Estoques acima da média histórica no varejo e o consumo retraído têm derrubado a demanda de fim de ano na indústria. A Black Friday e o Natal, em 2018, não estão alterando significativamente a intensidade da produção.
“Fatores como demanda doméstica e o grau de desemprego, combinados com o nível de estoques em segmentos importantes acima do padrão habitual, geram um sentimento de incerteza que afeta investimentos dos empresários e o consumo da população”, avalia o gerente da pesquisa industrial mensal do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), André Macedo. Ao longo do ano, o índice apontou um comportamento de menor intensidade na indústria nacional e os dois últimos levantamentos (julho e agosto) registraram queda. “Não ocorriam dois resultados negativos em sequência desde 2015”, assinala Macedo.
O presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), José Jorge do Nascimento Junior, afirma que as encomendas do varejo não estão superiores em relação aos demais meses do ano. “Ainda estão normais. Não houve incremento na produção ou redução da ociosidade, como em outros anos.”
O dirigente conta que a projeção inicial de crescimento do setor em 2018, de 10% a 15%, foi reduzida ao longo do ano. “Reajustamos para em torno de 5% a 10%, em função das crises intensas que ocorreram, como a greve dos caminhoneiros.” Ele ainda acredita que o último trimestre pode ser mais positivo. “A Black Friday e o Natal são dois momentos importantíssimos para o setor. Ainda há esperança dessas datas suprirem a projeção inicial. Mas no momento, a perspectiva é conservadora.”
O presidente da Associação Brasileira das indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, também vê movimentação abaixo do esperado. “Não percebemos uma reação forte de fim de ano, que é uma época quente devido ao lançamento de coleções e festas.”
Ele acredita que o represamento do varejo pode estar causando alta nos estoques. “Certamente isso pode causar algum reflexo nas encomendas. A prioridade se torna esvaziar a casa.” Klein não arrisca projeções para o final do ano. “Não temos como fazer uma mensuração, pela completa instabilidade do quadro. Dificulta encontrar parâmetros de avaliação.”
O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel, classifica que o varejo não teve um bom ano. “As grandes redes se posicionaram melhor, o canal multimarcas sofreu mais. Olhando para esse horizonte de fim de ano, a demanda é mais forte nos varejistas de grande porte.”
Ele aponta que a expectativa de crescimento do setor não se concretizou. “O varejo como um todo cresceu, mas o consumidor não fez a opção pelo vestuário como em 2017.”
Foco eleitoral
Na análise do diretor do Iemi Inteligência de Mercado, Marcelo Prado, as eleições tiraram o consumo do foco da população. “Os lançamentos do setor do vestuário foram ofuscados pelas campanhas eleitorais. Há um temor com o futuro, empregos e crédito, até pela virulência dos discursos, que acaba segurando a demanda.”
Ele acredita que, encerrado o período eleitoral, há uma tendência de crescimento. “As famílias apertaram o cinto, há uma demanda reprimida. Acredito que vai haver uma boa oportunidade de compra, como o 13º salário injetando dinheiro na economia.” Prado não vê os níveis de estoque do setor de vestuário acima do normal. “O varejo já vem trabalhando com estoques comedidos, comprou e vendeu pouco.” Ele destaca que o consumo do Dia das Crianças e do Dia dos Pais foi positivo. “Ambas as datas tiveram crescimento sobre 2017. O problema é que nos demais períodos houve queda, por conta dessa insegurança do consumidor.”
Klein entende que o 13º salário trará um impacto importante. “Vão ser injetados mais de R$ 200 bilhões na economia. Boa parte será empregada para pagar dívidas, mas esperamos que um pouco seja direcionado para o consumo.”
Fonte: DCI