Privilégio a produto do País é legal, diz ministro

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Medida Provisória apresentada esta semana dá preferência a produtos nacionais em licitações do governo

 

O ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, descartou o risco de o Brasil ser questionado na Organização Mundial do Comércio (OMC) por causa das alterações da Lei de Licitação que favorecem produtores brasileiros. A Medida Provisória 495, publicada esta semana, cria preferência para produtos e serviços feitos no País em processos licitatórios. "O Brasil não é o primeiro a usar o poder de compra do Estado para incentivar a indústria nacional", disse. "Medida como essa já deveria ter sido adotada pelo País há mais tempo."

 

O critério principal para vencer licitação no País era o de menor preço. A regra agora tem exceção: quando estão na disputa produtos brasileiros e importados, os nacionais podem ter preço até 25% maior. "Medidas semelhantes ocorrem também em outros países. Não consigo entender a razão da polêmica."

 

Mesmo se não houvesse precedentes, o Brasil não poderia ser alvo de restrições internacionais, afirmou o diretor do Departamento Econômico do Ministério de Relações Exteriores, Carlos Márcio Cozendey. O Acordo Geral para Tarifas e Comércio (GAT), permite que compras governamentais adotem tratamento diferenciado. "Há um outro acordo internacional que estabelece regras de não discriminação mesmo entre compras governamentais. Mas o Brasil não faz parte deste acordo", disse.

 

A exceção fica por conta de um acordo que está em negociação com países do Mercosul, que não permite regras diferenciadas, mesmo para compras governamentais. A Medida Provisória já determina que, assim que o Brasil ratificar o tratado, produtos de países do Mercosul poderão concorrer em licitações com produtos brasileiros nas mesmas condições, disse Cozendey.

 

A margem de preferência será definida levando em consideração fatores como potencial para geração de emprego e renda, efeito na arrecadação de tributos e desenvolvimento e inovação tecnológica. Esse terceiro fator é considerado essencial pelo diretor de Operação da Confederação Nacional da Indústria, Rafael Lucchesi. "A medida representa um grande incentivo para o setor produtivo, mas cria, sobretudo, incentivo para nacionalização da pesquisa."

 

Discutida há dois anos, a mudança na lei de licitação foi incluída em uma MP que trata também sobre regras para fundações de amparo à pesquisa. "Eram dois assuntos importantes, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu resolver de vez", disse Rezende.

 

Aprovação. O ministro acredita que, apesar do movimento inicial de polêmica, a MP será facilmente aprovada no Congresso. "São medidas que representam incentivo à produção, à inovação nacional. Acho muito difícil alguém votar contra." O ministro está convicto de que o setor farmacêutico será um dos primeiros a ser beneficiados com a mudanças nas regras da licitação. "Será o impacto maior. Mas na área de equipamentos, na área digital, os benefícios também serão sentidos", completou.

 

O presidente do Laboratório Cristália, Ogari Pacheco, considerou a mudança salutar, mas faz um alerta: "É preciso diferenciar o que é de fato nacional, principalmente na área de medicamentos." Ele lembra que muitas empresas importam a substância ativa e, quando o produto chega ao Brasil, preparam a apresentação final. "Nesses casos, o porcentual deveria ser diferenciado, menor do que o das empresas que produzem todas as etapas do remédio no País."

 

O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, José Augusto de Castro, também acha muito difícil que País seja questionado pelo novo critério de preferência. "Isso não é incomum, sobretudo em países que têm produtos competitivos." Ele diz, porém, ter estranhado o porcentual estabelecido como limite para preferência de produtos nacionais. "O índice de 25% é . É como se o País reconhecesse que o produto brasileiro tem elevada carga tributária, um custo muito alto."

 

Para governo, nova regra é 'mudança estrutural'

 

A nova regra para compras governamentais é considerada pela equipe econômica como uma mudança estrutural que vai ajudar a desenvolver o mercado nacional. O secretário-adjunto de Política Econômica, Dyogo de Oliveira, explicou que essa é uma iniciativa que vários países adotam, incluindo EUA e China. O mecanismo previsto na MP 495, segundo ele, reforça a potência da política fiscal na economia, já que, sem isso, o efeito multiplicador do gasto público na economia pode acabar sendo exportado.

 

Hoje, existem duas modalidades de licitação, a internacional - em que os fornecedores estrangeiros podem participar - e a local - em que só empresas sediadas no Brasil podem entrar. O problema é que, nas licitações locais, a exigência de que a empresa esteja no País não a impede de vender ao governo produtos sem nenhum conteúdo nacional. E é essa brecha que a MP tenta fechar, pois "pode comprometer o efeito multiplicador da renda". Assim, o fornecedor terá de especificar a origem do seu produto.

 

Restrição. A preferência dada ao produto nacional, no entanto, não será geral. Decretos presidenciais definirão quais áreas terão licitação com direito de preferência e qual o porcentual. O projeto confere flexibilidade para que o governo defina, com base em critérios como geração de emprego e renda, efeito na arrecadação e a agregação de tecnologia local como será exercida essa prioridade. O que vai pesar é a relação custo-benefício.

 

Assim, uma determinada compra pode não contar com preferência, se o produto nacional já for suficientemente competitivo, ou essa margem pode ser menor do que os 25%. "Vamos supor uma licitação na área de saúde: define-se o porcentual de preferência em 10%, e se, no leilão, o fornecedor de produto nacional tiver um preço até 10% maior, ele vai ganhar a licitação", disse Oliveira.

 


Veículo: O Estado de S.Paulo


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