O ponto de interrogação do JBS

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O empréstimo de R$ 3,5 bi dado pelo BNDES para a compra da americana Pilgrim's deveria ser solução. Mas virou problema para o frigorífico brasileiro

 

Era para ser um negócio de pai para filho: um empréstimo de R$ 3,5 bilhões, sem juros, pagamento de dividendos ou qualquer outro custo durante o prazo de um ano. Com esse dinheiro, fornecido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o frigorífico JBS comprou a americana Pilgrim"s no ano passado e se consolidou como o maior produtor de carne processada do mundo.

 

Pelo plano original, o JBS abriria em seguida o capital de sua filial nos Estados Unidos - e assim o BNDES transformaria a dívida em ações e a empresa da família Batista começaria a ganhar dinheiro com a operação americana. Faltou combinar com o mercado. O último repique da crise econômica assustou o investidor americano e o JBS já anunciou que não há condições para abrir seu capital este ano.

 

O tropeço no mercado americano não é culpa do JBS, mas deverá custar à companhia US$ 300 milhões - o equivalente a meio bilhão de reais. Esse é o valor de uma multa prevista no contrato com o BNDES no caso de o JBS não conseguir abrir o capital nos EUA até dezembro. Procurados, o JBS afirmou que está em período de silêncio e o BNDES não quis se pronunciar.

 

O JBS já adiou duas vezes o plano de lançar ações nos EUA. Seria o arremate do agressivo processo de crescimento internacional que começou com a compra da Swift na Argentina, em 2005. Dois anos depois, a empresa abriu seu capital no Brasil, captou recursos e adquiriu outras dez empresas no exterior, em apenas três anos.

 

Desde a compra da Pilgrim"s, em setembro, o cenário mudou, tornando as coisas mais difíceis para o JBS. A recuperação da economia global está mais lenta do que se imaginava por causa da crise na Europa. Os preços do milho e da soja, base da ração dos animais, subiram. A Rússia, um dos maiores clientes dos exportadores de frango dos EUA, fechou as portas para o produto. Tudo isso minou o interesse dos investidores americanos por ações de empresas de alimentos.

 

A compra da Pilgrim"s foi um negócio de ocasião. Como a empresa estava quebrada, suas ações, que chegaram a custar US$ 32 cada, despencaram para US$ 0,40 no auge da crise. O JBS arrematou a empresa pagando US$ 3,5 por ação. Hoje, elas valem o dobro. Além da pechincha, os irmãos Batista (Júnior, Joesley e Wesley) encontraram apoio no BNDES e sua política de criação de multinacionais brasileiras.

 

O BNDES comprou R$ 3,5 bilhões em debêntures (dívida que pode ser convertida em ações) do JBS. Esse modelo teve duas vantagens para os Batista: ao contrário de um empréstimo normal, não há pagamento de juros; e, como os papéis são convertíveis em ações, não contaminam o balanço da empresa, já muito endividada, com mais débito.

 

Para não ficar desprotegido, o banco estatal impôs uma condição - a tal abertura de capital nos Estados Unidos, até o fim do ano. Caso isso não aconteça, o BNDES tem direito a receber ações do JBS no Brasil. O frigorífico tem a opção de esticar o prazo até dezembro de 2011. Mas nesse caso é obrigado a pagar uma multa de 15% sobre o valor da operação - cerca de R$ 520 milhões.

 


'O futuro das Américas depende da parceria entre Brasil e EUA'

 

Nos dias 20 e 21 de setembro, acontece em Washington a 2.ª Conferência de Inovação Brasil-EUA. Deborah Wince-Smith, presidente do Council of Competitiveness, que reúne empresas americanas, falou ao Estado sobre como empresas dos dois países podem trabalhar juntas, após evento com a FGV em São Paulo.

 

Qual é o objetivo da conferência?
Nós temos, com nossos parceiros no Brasil, o objetivo de estimular e desenvolver conjuntamente um crescimento baseado em inovação nos dois maiores países das Américas.

 

Quais são os principais desafios nas parcerias entre EUA e Brasil na área de inovação?
Nós não temos os dispositivos legais e regulatórios para a integração de nossas economias. Ainda não temos um tratado de investimento binacional. Isso exigiria que o Congresso brasileiro mudasse a lei. Existem cada vez mais empresas brasileiras nos EUA. A JBS Swift, maior produtora de carne dos EUA, é brasileira. Eles não têm nenhuma proteção ao investimento, porque não existe tratado. Outro desafio é a liberação do comércio de produtos e serviços. Nós temos tarifas altas em alguns produtos agrícolas, como o açúcar. Cobramos tarifas altas sobre o etanol brasileiro, de cana de açúcar. Mas, ao mesmo tempo, o Brasil tem tarifas muito altas em produtos industriais, como computadores. Precisamos retirar essas tarifas.

 

Por que é importante os dois países trabalharem juntos?
Quando a Intel foi criada, era uma máquina de criar empregos no Vale do Silício. Hoje, o iPhone e o iPad da Apple são inovações imensas. Mas criaram 300 mil empregos na China, e só uma fração nos EUA. A população dos EUA precisa de trabalho e, em parceria com o Brasil, conseguiríamos manter os empregos na região. O Brasil tem uma posição importante na mineração, em commodities, em áreas muito estratégicas. O futuro das Américas depende do relacionamento entre Brasil e EUA.

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


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