Impostos freiam aplicações no setor financeiro, mas investimentos produtivos crescem 170% no semestre
Queda no valor do dólar ajuda governo a conter preços, mas reduzirá ritmo de crescimento da economia neste ano
O investimento estrangeiro no setor produtivo da economia atingiu volume recorde no primeiro semestre deste ano, anulando os efeitos das medidas adotadas pelo governo para conter a entrada de dólares no país.
Estatísticas divulgadas ontem pelo Banco Central mostram que o volume de recursos externos com vistas à produção no Brasil somou US$ 32,5 bilhões nos primeiros seis meses do ano, 170% a mais que no primeiro semestre do ano passado.
É o maior valor desde que o BC começou a série histórica, em 1947.
Aumentos de impostos e outras medidas adotadas pelo governo nos últimos meses reduziram aplicações de investidores estrangeiros em títulos financeiros e captações de empréstimos externos por empresas brasileiras.
Mas o resultado foi anulado por investimentos diretos e dólares trazidos por companhias brasileiras com filiais no exterior.
A oferta maior da moeda americana faz cair seu valor em reais e ajuda o BC a conter a inflação, porque barateia produtos importados que concorrem com mercadorias feitas no país.
Mas o dólar fraco prejudica indústrias brasileiras que exportam sua produção, porque as torna menos competitivas no mercado internacional. Isso contribui para frear a atividade econômica.
Ontem, a cotação do dólar atingiu R$ 1,537, valor mais baixo desde janeiro de 1999, quando o país adotou o regime que até hoje permite que a moeda flutue no mercado.
Na semana passada, a presidente Dilma Rousseff disse que seu objetivo é controlar a inflação sem sacrificar o crescimento da economia, mas ela encontra dificuldades crescentes para conciliar os dois objetivos. "É um equilíbrio delicado", disse o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC.
Ele observa que a queda do dólar ajudou a segurar os preços de produtos industrializados até aqui, mas estatísticas recentes mostram que a pressão maior agora vem dos preços dos serviços, sobre os quais o câmbio não tem influência direta.
Como os números do BC mostraram, os instrumentos que o governo tem para conter a entrada de dólares são tímidos. "As últimas tentativas de interferir no câmbio se mostraram infrutíferas", afirmou Edward Amadeo, da Gávea Investimentos.
Relatório apresentado ontem pela Unctad, uma agência das Nações Unidas, mostra que o Brasil foi o quinto país que mais recebeu investimentos estrangeiros produtivos no ano passado. Em 2009, o país foi o 15º mais atrativo para os estrangeiros.
INCERTEZAS
As crises nos EUA e na Europa contribuem para as dificuldades do governo porque geram incertezas entre os investidores e tendem a frear o ritmo da economia mundial.
O economista-chefe do Merrill Lynch no Brasil, David Becker, observa que o ajuste nas contas do governo dos EUA para conter seu endividamento deve esfriar a economia americana.
"Isso terá reflexos no preço das matérias-primas e no crescimento global", disse Becker. O resultado poderá ser uma piora na capacidade de financiamento mundo afora. Com menos dinheiro para investir e menor demanda por produtos como os que o Brasil exporta, menor será o crescimento do país.
Veículo: Folha de S.Paulo