A arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) fechou o primeiro semestre do ano com alta nominal de cerca de 12% na comparação com os seis primeiros meses de 2010. Levantamento do Valor com base nas principais economias do país - São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Bahia, Pernambuco, Goiás e Amazonas, além do Rio Grande do Norte -, mostra que esse crescimento é bem inferior ao resultado da arrecadação federal no ano e revela que o motor do crescimento de dois dígitos no recolhimento de ICMS varia muito de Estado para Estado.
Enquanto a demanda por serviços e bens de consumo no varejo explica o crescimento da arrecadação estadual, os impostos sobre a renda e sobre o lucro, além do fim dos incentivos fiscais que ainda vigoravam no começo de 2010, explicam a alta de 17% na arrecadação federal nos primeiros cinco meses do ano (último dado disponível). Na mesma comparação (janeiro a maio de 2011 e 2010), o ICMS recolhido em todos os Estados cresceu 10,2%, para R$ 119,1 bilhões, segundo o Conselho de Política Fazendária (Confaz).
O assessor de política tributária da Secretaria de Estado da Fazenda de São Paulo, Pedro Paulo Cardoso de Mello, explica que os impostos federais são mais abrangentes e aproveitam o aquecimento do emprego, da renda e de todos os setores. "As bases de tributação são diferentes. O ICMS é o imposto essencialmente do consumo, já os tributos federais, salvo o IPI, pegam a economia como um todo."
Amir Khair, especialista em contas públicas, acredita que a contribuição dada pelo crescimento da massa salarial, que gera maior recolhimento de INSS, FGTS e imposto de renda sobre salários retidos na fonte, vai continuar a ajudar a arrecadação federal até o fim do ano. Além disso, diz, "a agricultura vai contribuir um pouco mais no segundo semestre, porque há um crescimento bastante expressivo da safra neste ano, fator que vai gerar mais compra de tratores, implementos agrícolas e insumos, além de aumentar o faturamento de outros setores".
Já o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero, prevê desaceleração da arrecadação federal no segundo semestre. "Vai haver uma desaceleração no Imposto de Renda e no imposto sobre lucro das empresas, pois um bom pedaço dessas arrecadações reflete resultados do ano passado." Essa também é a percepção das fazendas estaduais.
Embora o ritmo ainda aquecido da economia brasileira no primeiro semestre também favoreça o avanço das receitas de ICMS, a arrecadação do tributo é muito heterogênea. Pernambuco registrou o maior crescimento no recolhimento do tributo nos primeiros seis meses do ano em comparação com o primeiro semestre de 2010, com variação nominal de 21,29%. Na outra extremidade, a Bahia arrecadou 4,07% mais no período.
O secretário estadual da Fazenda de Pernambuco, Paulo Câmara, conta que os investimentos em andamento no Estado explicam a forte arrecadação, que fechou o semestre em R$ 4,7 bilhões. "Vivemos um bom momento, com uma refinaria em construção, obras viárias para a Copa do Mundo e recorde de movimentações no porto de Suape. Só o ICMS que incide sobre o atacado da construção civil teve alta corrente de 38% até junho."
Em Goiás, a arrecadação de ICMS no semestre também veio forte, com crescimento nominal de 16,58% sobre o mesmo período de 2010. Mas a estratégia do Estado para justificar os R$ 4,6 bilhões em receitas se baseou na criação de um programa para cobrar dívidas atrasadas durante os meses de fevereiro, março e abril e também na adoção da substituição tributária nos setores de bebidas alcoólicas quentes (uísque, vinho, cachaça) e de autopeças - esse mecanismo dificulta a sonegação ao antecipar para a indústria a taxação de todo o ICMS da cadeia produtiva.
"Só com a recuperação de créditos conseguimos R$ 300 milhões, valor que é a metade da nossa arrecadação mensal. Também fomos bem na substituição tributária, tanto é que estudamos ampliar para outros setores, como ração", informa Simão Cirineu Dias, secretário da Fazenda de Goiás.
A arrecadação nominal de ICMS em Santa Catarina cresceu 18,5% no semestre sobre igual período de 2010, chegando a R$ 6,1 bilhões. Segundo o diretor da Secretaria Estadual da Fazenda, Almir Gorges, o setor industrial foi o principal responsável pela elevação. Considerando informações setoriais até maio, o setor de combustíveis, principal pagador do tributo, teve alta de apenas 5,7%, enquanto a agroindústria cresceu 42,5%, a indústria metalmecânica, 68%, e o segmento de automóveis e autopeças teve aumento de 42,2%.
Para Gorges, a receita está atingindo os índices de crescimento projetados. "O problema são os desembolsos", disse. Em maio, a folha de pagamento respondia por 41,3% da receita corrente líquida do governo estadual, relação que aumentará com o reajuste dos professores a partir da definição do piso nacional da categoria, aprovado quarta-feira pelos deputados catarinenses. A estimativa da Fazenda é que a alta salarial provoque impacto de R$ 469 milhões no ano, cerca de R$ 36 milhões ao mês. O governador Raimundo Colombo (sem partido), aprovou reajuste para os funcionários da Saúde, o que representará aumento de R$ 30 milhões no ano.
Em São Paulo, a receita com o tributo superou os R$ 48 bilhões no semestre, crescimento nominal de quase 11% em relação aos R$ 44 bilhões recolhidos de janeiro a junho do ano passado. Cardoso de Mello, da Fazenda estadual, explica que os recursos recebidos com o tributo este ano continuaram equilibrados, com divisão praticamente igual entre indústria, comércio e serviços e preços administrados (combustíveis, energia e telecomunicações).
"Como a economia paulista é muito diversificada, não dependemos de um setor especificamente. Os setores que mais crescem estão ligados principalmente ao mercado interno", explica Cardoso de Mello. De janeiro a maio, a arrecadação de ICMS em São Paulo na indústria cresceu 8,5% sobre o ano passado, com destaque para o setor plástico, com variação de 19%. O ICMS de comércio e serviços cresceu 12,5% nos primeiros cinco meses do ano, e o principal responsável foram as cobranças nas concessionárias de veículos, com alta de 15,4% - as variações não levam em conta a inflação.
O melhor desempenho do ICMS paulista entrou na categoria preços administrados, que teve alta nominal de 14,5% de janeiro a maio. A maior variação, de 22,5%, ficou na conta combustíveis. "Em 2006, reduzimos a alíquota do etanol de 25% para 12% e mantivemos a da gasolina em 25%. Como faltou álcool no mercado no ano passado, e este ano o produto estava muito caro, tivemos perda grande na arrecadação sobre o consumo de etanol. Isso estimulou a procura por gasolina, cuja tributação é maior", diz Cardoso de Mello.
Na visão das secretarias estaduais de Fazenda, o segundo semestre reserva duas tendências para a arrecadação de ICMS: acomodação e desaceleração do atual ritmo de evolução das receitas. "Pelo comportamento do PIB e da inflação, nossa arrecadação vai arrefecer. Na verdade, tende a cair, mas vamos dar muito trabalho à fiscalização e tentar fechar o ano com crescimento nominal de 10%", diz Cirineu Dias, de Goiás. Em Pernambuco, será difícil manter o ritmo de crescimento nominal superior a 20% do primeiro semestre. "A margem de comparação para este ano é muito maior do que tivemos em 2009", diz o secretário da Fazenda, Paulo Câmara.
Veículo: Valor Econômico