PERSPECTIVAS. Fabricantes são afetados pela mudança de hábitos do consumidor e da consequente retração no consumo; investimento em nichos é alternativa para elevar vendas
São Paulo - Às vésperas das festas de final de ano, a indústria de bebidas alcoólicas ainda aguarda pelo aumento sazonal das encomendas pelo varejo. Apesar da esperança de melhora, nem os fabricantes acreditam que haverá uma recuperação das constantes quedas registradas nas vendas desde 2015.
Na avaliação da gerente de pesquisa da consultoria Mintel, Renata Pompa, a expectativa é de um crescimento moderado no consumo desses produtos no longo prazo. Após uma estimativa de avanço de apenas 1,1% de 2015 para 2016, a previsão de alta é de 9% até 2021. Isso representa uma taxa menor na comparação entre 2011 e 2015, quando a alta havia sido de 10%. "A crise econômica no Brasil tem afetado negativamente o mercado. Pesquisas indicam que os consumidores estão comprando menos bebidas alcoólicas e que deixariam de comprá-las caso necessário", declara a analista.
Diante desse quadro, o varejo brasileiro está mais cauteloso nas encomendas deste final de ano. O CEO da Middas Cachaça, Leandro Dias, acredita que a demanda das lojas deve intensificar-se no final deste mês. "Com menor poder de consumo é natural que o consumidor migre de produto. Mas, apesar de alguma cautela nas encomendas, apostamos no negócio de nicho e nas promoções para alavancar vendas", explica o executivo.
Ele acredita que este ano será possível dobrar a quantidade de garrafas de cachaça com toque de ouro comestível vendidas no período de festas de 2015, que chegou a 11 mil unidades. Se por um lado o consumo dos brasileiros está retraído, a aposta de Dias está nas promoções agressivas para enfrentar este cenário. "Faremos ações no período da Black Friday, uma
oportunidade para que o cliente veja que não haverá outra chance de comprar o produto por um preço tão baixo. Com isso, aumentamos nossa escala, o que compensa o desconto oferecido", calcula.
Migração
O diretor comercial da Famiglia Zanlorenzi, Teodosio Piedrahita, concorda que a mudança de hábitos tem feito a indústria repensar suas estratégias. "Este ano será diferente porque os brasileiros continuam reduzindo o consumo. Mas isso não significa que as bebidas alcoólicas sairão de cena, apenas que as pessoas buscam alternativas", afirma.
A fabricante de espumantes, frisantes e vinhos com sede no Paraná preparou-se para o período investindo não apenas nas versões alcoólicas, mas também em lançamentos como sucos integrais sem açúcar e conservantes. "Isso nos permite ter mais competitividade. No geral, acredito que seja um ano em que as expectativas estão melhores do que a realidade", declara o executivo, que também percebe que as encomendas do varejo serão mais intensas a partir do final do mês.
A tendência de mudança nos hábitos de consumo deve favorecer a Kalvelage, produtora de vodca, enquanto a demanda do varejo não deslancha. O diretor da empresa, Marcos Kalvelage, também aguarda aumento de encomendas para o final deste mês. "Nossa vantagem é sermos uma indústria nacional. O dólar ainda não chegou a um nível realmente baixo, então fica mais fácil brigar com as importadas", define.
Contramão
Na visão da analista da Mintel, Renata Pompa, o investimento em produtos de maior valor agregado poderá alavancar a produção de algumas empresas. "Vemos uma lenta migração para produtos como cervejas artesanais e premium", afirma a especialista.
É o caso da Schornstein, diz o diretor executivo da cervejaria, Adilson Altrão. A meta do empresário é fechar este ano com um avanço de 40% no faturamento da empresa, diante dos R$ 10 milhões alcançados no ano passado. "A crise afeta o mercado em geral, mas a queda mesmo foi para as cervejas comerciais. Os itens artesanais seguem na contramão e devem continuar assim", aposta.
O otimismo do executivo reflete-se na inauguração de uma nova fábrica na cidade de Pomerode (SC), em junho passado, fruto de um investimento de R$ 5 milhões. "A expectativa é de um final de ano melhor, com demanda maior entre final de outubro até fevereiro", prevê.
De acordo com o Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe), da Receita Federal, a produção de cervejas no acumulado do terceiro trimestre deste ano ficou 0,9% abaixo do volume do mesmo período do ano passado. Entre julho e setembro, a produção somou 3,259 bilhões de litros. No segundo trimestre, a produção havia crescido 3,3%, enquanto o acumulado de janeiro a setembro indicava queda de 1,7%. Ajustes
Para o diretor comercial da Moët Hennessy, Jordan Gontijo, o movimento observado pela indústria é natural. "É normal que as encomendas não sejam antecipadas, pois o ambiente econômico dos últimos meses foi de insegurança. O consumidor também deve demorar a buscar tais produtos."
Fabricante da vodca Belvedere e da linha de champanhes Moët, a empresa começou a receber pedidos do varejo no início deste mês. "Tentamos nos ajustar a essa realidade e estamos otimistas", afirma.
A necessidade de ajustes também é uma preocupação para a gerente de propaganda do Grupo Petrópolis, Eliana Cassandre. "Não existe estratégia melhor do que uma distribuição exata", declara a executiva. Fabricante de cervejas como Itaipava e Crystal e da vodca Blue Spirit, o Grupo reflete a precaução da indústria em geral: administração de estoque que não gere excessos ou ruptura. "Embora trabalhando com perspectiva de melhora, estamos em período de crise. A briga no ponto de venda deve ficar mais acirrada neste ano", diz.
Fonte: DCI