Os Estados do Sul e do Sudeste se articulam para promover mudanças nos projetos que o governo enviou à Câmara e ao Senado para levar adiante a unificação das alíquotas interestaduais de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Estão na pauta uma resolução a ser apreciada apenas pelo Senado, que trata da convergência das alíquotas de 12% e 7% para 4% em 12 anos, uma medida provisória (número 599, de 2012) que cria os fundos de compensação e de desenvolvimento regional, e um projeto de lei complementar que altera o indexador das dívidas de Estados e municípios com a União - passa do Índice Geral de Preços (IGP-DI) para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA).
O primeiro sinal dessa articulação é o volume de emendas apresentadas à MP 599. Das 218 proposições, mais de 150 foram apresentadas por deputados e senadores dos Estados do Sul e Sudeste, que respondem por mais de 70% da arrecadação nacional desse imposto. E na pauta estão as principais reivindicações do bloco, como a redução no prazo de convergência, de 12 anos (pelo projeto apresentado pelo governo) para oito anos, e uma avaliação mais criteriosa da convalidação dos benefícios.
De acordo com o secretário de Fazenda do Paraná, Luiz Carlos Hauly, há "toda uma estratégia" para poder encaminhar o trâmite das propostas e tentar proteger os interesses desses Estados.
Segundo Hauly, a proposta original do Ministério da Fazenda para a reforma do ICMS era boa, mas, no fim, o governo parece ter cedido aos Estados de Norte, Nordeste e Centro-Oeste e apresentou uma proposta com prazos e outros pontos diferentes dos previamente discutidos no Confaz.
Segundo o deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP), a ideia é mesmo fazer uma pressão nas comissões e no parlamento, para levar o Executivo a discutir esses pontos. "Há essa disposição de mobilização entre Sul e Sudeste", disse.
Outro ponto questionado pelas emendas do bloco é o tratamento diferenciado dado à Zona Franca de Manaus, que manterá a alíquota de 12%, assim como as operações de gás natural do Mato Grosso do Sul.
Mais uma reivindicação comum do grupo é o aumento do fundo de compensação. Pelas emendas, o montante máximo que tal fundo disporia anualmente para compensar as perdas com a transição de tarifas teria de subir de R$ 8 bilhões para R$ 12 bilhões.
Ainda de acordo com Hauly, os Estados do Sul e do Sudeste estão descontentes com outra proposição do projeto de lei, que é a mudança no quórum do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) para aprovação da remissão (perdão) e convalidação dos benefícios já concedidos.
Pela proposta, a necessidade de unanimidade das decisões deixaria de existir por um ano, para que essa etapa fossa levada adiante.
A negociação das propostas em conjunto interessa aos Estados dessas regiões porque, se depender apenas da resolução do Senado, as chances de uma vitória política são pequenas, já que, nessa Casa, essas bancadas são minoritárias. A MP e o projeto de lei complementar são aprovadas primeiro na Câmara dos Deputados e depois no Senado.
O presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE) - onde está tramitando o projeto de resolução e também está em discussão a mudança dos critérios de rateio do Fundo de Participação dos Estados (FPE) -, Lindbergh Farias (PT-RJ), decidiu designar um senador para acompanhar a tramitação, na Câmara, do projeto de lei complementar.
A ordem dos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara dos Deputados, Henrique Alves (PMDB-RN) é acelerar a discussão da reforma do ICMS e do FPE em março.
Nesta semana estão previstas audiências públicas no Senado com técnicos, secretários de Fazenda e representantes do Ministério da Fazenda. E no dia 13 está agendada uma reunião entre os governadores e os presidentes das duas Casas. A pauta é a mudança no FPE, mas será inevitável a discussão dos outros itens da questão federativa.
Segundo o senador Delcídio Amaral (PT-MS), relator na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do projeto de resolução unificando o ICMS, o governo gostaria que o "pacote todo" de questões federativas que estão em tramitação - reforma do ICMS, negociação das dívidas e FPE - fosse aprovado até o fim do primeiro semestre.
"Essa pauta do ICMS, do FPE e da negociação da dívida dos Estados é a pauta econômica mais importante do governo Dilma. Portanto, acho que a federação brasileira precisa fazer um esforço grande pelo entendimento. Resolver essas questões será um grande avanço para os Estados, para a federação e para o governo federal", disse.
Junto com a discussão do fim da guerra fiscal, os governadores de todos os Estados querem tratar de reduzir o limite de comprometimento da receita líquida de 15% para 9%.
O senador Walter Pinheiro (PT-BA), que é relator da MP que trata dos fundos de compensação - e condiciona o auxílio financeiro à aprovação da resolução do Senado, cujos termos estão reproduzidos no texto da MP -, acha difícil fazer uma negociação conjunta de todas as propostas relativas ao pacto federativo. Pinheiro afirma também que as bancadas de todos os Estados - e não apenas as das regiões Sul e Sudeste - estão se movimentando para defender seus interesses nessa discussão dos projetos que mudam a relação entre os entes federados.
"Todo mundo tem sua própria reivindicação. É muito cedo para dizer quais pontos estão sujeitos a mudanças. Até porque tem 400 propostas. A tendência natural é que [as negociações] se afunilem na questão do prazo do ICMS e dos fundos de compensação", afirma Pinheiro.
O petista pretende negociar com cada Estado ou, pelo menos, com blocos de Estados por região para ir "ajustando o interesse de um ao interesse de outro e ver como equalizar uma proposta que atenda aos 27 Estados". Ele diz que a tarefa é difícil, mas acha possível chegar a um ponto de equilíbrio.
O líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), acredita numa negociação que envolva todas as questões do pacto federativo. "Um diálogo federativo no conjunto não pode ser evitado", afirma. Citando a derrubada dos vetos da presidente Dilma Rousseff à mudança na distribuição dos royalties e participações especiais do petróleo, que levará a uma grande perda de receita principalmente para o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, Braga diz que essas unidades têm o "legítimo direito" de reivindicar a defesa dos seus recursos. Ele afirma que não há negociações em curso para que os dois Estados, os maiores confrontantes com áreas petrolíferas no mar, sejam compensados. Mas, como senador da República - e não como líder do governo -, acha que seria justo, por exemplo, que os Estados produtores fiquem com 4% do ICMS do petróleo. A adoção dessa regra exigiria mudança no texto constitucional, pelo qual o ICMS do petróleo é cobrado no Estado de destino.
Para o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), deixar parte do ICMS do petróleo no Estado de origem seria "a correção de uma injusta", mas rejeita a possibilidade de esse assunto ser discutido como compensação pelas perdas dos royalties. "Não podemos tirar o foco dos royalties. Temos que brigar por eles."
Veículo: Valor Econômico