque o Muffato identificou sobreposição de algumas lojas da rede com o Makro em São Paulo. Por isso, vem sendo negociada uma soma menor, de até R$ 2 bilhões, dizem fontes. O acordo inclui 16 postos de combustíveis.
Aquisições e a disputa, posição a posição, são um capítulo à parte nas movimentações do setor. Outra negociação foi fechada dias atrás no mercado, apurou o Valor. Trata-se da venda de um ponto do Makro ao Grupo Pereira, localizado em Campo Grande (MS). O Pereira confirma a transação.
É sabido que os valores de mercado das cadeias caíram, e os projetos de crescimento têm sido analisados com critério maior, em parte pela lenta retomada econômica. Só que as operações hoje em andamento avançam por outras razões.
O Makro não quer esperar uma melhora de preço para deixar o país, por isso, aceita negociar condições até determinado limite, diz uma pessoa a par do assunto. Se realmente mantiver essa estratégia e concluir a venda, será a saída definitiva da empresa do Brasil, após já ter vendido parte da operação ao Carrefour em 2020.
A rede holandesa chegou no país 50 anos atrás, mas na última década, o forte crescimento de Assaí e Atacadão e a aceleração do mercado de atacarejo, negócio que ela demorou a explorar no país, acabou levando a empresa a perder competitividade e mercado.
“Para quem compra, o fator positivo é que não há tanta concorrência, porque Atacadão e Assaí já não queriam essas lojas do Makro mesmo. Para quem vende, não é uma boa hora porque os ‘valuations’ ainda estão bem descontado s. Só que é preciso entender que as empresas estrangeiras têm suas próprias estratégias de saída dos mercados”, diz um consultor.
O Muffato foi criado a partir de um pequeno armazém de secos e molhados, em Cascavel (PR), por José Carlos Muffato em 1974. Hoje é gerido pelos sócios e filhos do fundador. A empresa alcançou R$ 10,5 bilhões em faturamento em 2021, alta de 17% sobre 2020, acima da média do setor, e de grupos líderes como GPA e Carrefour.
Fonte: Adriana Mattos, Valor