A projeção de inflação do Banco Central (BC) piorou para este ano, mesmo sem considerar os efeitos do agravamento da crise internacional ocorrido nos últimos dias. Segundo o Relatório de Inflação divulgado ontem, a inflação de 2008 deverá ser de 6,1%, 0,1 ponto percentual superior à estimativa feita em junho e 1,6 ponto percentual acima da meta fixada para este ano. De janeiro a agosto, o IPCA acumulado foi de 6,17%.
Para 2009, o BC manteve as estimativas feitas no último relatório - inflação acumulada em 12 meses de 5,7% no primeiro trimestre e de 4,8% no fim do ano. Nesse cenário, o IPCA cairia para 4,6% no terceiro trimestre de 2010. Ao divulgar o relatório, o diretor de Política Econômica do BC, Mário Mesquita, deixou claro que a autoridade monetária perseguirá, para 2009, a meta de 4,5%, o que indica que o aperto monetário, iniciado em abril, deve continuar.
"Trazer a inflação para 4,5% em 2009 é factível. Não é nada ambicioso", disse Mesquita, acrescentando que a inflação de 6,1% prevista para 2008 é "bastante elevada". Ao montar o chamado cenário de referência, o BC usou como data de corte 12 de setembro, sem considerar os eventos que agravaram a crise americana - a quebra do banco Lehman Brothers, o socorro de US$ 85 bilhões à seguradora AIG e a rejeição do pacote de socorro aos bancos americanos.
Nesse cenário, o BC manteve a taxa de câmbio constante ao longo do horizonte de projeção em R$ 1,80 - ontem, ela fechou em R$ 1,96 -, face a R$ 1,65 do relatório divulgado em junho. Para a taxa básica de juros (Selic), trabalha-se agora com 13,75% , ante 12,25% em junho. No que diz respeito aos preços administrados, alguns deles atrelados a índices de preços que sofrem influência do câmbio, o BC prevê variação de 4% em 2008 e de 4,8% em 2009. Todos esses indicadores podem piorar nas próximas semanas e meses.
Mesquita disse que é difícil avaliar em "tempo real" a dimensão da crise financeira internacional. "Entre hoje e a próxima reunião do Comitê de Política Monetária - daqui a um mês -, a situação pode mudar. Nossas projeções vão capturar isso", advertiu o diretor.
Mesquita deixou claro que as recentes medidas tomadas pelo BC para dar liquidez aos mercados não representam uma mudança de rumo na política monetária. Segundo ele, não há contradição entre prover liquidez, flexibilizando parte do recolhimento compulsório, e manter uma política monetária austera. Ele citou o exemplo do BC europeu, que recentemente garantiu a liquidez do sistema bancário em meio à crise, mas elevou os juros para combater a inflação.
"A provisão de liquidez feita pelo BC não teve o objetivo de promover a expansão da atividade econômica", disse Mesquita, observando que o instrumento mais efetivo para o controle da inflação é a Selic. "A última vez em que o compulsório foi usado pelo BC como instrumento de política monetária foi em fevereiro de 2003."
Mesquita disse que a demanda, puxada pelo consumo das famílias (alta de 6,7% no segundo trimestre de 2008, face ao mesmo período de 2007) e pela Formação Bruta de Capital Fixo (+16,2%), continua crescendo muito acima da oferta, pressionando a inflação. A taxa de desemprego (7,6% em agosto) é a menor da série histórica, a criação de emprego formal é recorde e a utilização da capacidade instalada da indústria segue crescendo (em julho, segundo a FGV, chegou a 86,5%). Tudo isso levou o BC a rever a projeção de expansão do PIB para este ano de 4,8% para 5%.
No regime de metas para inflação, o BC considera as expectativas de inflação dos agentes econômicos mais importantes, explicou Mesquita, do que a taxa de câmbio. Quando se observam as expectativas para 2008, o que se vê é uma melhora das expectativas neste momento - a maioria, que em junho apostava em inflação anual de 6,23%, agora projeta 6,14%.
As expectativas do mercado quanto a 2009, no entanto, pioraram. Enquanto em março, a maioria acreditava que a inflação do próximo ano seria de 4,3%, em julho passou a acreditar que seria de 4,8% e, neste relatório, aposta que será de 4,9%.
Veículo: Valor Econômico