Créditos: Atrasos, mais comuns no 1º trimestre, avançam por abril e maio e dão sinal de alerta
A inadimplência da pessoa físcia bateu no calcanhar dos bancos. Embora os números estejam longe de ser alarmantes, o sinal amarelo está aceso e as instituições têm acompanhado de perto o comportamento de pagamento do consumidor. Se não debelarem esses primeiros indícios de piora na qualidade dos ativos, o ritmo de concessões pode ficar comprometido. Ações corretivas estão na rua. Campanhas de cobrança, mais comuns no fim do ano, quando há injeção do 13º salário na economia, por exemplo, foram antecipadas para este segundo trimestre.
É o caso do HSBC, que identificou em maio um aumento de 0,25 ponto percentual na inadimplência da carteira de consumo originada pela Losango, na comparação com o mesmo mês do ano passado. Isso levou o índice de atrasos superiores a 90 dias a 5,6%. Apesar de o indicador estar abaixo da média do mercado - de 6,1% nos portfólios de pessoa física, segundo o último dado disponível do Banco Central (BC), de abril - foi o que bastou para a promotora de vendas começar a fazer incentivos de cobrança.
"Saímos a campo. Estamos usando todos os canais para conversar com o cliente e reprogramar o fluxo das prestações ao orçamento dele", diz Hilgo Gonçalves, principal executivo da Losango. A renegociação está automatizada e pode ser feita diretamente no balcão das 23 mil parceiras do varejo onde a Losango financia o consumo. Os prazos podem ser esticados em até 24 meses e, conforme o caso, com isenção da multa e juros de mora. Acima desse prazo, a situação é estudada caso a caso, mas Gonçalves garante, o consumidor que quiser deixar suas contas em dia não fica sem uma solução.
O Citi, que nos seus modelos internos mede atrasos a partir de 30 dias, também detectou uma piora específica na carteira de empréstimo pessoal da Credicard Financiamento, de 6,7% para 7,4% entre março e maio, enquanto cartões e o portfólio de varejo do banco permaneceram estáveis. A ordem agora é correr atrás antes que esses números se revertam em prejuízo.
"O cliente, quando começa a atrasar, está provavelmente endividado com outros agentes financeiros. É preciso cobrar primeiro, conseguir o comprometimento de pagamento antes dos outros", diz o vice-presidente de gerenciamento de risco, Victor Loyola. Aumentar prazos e tirar o pedágio das multas entram no pacote de revisão da dívida.
O reflexo da inadimplência que começa a ser identificada no setor financeiro é de que se essa tendência persistir, a resposta virá por um freio extra às concessões, que já vinham sendo comprometidas com as medidas de aperto endereçadas ao crédito pessoa física. "Os bancos usam medições estatísticas e quando a inadimplência aumenta, a resposta natural é eliminar os segmentos mais voláteis", explica Loyola. Nessas situações, o critério de aprovação fica mais rigoroso e pessoas que estão tomando crédito pela primeira vez ou tiveram algum episódio recente de inadimplência não passam na peneira.
O Banco do Brasil (BB), que concentra o seu portfólio de pessoa física no crédito com desconto em folha de pagamento, não notou elevação da inadimplência dentro de casa, diz o diretor de crédito, Walter Malieni. "A carteira é muito grande e posicionada no consignado, que pode ter uma rentabilidade menor, mas dá conforto pela estabilidade dos resultados."
O executivo reconhece, porém, que a alta dos juros e a redução dos prazos no próprio consignado - já que o BC passou a exigir mais capital para operações acima de 36 meses - trazem desafios à gestão de risco, especialmente da população com renda familiar de até R$ 2,5 mil. "O encurtamento conjugado com o aumento de preços está exercendo pressão sobre o caixa dos devedores", diz Malieni. Os ajustes na modelagem de risco estão sendo feitos. O banco tem procurado ficar menos exposto aos segmentos em que a cesta de consumo de produtos de sobrevivência é mais justa e não há espaço para flexibilidade. "Há gastos que não podem ser cortados, o indivíduo não tem como pagar meio aluguel", exemplifica.
Diferentemente de outros anos, em que a inadimplência crescia ao longo do primeiro trimestre, em 2011 os atrasos avançaram por abril e maio, nota o superintendente de cobrança da Losango, Augusto Mello. Nas operações de consumo do HSBC, o pico foi em maio, mas em junho os números já começam a convergir para o nível observado há um ano, o melhor ponto histórico da a carteira.
A interpretação é de que o efeito calendário (com o carnaval em março e a Páscoa em abril) contribuíram para a falta de pontualidade do tomador. Outro fenômeno que vem sendo observado é que as classes menos favorecidas da população agora comprometem parte da sua renda com o financiamento da casa própria, deixando de honrar outros compromissos.
Apesar de a taxa de desemprego estar em um nível historicamente baixo, houve um excesso de endividamento no ano passado por causa do crescimento da economia e dos ganhos reais com salários, diz o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges. Para ele, os consumidores exageraram e estão gastando aproximadamente 23% da renda para pagar dívidas. Nos EUA, esse número está perto de 15%, mas a grande diferença ocorre, em parte, porque os juros no Brasil são muito altos e aumentam o peso do endividamento no orçamento pessoal.
Veículo: Valor Econômico