O superávit primário do setor público voltou a cair entre setembro e outubro, de 1,17% para 1% do Produto Interno Bruto (PIB), no resultado acumulado em 12 meses, mostram estatísticas divulgadas ontem pelo Banco Central. Com isso, o primário distancia-se ainda mais da trajetória necessária para o cumprimento da meta definida para este ano, de 2,5% do PIB.
A queda no superávit primário ocorreu a despeito do robusto resultado observado em outubro, de R$ 13,818 bilhões, bem mais alto do que a média mensal de R$ 4,190 bilhões observada nos nove primeiros meses do ano. O bom superávit de outubro se deve, em grande parte, a receitas extraordinárias. O superávit acumulado em 12 meses caiu porque em outubro de 2008 o primário havia sido ainda mais forte, somando R$ 18.731 bilhões.
A queda do superávit primário reforça a leitura, que se torna corrente entre os analistas econômicos, de deterioração nas contas fiscais, em virtude da expansão de gastos correntes feita pelo governo nos últimos anos, aumento de gastos e corte de impostos para estimular a economia em meio a uma crise financeira mundial e queda na arrecadação.
O chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, sustenta que, apesar do superávit menor, o governo vai cumprir a meta. Ele lembra que o primário acumulado em 12 meses está distorcido por um evento estatístico: em dezembro de 2008, o governo fez uma despesa primária extraordinária equivalente a 0,5% do PIB para constituir o fundo soberano. Em dezembro, esse evento deixará de contaminar as estatísticas. "É como se o superávit, hoje de 1% do PIB, fosse na verdade de 1,5% do PIB", argumenta Lopes.
Ele lembrou que as regras fiscais dizem que os investimentos executados do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), estimados em 0,94% do PIB, podem ser abatidos da meta. Assim, o objetivo fixado pelo governo será cumprido se o superávit entregue em dezembro for de 1,56% do PIB. Para que a meta seja reduzida, porém, é necessária a efetiva realização das obras do PAC, cuja execução tem ficado aquém do cronograma. "Se os investimentos do PAC ficarem abaixo do esperado, o governo fará um esforço fiscal maior para cumprir a meta", disse Lopes.
Segundo ele, as perspectivas daqui por diante são um pouco mais favoráveis, já que a recuperação da atividade econômica tende a recompor a arrecadação dos governos nacional e regionais, que foram afetadas pela crise financeira mundial.
O déficit nominal do setor público seguiu em trajetória de alta, passando de 4,29% para 4,61% do PIB entre setembro e outubro, nos dados acumulados em 12 meses. Além do superávit primário menor, outro fator que contribuiu para o aumento do déficit nominal foi a expansão dos gastos com juros da dívida pública, que passaram de 5,46% para 5,61% do PIB no período. Em tese, os encargos da dívida deveriam estar diminuindo, já que o BC cortou de 13,75% para 8,75% ao ano a taxa básica de juros da economia. Mas, por outro lado, a despesa sofre pressão em virtude da apreciação cambial. O governo federal é credor em dívidas indexadas ao câmbio e, quando o dólar se enfraquece perante o real, perde receitas.
A dívida líquida do setor público caiu levemente entre setembro e outubro, de 45% para 44,8% do PIB, interrompendo tendência de deterioração verificada desde fins de 2008. Dois fatores contribuíram para a queda: o resultado primário registrado em outubro, que foi mais favorável que em meses anteriores, e o crescimento um pouco mais forte da economia, que contribuiu para tornar a dívida líquida um pouco menor comparada ao PIB.
A projeção do BC é que, até dezembro, a dívida caia para 44% do PIB. Além de resultados fiscais um pouco melhores daqui por diante, a queda deverá ser possível graças a revisão do PIB de 2007 recentemente divulgada, que calculou a variação do PIB em 6,1%, em vez dos 5,7% anteriormente medidos.
Veículo: Valor Econômico