Setores mantêm produção em alta, apesar dos importados

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Nem todos os setores industriais tiveram crescimento raquítico no ano passado. Embora tenha sido possível notar um claro descasamento entre indústria e varejo - a produção ficou praticamente estagnada e as vendas avançaram cerca de 7% -, em alguns setores a produção e o consumo seguiram lado a lado.

No caso do setor de motos, a entrada dos chineses no mercado brasileiro não intimidou a indústria nacional, que registrou em 2011 aumento de 17% na produção. "O brasileiro está buscando melhor qualidade de vida e as motos permitem poupar tempo. Além disso, o custo de manutenção de uma moto é menor", diz Moacyr Alberto Paes, diretor-executivo da Abraciclo, entidade que reúne os fabricantes do setor.

Segundo ele, as importações, que abocanham cerca de 10% do mercado de motocicletas no Brasil, se concentram nos extremos dos modelos ofertados. Motos de luxo, de alta cilindrada, como as fabricadas pela Ducati, KTM e BMW, chegam da Itália, Áustria, Índia e Alemanha, mas a maior parte das compras externas, destaca Paes, vem da China, com produtos mais simples e baratos.

"É muito comum no Nordeste as empresas importarem motos chinesas e colocarem a sua marca. A venda não é feita em concessionárias, mas em supermercados e lojas de departamento. Por isso, não há garantia nesses produtos", diz o diretor-executivo da Abraciclo.
 

O comércio de motos no Nordeste se acelerou nos últimos meses, permitindo à região tomar a dianteira das vendas no país. Em 2010, o Nordeste dividia a posição com o Sudeste, já que cada região detinha 34% de participação nas vendas no varejo, de acordo com o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). No ano passado, esse percentual subiu para 35% no Nordeste e permaneceu em 34% no Sudeste.

Para escapar das longas horas de congestionamento em São Paulo, cidade que conta com mais de 7 milhões de automóveis, o vendedor de materiais elétricos Arquimedes Bonatti praticamente abandonou o transporte em quatro rodas. "Só uso carro quando preciso carregar muita carga", afirma. "Tenho fobia de trânsito parado."

No ano passado, ele trocou sua Yamaha 2006 por um modelo zero quilômetro, e se diz muito satisfeito, não só com a facilidade de locomoção propiciada pela motocicleta, mas também com a economia no orçamento. "Gasto com a moto um terço do combustível que seria necessário para rodar com o carro. Além disso, o IPVA é mais barato e, quando viajo, pago menos em pedágios."

Dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) mostram que o número de emplacamentos de motos em 2011 cresceu 7,6% na comparação com o ano anterior. "Esse avanço se deve principalmente ao crescimento da renda", afirma Flávio Meneghetti, presidente da entidade.

À primeira vista, o percentual parece baixo frente ao aumento de 17% na produção no período, mas Paes, da Abraciclo, lembra que em algumas regiões do país é comum as motos circularem sem placas. "As motocicletas produzidas no Brasil são consumidas no país. A exportação é muito pequena, cerca de 3% apenas", diz Paes.

O fôlego desse mercado poderia ter sido ainda maior, na avaliação de Meneghetti, se o governo não tivesse lançado medidas para esfriar o consumo no começo do ano passado. "Os bancos se tornaram muito mais seletivos na concessão do crédito, e isso afetou sobretudo os mais pobres, que são os principais compradores de motos", observa, acrescentando que a cada quatro solicitações de financiamento, apenas uma é aprovada.

Os aumentos nos juros e no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), além das restrições para compras sem entrada, se refletiram também nas vendas de automóveis. O crescimento em 2011 foi de 2,9%, ao passo que a produção avançou 0,7%. "Com a reversão dessas medidas, esperamos um resultado melhor em 2012, à medida que as prestações voltem a caber no bolso das famílias", prevê Meneghetti.

A expansão da frota de carros e motocicletas no ano passado contribuiu para a ampliação da produção e das vendas de combustíveis no país. O comércio de etanol, gasolina, diesel e lubrificantes aumentou 1,7% em 2011, até novembro, enquanto a produção desses produtos teve alta de 0,9%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

"O maior desafio do setor de combustíveis é conseguir acompanhar a indústria de veículos. A Petrobras já está operando com capacidade máxima e ainda assim temos que importar gasolina para atender à demanda doméstica", diz Paulo Miranda Soares, presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis), acrescentando que o crescimento da classe média é o principal motor deste mercado.

As melhorias nas condições de emprego e renda da população brasileira também são apontadas como fatores fundamentais para o desenvolvimento do setor de saúde e beleza no país. O comércio de artigos farmacêuticos, médicos, de ortopedia e perfumaria aumentou 10% entre janeiro e novembro de 2011, na comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo o IBGE. A mesma taxa de crescimento é projetada pela Associação Brasileira da Indústria de Produtos de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec) para o setor em 2011.

As vendas de produtos não classificados como medicamentos foram as que puxaram os resultados das farmácias e drogarias nos primeiros nove meses de 2011. O aumento foi de 25,7% sobre o mesmo período de 2010, propiciando uma expansão de 19,2% no faturamento do setor, de acordo com a Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma).

O comércio de medicamentos também teve crescimento significativo, de 16,7%, acompanhando o aumento da produção nacional, que, segundo o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), foi de 13% em 2011. "A expansão da renda está permitindo às pessoas cuidarem melhor da saúde, por meio da contratação de serviços médicos aos quais antes não tinham acesso. Com isso, a demanda por medicamentos sobe", explica Nelson Mussolini, vice-presidente-executivo do Sindusfarma.

Ao usar mais serviços médicos e de estética, argumenta José Augusto Queiroz, diretor da Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo), os brasileiros também estão impulsionando a produção de equipamentos médico-hospitalares, além de itens como implantes dentários e próteses de silicone. De janeiro a novembro de 2011, a fabricação desses produtos aumentou 10,6%, de acordo com o IBGE. "Estamos crescendo também devido às exportações, que em 2011 subiram 12,6%", diz Queiroz.

Outro setor em que tanto a produção industrial como as vendas no varejo estão aquecidas é o de construção. Pelo levantamento do IBGE, o comércio de materiais de construção cresceu 9,5% de janeiro a novembro, e a fabricação de insumos para a construção civil teve alta de 4,2% no mesmo período.

Os dados da Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção (Anamaco) mostram um crescimento mais modesto nas vendas no varejo, de 4,5% em 2011. O presidente da entidade, Cláudio Conz, explica que a divergência nos números se deve à forma como as informações foram coletadas.

"Com a implantação da substituição tributária no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul, o ICMS passou a ser recolhido antes que a venda no varejo fosse efetivada. Isso acabou distorcendo o resultado do IBGE", diz Conz. Segundo ele, com o tempo as bases de comparação voltarão a ser iguais, anulando o efeito estatístico gerado pela alteração na cobrança do imposto.

De tudo que é produzido pela indústria de materiais de construção, dois terços, segundo Conz, vão para o varejo. Os produtos são utilizados não só em reformas, mas também na construção de moradias. Um estudo da consultoria Booz Allen Hamilton mostra que mais de 70% das residências produzidas no Brasil são feitas pelos próprios moradores com a ajuda de parentes e amigos ou por profissionais por eles contratados. "O déficit habitacional no país não é só quantitativo. É qualitativo também. Muitas casas estão de pé, mas sem acabamento", afirma.

A lista de fatores apontados pela Anamaco que movimentam o setor de construção é extensa, incluindo desde casamentos e divórcios até a preocupação com a segurança. "As pessoas estão cada vez mais querendo ficar em casa. Serviços como TV por assinatura e internet em alta velocidade contribuem para isso", observa o presidente da entidade. "Enquanto o emprego e a renda estiverem em expansão, a construção continuará crescendo."


Veículo: Valor Econômico


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