Embora as expectativas de inflação este ano tenham sido elevadas recentemente, as estimativas para o rumo do IPCA embutidas nos títulos públicos ligados à inflação, as NTNs-B, já começam a ceder. Esse movimento reflete uma mudança das posições de investidores mais pessimistas com os índices de preços. E foi detonado pela percepção de que o ápice do fôlego da inflação corrente, especialmente dos alimentos, pode ter ficado para trás.
Segundo informações do mercado, a inflação projetada pela NTN-B com vencimento em 2016 cedeu de 6,39%, no dia 16 de abril, para 6,15% ontem. No caso do título para maio de 2015, a taxa saiu de 6,80%, no dia 8, para 6,46%. E, para 2018, de 6,16% para 6,07%.
A trajetória da inflação implícita nas NTN-Bs - diferença entre o rendimento desse título público e o contrato futuro de Depósito Interfinanceiro (DI) de prazo equivalente - tradicionalmente antecede os movimentos das projeções para o IPCA feitas pelos economistas. Em muitos casos, há um exagero - para cima ou para baixo. Um bom exemplo é o fato de a inflação implícita ter superado o intervalo superior da meta de inflação (6,5%) muito antes da Pesquisa Focus mostrar, na última terça-feira, que a previsão do IPCA estava acima da linha de 6,5%.
A queda recente da inflação implícita parece, portanto, apenas uma correção dos exageros observados antes. O que justifica esse ajuste é o comportamento das pesquisas de preço, especialmente das coletas diárias feitas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), que são acompanhadas com lupa pelos especialistas, por representarem uma boa medida de tendência do indicador de inflação.
Pelo conceito de ponta, que mede a evolução dos preços na margem, o IPCA alcançou uma taxa de 0,58% ontem. Para se ter uma ideia, no dia 1º de abril, essa taxa estava em 1,16%. "O mercado refez as contas e viu que carregar uma posição em NTN-B fica muito caro", diz um profissional. "Talvez a aposta fosse em um quadro ainda mais negativo, e muita gente foi surpreendida com a inversão dos indicadores de inflação."
Para ficar "comprado" em inflação implícita, o investidor tem de adquirir uma NTN-B e também um contrato de DI futuro de prazo equivalente. Quanto mais a inflação subir, maior o ganho desse agente. Com a queda das coletas diárias de preços, esse ganho não foi concretizado. Isso levou a uma onda de ordens de "stop loss", quando o agente sai da posição para encerrar o prejuízo. Zerar a posição em inflação implícita significa vender contratos de DI. É por isso que essa correção tem como efeito colateral a queda dos juros futuros, especialmente os mais longos.
Nos três pregões desta semana, a taxa do DI para janeiro de 2017 recuou 0,15 ponto percentual, indo a 12,19% na sessão de ontem. "Havia gestores mais pessimistas, apostando em uma inflação ainda pior. Com o fluxo de recursos externos e as coletas de inflação um pouco melhores, eles capitularam", diz Fernando Aldabalde, sócio e gestor da GS Allocation.
Esse comportamento revela mais uma correção de excessos que um cenário mais tranquilo para a inflação. Após a variação de 0,92% do IPCA em março, diversos economistas elevaram as projeções para a inflação este ano. Mesmo com o arrefecimento das leituras mensais, o IPCA acumulado em doze meses deve superar o intervalo superior da meta em meados deste ano, com riscos grandes de terminar 2014 acima de 6,5%.
O economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa, projeta IPCA de 0,72% em abril e de 0,44% em maio. Mesmo com arrefecimento daqui para frente, as leituras mensais de inflação serão maiores que as observadas em igual período do ano passado, levando a uma alta do IPCA acumulado em 12 meses. Pelas projeções de Rosa, o índice atinge 6,8% em agosto e permanece rodando acima de 6,5% até novembro. "Por mais que a inflação corrente afete as expectativas, não vejo como uma revisão das projeções para o IPCA este ano. O problema é a inflação reprimida dos preços administrados", afirma.
Veículo: Valor Econômico