Colheita do agave azul, base da tradicional bebida mexicana, continua a ser realizada no país sem qualquer implemento mecânico
Contra o céu laranja escuro e azul que caracteriza os altiplanos do noroeste do México em Jalisco, Armando Acevez estica o corpo e leva a manga da camisa à testa suada, para enxugá-la. As mãos calejadas são retratos ásperos de quase duas décadas dedicadas ao cultivo nesse terreno impiedoso.
Acevez é um jimador. Cultiva as plantas do agave azul, cujo néctar serve como combustível para a lucrativa indústria da tequila. A colheita do agave, que continua a ser realizada sem qualquer implemento mecânico, não mudou desde 1600, quando a bebida foi inventada pelos conquistadores espanhóis. Passa de uma geração para outra, garantindo que a colheita da tequila não sofra ameaças da mecanização.
Mas as tradições do jimador, uma figura ainda envolta em mística romântica na literatura e até nas telenovelas mexicanas, está lentamente desaparecendo. Embora a demanda por tequila de alta qualidade cresça ano a ano e o setor movimente mais de US$ 1 bilhão ao ano, os mais jovens estão abandonando o trabalho agrícola.
"Quase todo mundo em minha família foi jimador, por gerações. É uma tradição", diz Acevez. "A maioria dos jimadores agora são idosos, porque nenhum dos jovens quer trabalhar na colheita."
Acevez trabalha com uma equipe de 12 jimadores, entre os quais seu irmão e um sobrinho, e com golpes de facão remove as folhas amargas da planta ""conhecida como "piña" e parecida com um grande abacaxi. Depois de colhidas, as frutas são levadas à destilaria Patrón, nas imediações, onde são cozidas, esmagadas e fermentadas a fim de produzir tequila de primeira linha.
Miguel Fonseca, o diretor de agave na Patrón, diz que todas as plantas são colhidas à mão pelos jimadores, atendendo às rigorosas especificações que seu método artesanal acarreta.
"Os jimadores sabem e reconhecem que plantas estão maduras para colheita e atendem às nossas especificações precisas", diz Fonseca. "Mas temos menos jovens interessados nesse trabalho porque gente moça prefere mudar para as cidades grandes ou para os Estados Unidos."
A escassez de jimadores nas novas gerações é sintomática de um declínio generalizado do trabalho agrícola no México. As estatísticas mostram que a força de trabalho rural caiu em mais de 2 milhões de pessoas entre 1995 e 2010.
Entre os motivos, a falta de proteção aos métodos tradicionais de agricultura mexicanos ""ao contrário do que acontece com produtos protegidos como o champanhe ou o conhaque"" e o crescente número de jovens que não querem passar a vida na lavoura.
Mesmo o mais jovem dos jimadores, Juan Acevez, 24, diz que, a despeito de ter aprendido a profissão com o pai e o tio, ele não pretende ensiná-la ao seu filho. "Prefiro que estude", diz Acevez. "Não quero que ele trabalhe nos campos."
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Veículo: Folha de S. Paulo