A concorrência com os importados que tanto incomoda o setor de calçados agora também atinge os fabricantes de matérias-primas e insumos calçadistas. Mesmo sendo a primeira indústria do mundo em volume de produção de couro cru e apesar de ocupar o quarto lugar em vendas, exportando 50% do que é fabricado, a maioria dos cerca de 700 curtumes existentes não participa da riqueza gerada pelo setor, com a fabricação de produtos de maior valor agregado, segundo o presidente do Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil (CICB), Goerlich Wolfgang Goerlich.
Com um faturamento estimado em US$ 3,5 bilhões este ano, dos quais US$ 2 bilhões obtidos com exportações, o setor quer investir em inovações para enfrentar a guerra cambial, assim como os custos mais caros do mundo e, assim, continuar vendendo - especialmente para o segmento calçadista, responsável pelo consumo de mais de 20% do couro produzido.
Em 2010, o faturamento chegou a US$ 3 bilhões no mercado interno, e cerca de US$ 563 milhões com exportações, boa parte delas decorrente principalmente do trabalho realizado junto a compradores internacionais em parceria com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex Brasil).
Por outro lado, as importações atingiram cerca de US$ 1,2 bilhão no ano passado, segundo presidente Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal), Oseas Schroeder. Nesse total estão incluídos diversos produtos que a indústria de componentes trabalha, não somente couro e artefatos para o setor calçadista e de vestuário.
No total, o setor de insumos registrou crescimento de 15% no primeiro semestre em relação ao mesmo período de 2010, e que chega a 21% no acumulado de 12 meses, conforme a Assintecal.
"Vendemos para mais de 157 países, com destaque para Argentina, EUA, Alemanha, Holanda, México e Venezuela. Mas os gastos com importação em junho foram de US$ 226 milhões, o que representa um aumento de 29% em comparação a junho de 2010."
O grupo Amazonas aposta na inovação para diversificar e sustentar seu desempenho, segundo o gerente de Marketing, Ariano Novaes. A empresa, famosa pelos solados de calçado, estima fechar 2011 com um faturamento 17% maior que o do ano passado, em torno de R$ 470 milhões. Com oito fábricas e mais de 2,4 mil funcionários, 60% da matéria prima utilizada pela empresa é importada, "para manter a competitividade dos produtos da marca". Para o gerente uma vantagem da Amazonas é sua produção diversificada, indo de componentes para calçados até o moveleiro e de embalagens.
Já a Cipatex - que começou fabricado laminados sintéticos para o setor de calçados e hoje atende diversos segmentos, como o moveleiro, automotivo, impermebialização de solos, entre outros - fechou 2010 com um faturamento de R$ 700 milhões, sendo R$ 250 só em produtos para calçados. O diretor-geral Marcelo Nicolau afirma que a companhia espera crescer cerca de 15% este ano. A produção gira em torno de 12 milhões de metros lineares, e para garantir a competitividade a Cipatex controla seus estoques e prefere o suprimento nacional, mais acessível em questão de logística e na maioria dos casos de melhor qualidade. "Exportamos muito pouco, a maior parte vai para o Mercosul, por causa do câmbio, aliado ao aquecimento do mercado interno", explica Nicolau.
Goerlich, entretanto, lembra que as vendas para o exterior são pagas em dólar, enquanto o custo das indústrias é em reais. "A valorização da moeda brasileira frente à americana acaba por diminuir em muito os lucros, já afetados pela carga tributária."
Segundo Goerlich, essa situação provocou nos últimos 4 anos uma redução de ganhos de 32% ao se converter para reais. Para ele, uma das consequências dessa situação é a mudança do parque fabril de grandes empresas para países da América Central, e no caso da indústria de calçados até mesmo para Índia e outras regiões do continente asiático.
"Temos de exportar, pois a ascensão das classes C e D brasileiras não se reflete com igual intensidade na compra de produtos a base de couro, que possuem um maior valor agregado", explica o presidente do CICB.
Fazendo coro ao setor calçadista, o diretor superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel, diz que para evitar esse problema é fundamental ter uma politica de estimulo à indústria e à inovação. "O País é um grande gerador de artigos científicos e pesquisas, mas pouco chega a ser desenvolvido pela indústria nacional. Isso tem que mudar", diz Pimentel.
Veículo: DCI