Japão olha o futuro e releva PIB fraco do Brasil

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Por Tatiane Bortolozi, Eduardo Laguna, Rodrigo Pedroso e Luciano Máximo | De São Paulo


Com a missão de reforçar presença e investimentos no Brasil e não ficar muito atrás da China na América Latina, governo e empresários japoneses estão menos preocupados com o cenário brasileiro atual de baixo crescimento econômico e inflação em alta. Eles preferem concentrar suas energias no que a economia do país pode agregar a seus negócios no médio e longo prazo, embora tenham críticas parecidas às de empresas nacionais: questionam a alta e complexa carga tributária, a precariedade da infraestrutura (estradas, portos e aeroportos) e cobram melhor qualificação da mão de obra.

Durante o Fórum Econômico Brasil-Japão, evento organizado pela Jetro, agência de comércio exterior do Japão, Valor e Nikkei, que reuniu no sábado, em São Paulo, o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, e cerca de 300 empresários japoneses e brasileiros, o presidente para a América Latina da Mitsubishi Corporation, Seiji Shiraki, disse que o Brasil tem uma economia promissora, para ser olhada no longo prazo, e que a multinacional pretende continuar investindo no país, sempre com estratégia de "décadas".

"Não estamos aqui olhando para amanhã ou depois de amanhã. Não somos americanos, não queremos resultados em três meses. Estamos no Brasil há 60 anos e, queremos crescer nos próximos dez, 20 anos", afirmou Shiraki. O executivo acredita que o atual momento da economia brasileiro será superado no médio prazo. "Nos últimos 12 anos do governo do PT, o PIB [Produto Interno Bruto] cresceu uma média anual de pouco menos de 3%. É um grande número. Para os próximos dez anos não será muito diferente, a economia brasileira é promissora", reiterou Shiraki, acrescentando que vê oportunidades para a Mitsubishi crescer no país, principalmente nos setores automotivo, naval e agrícola.

Shiraki disse que a empresa tem planos de dobrar para 4 milhões de toneladas as exportações de grãos pelo Brasil, mas que as dificuldades e custos para levar todo esse volume aos portos é um entrave. Para solucionar os problemas de infraestrutura que encarecem os custos de logística das empresas, Shiraki apontou a necessidade de avanços nas parcerias entre governo a iniciativa privada em projetos como rodovias e portos. "Há um limite no que as empresas privadas podem absorver", afirmou o executivo, ao comentar as Parcerias Público-Privadas (PPP).

O economista-chefe do Bradesco, Octávio de Barros, Barros disse que investidores japoneses compram entre 15% e 40% dos papéis de longo prazo emitidos por empresas ou pelo governo brasileiro, o que indica a confiança dos asiáticos na economia do Brasil num horizonte amplo. Ele defendeu que a cooperação do Japão à economia brasileira se concentre no desenvolvimento industrial do Brasil. "Tenho confiança que um intercâmbio pode ajudar muito na busca por maior competitividade da economia brasileira", afirmou Barros, lembrando que o Japão absorve cerca de 4% das exportações brasileiras. "Esse percentual, porém, já chegou a ser de 6,5%", acrescentou.

Os obstáculos, porém, também foram apontados. A crítica mais contundente foi feita pelo presidente do conselho de administração da Toyota, Takeshi Uchiyamada, que destacou o potencial de crescimento do mercado automotivo brasileiro, mas listou as dificuldades enfrentadas pela empresa. "A energia elétrica é cara demais, os impostos são altos demais. Isso tira competitividade da economia brasileira", disse.

O executivo da Toyota, montadora que tem duas fábricas de carros no interior de São Paulo e está concluindo uma planta industrial que produzirá motores, também no interior paulista, cobrou uma política de desonerações e melhora da infraestrutura. "Precisamos fortalecer a competitividade e, enquanto indústria japonesa, vamos apoiar o Brasil para ajudá-lo a crescer", declarou Uchiyamada.

Na mesma linha, Kosei Shindo, presidente da siderúrgica Nippon Steel & Sumitomo Metal Corporation, ressaltou a intenção de contribuir com investimentos no Brasil e citou a parceria com a Vale nas minas de Carajás, no Pará, e as embarcações para transporte de minério ValeMax, importantes para a redução do frete no transporte entre os dois países.
Regis Filho/ValorSeiji Shiraki, presidente para a América Latina da Mitsubishi Corporation: estratégia para o Brasil envolve décadas

As dificuldades de fazer negócios no país também vieram à tona. "Os tributos são extremamente complexos e há a questão da propriedade intelectual. Para o fortalecimento da indústria, precisamos de um ambiente melhor de formação de recursos humanos", afirmou Shindo.

As declarações ganharam repercussão entre os executivos brasileiros. "As dificuldades apresentadas pelo presidente do conselho da Toyota, como burocracia, dificuldades de logística e muitos impostos são as mesmas vividas pela BRF ", afirmou Luiz Fernando Furlan, integrante do conselho de administração da fabricante de alimentos Brasil Foods (BRF) e ex-ministro do Desenvolvimento no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Para Gerson de Mello Almada, sócio-diretor do grupo Engevix, as perspectivas para o crescimento da economia brasileira para este ano e 2015 são pessimistas. Em conversa com o Valor durante o Fórum Econômico Brasil-Japão, ele disse que há cautela na definição de investimentos para os próximos anos por parte da companhia, que atua em vários setores (energia elétrica, indústria de base, infraestrutura, petróleo e gás e químico e petroquímico).

"Olhamos [para a economia brasileira em 2014 e 2015] pessimisticamente, preferimos aguardar oportunidades antes de determinar nossos investimentos", contou Almada. Como justificativa para expectativas negativas, ele citou "os desarmes nos setores elétricos e de petróleo e gás", que prejudicaram os negócios da empresa. Almada mencionou que a Engevix Construções Oceânicas (Ecovix), unidade do grupo em Rio Grande (RS) que produz plataformas e navios para a indústria de petróleo, está há quatro anos sem novas encomendas. "Um negócio no setor naval vive de novos projetos, sem eles tivemos de cortar 20% da mão de obra", acrescentou o executivo.

Responsável pelos investimentos e operação dos aeroportos de Brasília e São Gonçalo do Amarante, no Rio Grande do Norte, a Engevix aposta suas fichas, para 2014 e 2015, na infraestrutura. Almada citou como oportunidades projetos de parceria público-privada (PPP) em mobilidade urbana no Estado de São Paulo e obras de saneamento básico.

O plano do governo japonês é ampliar os laços econômicos não só com o Brasil, mas como toda a América Latina. "Não só missões de empresários serão mais frequentes ao país nos próximos anos. Ministros, secretários e outros quadros do governo farão visitas mais frequentes. A América Latina tem grande parte na estratégia de crescimento do Japão, que vê na maior inserção internacional um dos seus motores. A região é a que recebe o maior número de empresas nipônicas", declarou o primeiro-ministro Shinzo Abe.

Depois de citar diversas vezes a palavra união, para descrever a diretriz que pretende adotar nas relações com os países latino-americanos, Abe disse três palavras em português - progredir, liderar e inspirar - que ele gostaria que fizessem parte desse novo esforço de aproximação.


Veículo: Valor Econômico


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