Uruguai bate Argentina como o país ''carnívoro''

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Consumo de carne argentina desaba por causa da crise e vizinho lidera ranking com média per capita de 58,2 quilos /ano ante 56,7 quilos/ano na Argentina

 

"Os argentinos são carnívoros por excelência." Esse era o argumento oficial do Instituto de Estímulo e Divulgação da Carne Bovina da Argentina até o ano passado. Motivo havia de sobra para isso, já que comer carne bovina praticamente definiu o modus vivendi dos argentinos durante o século 20 e no início do 21, quando foram os maiores "carnívoros" do planeta.

 

Em 1969 os argentinos chegaram ao consumo recorde mundial de 100 quilos per capita por ano de carne. Embora o volume tenha caído nas décadas seguintes - por diversificação alimentícia, temores ao colesterol e perda do poder aquisitivo - os argentinos continuaram ostentando as principais marcas mundiais, muito acima de outros países. No entanto, a Argentina - a emblemática terra do bife de chorizo - acaba de perder a pole position mundial no consumo de carne bovina.

 

Queda. Segundo a Câmara da Indústria e Comércio de Carnes da Argentina (CICCRA), o consumo de carne bovina per capita caiu dos 68,1 quilos registrados em 2009 para uma média de 56,7 quilos nos primeiros seis meses deste ano.

 

Desta forma, o primeiro posto no pódio passou para os vizinhos uruguaios. Beatriz Luna, assessores de imprensa do Instituto Nacional de Carnes do Uruguai (INAC) disse ontem ao Estado por telefone, de Montevidéu, que o consumo per capita de carne bovina no Uruguai neste ano é 58,2 quilos, isto é, um quilo e meio a mais do que os argentinos.

 

Por trás da queda de consumo da carne bovina na Argentina - 16,7% em relação ao ano passado - está o sideral aumento dos preços, de 60%, registrado desde janeiro deste ano. Esse aumento soma-se à alta de 180% entre janeiro de 2007 e dezembro de 2009.

 

Conflito. Os produtores acusam os governos do ex-presidente Néstor Kirchner e o de sua esposa e sucessora, a presidente Cristina Kirchner, de torpedear a produção de carne bovina ao impor um controle de preços a partir de 2006.

 

"O governo aplica uma política anti-pecuarista elaborada por um incompetente funcionário", afirmou a Ciccra na semana passada em comunicado que faz alusões indiretas ao secretário de Comércio, Guillermo Moreno, conhecido no Brasil por ordenar verbalmente proibições contra a entrada de alimentos não frescos importados.

 

Em meio ao conflito que mantém há vários anos com os produtores agropecuários, a presidente Cristina retruca as críticas dos ruralistas, chamando-os de "golpistas" e de pretender "lucros abusivos".

 

As administrações dos Kirchners aplicaram uma controvertida redução das exportações com o objetivo de redirecionar o produto para o mercado interno e, assim, forçar a queda de seu preço. No entanto, segundo a CICCRA, "apesar da intervenção estatal para garantir o abastecimento doméstico e controlar os preços da carne, a queda da oferta de gado provocou uma escalada de preços ao consumidor desde o início de 2010".

 

Sem estímulo, os pecuaristas estão investindo menos no setor. Segundo a CICCRA, o abate registrou em junho uma queda de 30,7% em comparação com o mesmo mês do ano passado.

 

No primeiro semestre de 2010, a redução do abate foi de 22,4% em relação ao mesmo período de 2009.

 

Importador. As exportações argentinas registraram uma queda de 41,9% em volume. Das 274.497 toneladas exportadas no primeiro semestre de 2009, no período janeiro-junho deste ano as vendas ao exterior caíram para 159.366 toneladas. O governo afirmou que, para impedir maiores altas de preços no mercado interno, impedirá que as exportações passem de 400 mil toneladas em 2010.

 

A queda das exportações em valor foi de 20,9%, passando de US$ 732,5 milhões na primeira metade de 2009 para US$ 579 milhões no primeiro semestre de 2010.

 

No entanto, perante o aumento dos preços da carne bovina, a própria presidente Cristina envolveu-se pessoalmente em uma campanha para tentar desviar o consumo dos argentinos para a carne suína, atribuindo-lhe poderes afrodisíacos (que, segundo disse, comprovou com seu próprio marido em um fim de semana, após comer um leitão da província de Córdoba). Além disso, Cristina Kirchner também alardeou os valores da carne de frango para o regime das mulheres argentinas.

 

Os volumes uruguaio e argentino de consumo de carne são substancialmente superiores ao consumo brasileiro de carne. No Brasil, a ingestão é de 36 quilos anuais (o Estado mais "carnívoro" da federação é o Rio Grande do Sul, com 46 quilos por ano).

 

PONTOS-CHAVE

 

Origem: As primeiras vacas que entraram na Argentina, em 1580, eram da raça holandesa e vieram do Paraguai, depois de passarem pelo Brasil, trazidas da Espanha, em 1555.

Recorde: Em 1969 o consumo argentino de carne bovina per capita chegou ao recorde, de 100 quilos anuais.

Baixa: Em 2002, em meio à maior crise da Argentina, o consumo foi de 51 quilos per capita.

Destaque mundial: O consumo per capita em 2009 foi de 68,1 quilos, o mais alto do mundo. No primeiro semestre deste ano despencou para 56,7 quilos.

Destronado: Com 58,2 kg per capita, Uruguai é atual nº 1

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


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