Sinais de desaceleração são mais fracos no varejo do que na indústria

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O cruzamento de dados do varejo e da indústria mostra que a desaceleração da atividade econômica é muito mais resistente no comércio do que na produção industrial. Enquanto o ritmo de crescimento na fabricação de bens de consumo passou de 6,4% no fim de 2010 para 2,3% nos 12 meses encerrados em maio, as vendas do comércio ampliado em volume, na mesma comparação, fecharam 2010 com alta de 12,2% e passaram para 10,5% no acumulado de 12 meses terminados em maio.

 

A análise dos resultados da Pesquisa Mensal do Comércio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PMC-IBGE), divulgada ontem, divide os analistas. Enquanto alguns veem as vendas como sinal de um mercado ainda aquecido e, por isso, mais um indicador que reforça a necessidade de medidas adicionais do Banco Central, outros destacam que as medidas macroprudenciais estão sim fazendo efeito sobre o varejo, o que não exigiria aumentos extras na taxa básica de juros (além do 0,25 ponto esperado para a próxima semana) ou novas medidas de restrição ao crédito.

 

O volume de vendas do comércio varejista restrito cresceu 0,6% em maio frente a abril, com ajuste sazonal. No comércio ampliado, que inclui veículos, motos e partes e materiais de construção, o avanço na mesma base foi de 1%, também na série livre de sazonalidades e em volume. Na comparação com 2010, o varejo também cresce bem acima da produção: 7,4% (restrito) e 9,5% (ampliado) em comparação a uma produção 1,8% maior no total da indústria e 0,9% superior em bens de consumo.

 

Para o economista-chefe da RC Consultores, Fábio Silveira, os resultados do varejo são compatíveis com o momento da economia e não justificam mais um aumento da Selic, hoje em 12,25%. Os dados anuais chamaram sua atenção. O segmento que inclui automóveis cresceu 25,9% em maio frente ao mesmo mês do ano anterior, e o de móveis e eletrodomésticos, 20,4%. O varejo ampliado teve alta de 12,8% na mesma comparação. "Os dois estão destoando, mas ainda não podemos dizer que há evidente evolução acentuada desses segmentos, sinalizando que as medidas [macroprudenciais] são insuficientes", avalia Silveira.

 

Segundo o economista-chefe da RC, o varejo mostra desaceleração se forem observados os setores nos quais os consumidores fazem seus gastos correntes, como o de bens não duráveis, com avanço de 1,9% sobre maio de 2010, e o de tecidos, vestuário e calçados, com crescimento de 5,6% na mesma ordem.

 

Alguns economistas, por outro lado, esperavam um recuo maior no ritmo de crescimento das vendas em maio e acreditam que a pesquisa de comércio reforça a tendência de um ajuste mais prolongado na Selic. "Esperávamos uma desaceleração um pouco maior do varejo no primeiro semestre, mas ela ainda não está ocorrendo no ritmo que projetámos", afirma Thaís Marzola Zara, economista-chefe da Rosenberg & Associados, para quem os dados do varejo "reforçam a expectativa de uma Selic de 13% no final do ano e tornam possível a adoção de mais medidas macroprudenciais".

 

Para Thaís, as medidas macroprudenciais adotadas pelo governo em dezembro do ano passado devem afetar mais fortemente o varejo nos próximos seis meses. "Há uma defasagem entre a implantação [de medidas] e seu efeito, e talvez a dosagem ainda não tenha sido suficiente", explica.

 

O economista Ricardo Denadai, da Santander Asset Management, toma como exemplo o setor automotivo para explicar os eventuais impactos das medidas do BC no consumo. Segundo ele, as concessões de crédito para a compra de veículos recuaram e já começam a afetar as vendas e há um elevado nível de estoque nas montadoras. "Embora as vendas de carros no ano ainda tenham vindo forte, dá para dizer que elas se estabilizaram num patamar bastante alto e pararam de expandir. O efeito das macroprudenciais está aí, mas se deu mais no sentido de evitar a continuidade da expansão das vendas do que impor algum tipo de recuo", pondera Denadai.

 

Para Fernando Montero, da Corretora Convenção, as medidas macroprudenciais não afetam tanto o varejo por causa do câmbio valorizado. "O consumo de importados continua aumentando", diz. Ele também diz que as restrições do BC não têm efeito de forma isolada, elas sofrem influência da taxa básica de juros e da política fiscal do governo. "Acredito nas macroprudenciais combinadas com a desaceleração fiscal para afetar a atividade, por isso o varejo e a indústria crescerão menos a partir de junho. Mas o movimento de aceleração voltará a partir do ano que vem, com mais gastos governamentais e aumentos de salários indexados", argumenta Montero.

 

O teor do Relatório de Inflação do BC do segundo trimestre do ano - e não os dados de maio de varejo e indústria - levou o Santander Asset Management e a Convenção a ampliar suas expectativas de alta na Selic de 12,50% para 12,75% para o fim deste ano.

 

Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator, a diferença entre a produção industrial e a venda no varejo é explicada pelo aumento das importações. O crescimento do varejo está sendo atendido pela importação, de modo que o crescimento menor da produção industrial não é necessariamente efeito da política monetária, diz ele. A projeção do Fator para a taxa de juros no final do ano foi revista para 12,75% antes dos dados de vendas do varejo.

 

Na avaliação de Reinaldo Pereira, gerente da coordenação de serviços e comércio do IBGE, os preços mais baratos de produtos importados ajuda a explicar o desempenho do varejo. "Independentemente das medidas macroprudenciais, as atividades mais sensíveis ao crédito continuam fluindo", disse. "O crédito pode estar mais restrito, mas tem justificativa [para que as vendas cresçam], que está no preço", ponderou.

 


Veículo: Valor Econômico


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