Indústria vê "emergência cambial" no país

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Empresários criticam real valorizado e temem agravamento do processo de desindustrialização

 

A economia, que cresce acima de 7% pela primeira vez em 24 anos e tem o mercado interno como motor propulsor - enquanto os países desenvolvidos lidam com crescimento marginal -, não tem agradado aos industriais. Reunidos pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) para o Congresso da Indústria, em São Paulo, empresários e economistas especialistas do setor deixaram os discursos em sintonia.

 

Segundo eles, as elevadas taxas de juros encarecem o financiamento dos investimentos e, ao mesmo tempo, atraem capitais especulativos. Esses ampliam a valorização da taxa de câmbio, o que dificulta a exportação e barateia os importados, que sustentam a expansão do mercado interno e o Produto Interno Bruto (PIB) acelerado.

 

"Se não enfrentarmos a contínua valorização do câmbio de maneira firme, o processo de desindustrialização do Brasil vai se agravar, uma vez que até os EUA estão começando a desvalorizar suas moedas, e nós continuamos aceitando tudo", avalia Pedro Passos, sócio da Natura e presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).

 

Segundo Passos, o país vive hoje uma situação de "emergência cambial", quando analisada a situação do câmbio chinês e americano. Enquanto o yuan mantém relação de sete para um com o dólar há cinco anos, o dólar oscila abaixo de R$ 1,70 no Brasil. Além disso, o Federal Reserve , o banco central americano, iniciou, na semana passada, a emissão de US$ 600 bilhões em moeda, na tentativa de reanimar a economia - o presidente Barack Obama chegou a afirmar que a "saída", para o país, "passa pelo incremento das exportações".

 

"E quem vai aceitar esse incremento das exportações industriais americanas? O mesmo país que tem recebido o crescente desembarque de bens manufaturados da China. Está na hora do país se mexer", reclamou um empresário, ao Valor. O industrial, do ramo de máquinas e equipamentos, afirmou que as importações oriundas da China são "muito mais baratas" que o produto nacional, especialmente porque, segundo ele, contam com o real valorizado e com os incentivos tributários à bens de capital sem similar nacional. "A máquina chinesa pode até não ter equivalente nacional, mas no mesmo pacote aportam uma série de peças e acessórios que existem."

 

Segundo dados dessazonalizados do Iedi, nos seis meses compreendidos entre abril e setembro deste ano, a produção da indústria brasileira só cresceu, na comparação mensal, em julho. "Como explicar isso?", pergunta Passos. "Diante de um mercado interno enorme e cada vez mais forte, que continuou crescendo no período, como a indústria não acompanhou?"

 

Para Josué Gomes da Silva, presidente da Coteminas, a política monetária "não é mais condizente" com a solidez alcançada pela economia, servindo apenas para atrair mais capital externo, que, por sua vez, valoriza ainda mais a moeda. "Os títulos públicos fixados na Selic são uma excrescência. Dão o maior retorno do mundo, que são nossas taxas de juros, com uma liquidez diária e sem qualquer risco de calote. Essa distorção precisa ser corrigida", afirmou o empresário.

 

Desde outubro do ano passado, o governo federal elevou três vezes o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) do capital estrangeiro - de zero para os atuais 6%. "Essas medidas aliviam a valorização", diz Ibrahim Eris, ex-presidente do Banco Central (1990-1991) e sócio da Linear Consultoria, "mas se pudesse fazer apenas uma recomendação à presidente eleita Dilma Rousseff, diria a ela que fizesse um forte ajuste fiscal no setor público, que possibilitaria reduzir o diferencial de taxas de juros, um problema crônico no país", disse.

 

Ideia levantada por Dilma e o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na semana passada, a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que serviria para financiar a saúde, foi rechaçada pelos empresários. "Para aqueles que sonham com o imposto aviso que transformaremos isso em pesadelo", disse Paulo Skaf, reintegrado à presidência da Fiesp após concorrer ao governo de São Paulo.

 

Para Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda (1967-1974) e um dos principais conselheiros do presidente Lula ao longo dos oito anos de mandato, "o melhor não é insistir em uma reforma ampla, porque dificilmente será aprovada, mas em medidas pontuais de cortes de impostos, que funcionam muito bem."

 

Veículo: Valor Econômico


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