De pai para filho,de filho para neto,de neto para...

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Só 4% das empresas chegam à quarta geração. Saiba como a Ypióca, com 163 anos, alcançou esse feito

 

Quando era apenas um garoto, Everardo Telles acompanhava o pai nas vistorias realizadas nas lavouras de cana-de-açúcar dentro da fazenda da família, localizada em Maranguape, uma pequena cidade no norte do Ceará. Montado na garupa do cavalo, ele escutava atentamente os ensinamentos sobre as melhores formas de cultivo da cana e de como extrair dela uma aguardente de qualidade.

 

O tempo passou, o menino cresceu e assumiu o lugar do pai à frente dos negócios. Tem sido assim entre os Telles há mais de um século. Para ser mais preciso: há exatos 163 anos, o bisavô de Everardo, Dario Telles de Menezes, fundou a Ypióca, hoje maior fabricante de cachaça premium do Brasil, com produção de 126 milhões de litros, segundo dados do Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac).

 

Desde então, a empresa jamais saiu das rédeas da família. A Ypióca é um caso raríssimo na história empresarial brasileira. Segundo um estudo da consultoria societária Höft- Bernhoeft, Passos & Teixeira somente 17% das empresas familiares conseguem chegar à terceira geração. Mais incrível ainda: apenas 4% sobrevivem tempo suficiente para que a quarta geração assuma o controle.

 

"Hoje existe uma forte tendência de profissionalização da gestão, muitas vezes provocada por problemas de sucessão na família", diz Wagner Luiz Teixeira, sócio-diretor da Höft. Por isso mesmo, casos como o da Ypióca são ainda mais surpreendentes.

 

Enquanto o filho Paulo Telles cuida do planejamento, a filha mais velha, Aline telles, é responsável pelo marketing. Ela pode assumir a presidência

 

Everardo diz que a Ypióca sempre foi comandada por um Telles por uma simples razão: a empresa jamais enfrentou uma crise séria que colocasse em xeque a gestão familiar. Em seu mais de um século de existência, a Ypióca foi lucrativa na maioria das vezes, à exceção de curtos períodos. "Além disso, a empresa sempre encontrou sucessores competentes entre os integrantes da família", afirma Everardo.

 

Um estudo conhecido da consultoria Mckinsey com presidentes de 56 grandes companhias familiares do mundo traz um dado revelador: apenas 7% dos entrevistados afirmam que suas companhias têm em seu quadro de funcionários talentos com o preparo necessário para assumir o posto mais alto da corporação. Sem enxergar entre os empregados um sucessor competente, as empresas acabam escolhendo um herdeiro para tocar o negócio.

 


Memória preservada: Museu da Cachaça expõe a trajetória da família Telles e da bebida
No caso da Ypióca, os números demonstram que manter a família no comando fez bem para o negócio. Nos últimos anos três anos, a empresa vem crescendo a taxas médias de 10% ao ano. Para 2010, projeta uma expansão de 12%.

 

O desempenho se deve principalmente ao crescimento de suas atividades em áreas que transcendem a produção de aguardente.

 

O grupo conta com sete empresas que atuam em diferentes setores, que vão desde a criação de gado de corte e de leite, plantação de milho, feijão e cana, passando por fábricas de papel e garrafas pet até uma marca regional de água mineral.

 

Só 4% das empresas chegam à quarta geração. Saiba como a Ypióca, com 163 anos, alcançou esse feito

 

A soma de todos os segmentos resulta em um faturamento anual de R$ 300 milhões. "Sempre gostei de diversificar as atividades", afirma Everardo. A diversificação atende a outro objetivo. Ela abre espaço para que integrantes da família encontrem uma colocação nos negócios do grupo. Isso é comum em várias corporações familiares. Dos sete filhos de Everardo, cinco atuam na empresa e já acompanham de perto as principais tomadas de decisões.

 

Negócio diversificado: empresa investe em outros segmentos, como na fabricação de garrafas pet

 

No comando há 33 anos, Everardo foi o grande responsável pela verticalização dos negócios, buscando angariar lucros de cada centímetro de suas fazendas. "Nas nossas usinas, de um lado entra a cana e do outro sai cachaça, álcool e papelão", brinca.

 

Os restos da cana são reutilizados e parte desse material se transforma em uma ração especial, que alimenta o gado e ajuda a impulsionar o "boitel", um confinamento com capacidade para três mil cabeças de gado em que Telles recebe animais de várias partes do País para fazer a engorda.

 

O gado entra magro e sai gordo e Everardo fica com os lucros que resultam da diferença de peso. O que não vira ração se torna parte da matéria-prima da fábrica de papelão mantida na unidade de Pindoretama (CE), onde são produzidas 450 mil toneladas por dia.

 

"Parte disso é usada para fabricar as embalagens de nossas bebidas e o restante comercializamos com empresas da região", diz Paulo Telles, filho de Everardo e diretor de planejamento.

 

Para o presidente da Ypióca, a diversificação também teve papel estratégico para que a companhia conseguisse passar sem sustos pela crise econômica mundial e mantivesse os investimentos.

 

"Nossos custos ficam pulverizados em vários segmentos, o que nos permitiu manter os projetos", diz. Entre os planos que não foram alterados está a inauguração da nova unidade da empresa, em Jaguaruana (CE).

 

A planta industrial vai consolidar um antigo desejo: a entrada no setor de etanol. Com investimentos de R$ 80 milhões, a nova usina terá capacidade para produzir anualmente 50 milhões de litros de álcool.

 

Mesmo arquitetado na gestão atual, a entrada no etanol é encarada como um dos desafios da quinta geração. O atual presidente evita falar do processo sucessório. "Ninguém assume a presidência apenas por ser da família. Tem que mostrar competência."Embora não fale abertamente sobre o assunto, a provável sucessora será a filha mais velha, Aline Telles, 35 anos.

 

Ela, é a atual diretora de marketing e, segundo pessoas próximas da família, Aline detém as qualidades de liderança necessárias para o cargo. Enquanto a próxima geração não assume o comando, o patriarca planeja os próximos goles da Ypióca e se vale de um patrimônio incomparável. "Tradição de 163 anos é algo que não é qualquer um que pode ter."

 

Goles centenários

 

Conheça a história das gerações que comandaram a Ypióca

1º Geração
Dario Telles de Menezes: em 1843, aos 17 anos, o imigrante português chega ao Brasil e se instala no interior do Ceará. Ele inaugura a Ypióca em 1846.

2º Geração
Dario Borges Telles: em 1895 assume os negócios da família e moderniza o processo de produção da bebida, passando a vendê-la engarrafada. Depois de sua morte, sua esposa, Eugenia Menescal Campos, assume os negócios e cria o primeiro rótulo da Ypióca.

3º geração
Paulo Campos Telles: responsável pela primeira exportação de uma cachaça brasileira, tendo como destino a Alemanha, em 1968. Também iniciou o processo de produção em escala industrial da bebida.

4º Geração
Everardo Telles: primeiro presidente da Ypióca com formação superior, Everardo expandiu os negócios, atuando em outros segmentos, como a pecuária, a fabricação de papelão e o envase de água mineral.
 

 

Veículo: Revista Isto É Dinheiro


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