Evolução dos preços de serviços não prioritários já representa uma alta acumulada de 9,24% em 12 meses.
A ascensão das classes C e D tem estimulado a formação de um novo perfil de consumidor. Levantamento da Fundação Getúlio Vargas (FGV), feito a pedido da Agência Estado, mostra que a evolução dos preços de serviços não prioritários no orçamento familiar, como espetáculos, salão de beleza e academia de ginástica, já representa uma alta acumulada de 9,24% em 12 meses até junho no Índice de Preços ao Consumidor (IPC-BR).
O recorte da FGV mostra que serviços que podem ser denominados de "supérfluos" - uma novidade no orçamento da população de renda mais baixa - são responsáveis pela maior parte do incremento dos preços no segmento. No IPC-BR, os preços dos serviços não comercializáveis, que incluem despesas com médicos e funerárias, por exemplo, acumula alta de 8,5%, enquanto a inflação varejista média, pelo mesmo indicador, é de 6,40%. Em paralelo, no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE, a inflação de serviços mostra elevação de 8,7% em 12 meses
Analistas alertam que a inflação dos supérfluos só tende a crescer nos próximos anos, capitaneada por renda em alta e crédito ainda elevado. Para o economista e professor das faculdades Ibmec Felipe Lacerda, esta é uma conseqüência do aumento da renda e da maior criação de vagas formais na economia. Ele lembra que, desde abril de 2008, o IBGE tem apurado mensalmente massa de renda média real habitual dos trabalhadores acima de R$ 30 milhões. Entre 2002 e 2008, este valor oscilava na faixa dos R$ 20 milhões por mês. "Além dos salários, ainda temos a oferta de crédito, cuja demanda ainda está forte", lembrou.
Pressão -O economista da FGV André Braz selecionou 16 serviços pesquisados pelo IPC-BR que são mais atrelados à recreação, estética, ou terceirização de atividades domésticas. Estas atividades, diz, serão fonte constante de pressão na inflação do varejo, visto que a demanda não dá mostras de arrefecimento. "Os consumidores que eram de classes mais baixas estão incorporando em seu orçamento serviços aos quais antes não tinham acesso. E estes serviços são uma tentação de consumo", comentou.
No detalhamento, é fácil constatar como a chamada "nova classe média" brasileira vem alimentando a inflação. Muitos preços de serviços já apresentam alta de dois dígitos em 12 meses, como teatro (11,12%); alfaiate e costureira (10,98%); clube de recreação (10,75%); hotel (12,83%); passagem aérea (13,71%). Também sobem forte gastos com empregados domésticos (7,11%) e salão de beleza (9,90%).
Outros preços permanecem acima da inflação média do varejo no período de 12 meses. o caso de show musical (7,24%); academia de ginástica (8,42%); e lavagem de carros e lubrificação (7,31%). Braz lembrou que estes serviços refletem aumento no poder aquisitivo. Poderiam ser substituídos por opções mais baratas ou simplesmente não constar do orçamento.
Um dos exemplos mais emblemáticos da demanda por este tipo de serviço é o mercado de beleza, que cresce 20% ao ano, segundo o presidente da Associação Brasileira de Salões de Beleza (ABSB), Kyrlei Boff. "O mercado movimentou R$ 24 bilhões em 2010, R$ 6 bilhões somente no segmento de cabelos", disse Boff, que também é presidente da rede de salões Lady&Lord no Paraná. "O que temos aqui é um consumidor com mais dinheiro no bolso, combinado com um aumento na expectativa de vida do brasileiro, que agora pensa em se cuidar mais."
A administradora de cartões Sorocred notou aumento de 40% na procura por crédito via empréstimo pessoal, entre R$ 1.000 e R$ 2.000, do segundo semestre de 2010 para o primeiro semestre de 2011. "As classes de baixa renda estão ainda dando os primeiros passos na cultura de consumo. Tudo é novo" disse o diretor de marketing da Sorocred, Wilson Justo.
Para ele, entre as famílias que ascenderam, existe uma demanda latente por estes produtos e serviços que até pouco tempo eram artigos de luxo. "Estes clientes, cada vez mais otimistas com o futuro, tendo salários pagos em dia e com carteira assinada, vão se utilizar de créditos que tenham até um pouco mais de juros, mas que os atendam na hora. Veremos este cenário por um longo tempo", afirmou. (AE)
Veículo: Diário do Comércio - MG