O corte de postos de trabalho previstos de agora até o fim do ano em Minas pode superar o total de empregos formais gerados em todo o país no ano passado e pode ser mais de sete vezes maior do que os empregos criados no estado em 2019, segundo estudo apresentado ontem pela Fundação João Pinheiro (FJP). Enquanto em 2019 foram abertos 644 mil vagas (97.720 em Minas) com carteira assinada, de agora até dezembro podem ser demitidos 745 mil trabalhadores no estado, num cenário mais pessimista para a FJP, mas que ainda pode ser ampliado com o prolongamento da crise. O mercado de trabalho, que vinha se recuperando vagarosamente desde o quarto trimestre de 2016, quando a taxa de desemprego chegou a 13,7%, está se deteriorando rapidamente e a previsão é de que postos de trabalho serão destruídos com a pandemia de COVID-19.
"De qualquer forma, nem o cenário mais otimista seria capaz de conter a forte contração que as estimativas sugerem estar por vir", diz a conclusão do estudo da FJP sobre o mercado de trabalho. No cenário otimista, serão mais 356 mil demissões, o que somadas à dispensa de 212 mil pessoas no primeiro trimestre pode resultar em 568 mil desocupados a mais no estado este ano na comparação com 2019. No cenário pessimista serão 957.056 postos de trabalho a menos neste ano. Os números significam que o mercado de trabalho em Minas pode encolher entre 5,5% e 9,34% neste ano, conforme o estudo Cenários de impactos económicos.
Caso esse cenário mais pessimista se confirme, o estado fechará o ano com cerca de 2 milhões de desocupados, com a taxa de desemprego chegando a quase 18%, contra 11,5% no primeiro trimestre deste ano. Em todo o país, a previsão é que o desemprego possa chegar a 20% no ano, contra uma taxa de 12,2% nos três primeiros meses. Com base nos dados atuais, o Brasil pode fechar o ano com mais de 20 milhões de desempregados. "A perspectiva para o mercado de trabalho é muito ruim", afirma Daniela Britto, economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), ao lembrar a possibilidade de um processo de reestruturação que resulte no desaparecimento de empresas com o agravamento da crise.
Daniela lamenta que desde janeiro o governo não divulgue os números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o que dificulta uma análise do mercado formal de trabalho. Ela observa, no entanto, que o aumento do desemprego formal pode ser observado pêlos pedidos de seguro-desemprego, que saltaram de 483.145 em fevereiro para 748.484 em abril em todo o país, um aumento de 54%. Em Minas, o número de solicitações do benefício, pago pelo governo a quem é demitido, saltou de 53.760 para 85.990, em igual período, com crescimento de 60%.
Em maio, apenas na primeira quinzena, os pedidos de seguro-desemprego chegaram a 504.313 em todo o país, sendo que 53.105 foram em Minas. De janeiro até 15 de maio, foram 2,841 milhões de pedidos. Os números indicam que a quantidade de desempregados no trimestre encerrado em abril, que será divulgada amanhã pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, terá um salto em relação aos 1,2 milhão de pessoas que ficaram sem trabalho de janeiro a março. "Há um problema para se mensurar os dados do mercado de trabalho sem o Caged, mas com a economia parada o desemprego vai chegar a 20%, muito provavelmente", diz a economista Camila Abdelmalack, da Veedha Investimentos.
Camila lembra que um dos problemas do mercado de trabalho é o impacto sobre a construção civil, que emprega mão de obra de renda mais baixa e que está parada, com mais de 80% dos lançamentos cancelados ou postergados. "O cenário para o mercado de trabalho é muito ruim porque a situação económica do Brasil é muito grave e não há espaço fiscal", afirma. Além da construção, os setores de serviços e comércio, que concentram mão de obra, foram duramente afetados pelas medidas de isolamento social.
Tanto Camila quanto Daniela Britto lembram que o quadro do trabalho no país é agravado pelo alto grau de informalidade. "Você tem o setor de serviços, que representa 71% do PIB e no qual a maioria das empresas, quase 97%, é pequena. E as micro e pequenas respondem por 40% dos empregos formais e com a outra parcela de 40% de informais formam um contingente populacional gigante com empregos vulneráveis neste momento", diz a economista da Fiemg. No país, são 37 milhões de trabalhadores informais, sendo que 2,55 milhões estão em Minas Gerais.
RETOMADA LENTA
Para as duas economistas, a retomada do mercado de trabalho será mais lenta do que a da atividade económica. "Muitos empregos perdidos na crise não serão rapidamente recuperados. Isso vai ser demorado porque haverá rees-truturação de setores e muitas empresas não vão sobreviver", afirma Daniela Britto. Ela lembra que a indústria mineira opera hoje com produção em nível de 2004. Em março, as horas trabalhadas na indústria mineira tiveram queda de 5,3%. "Passado o período de reabertura da economia, muitas empresas já estudaram como será o funcionamento nessa nova realidade e terão a expertise para saber quanto de mão de obra precisam. Vai ter um aumento da taxa de desemprego e não há sinalização de que o mercado de trabalho vá se recuperar tão cedo", avalia a economista da Veedha.
SETORES
O comércio e a construção serão os setores que mais vão fechar postos de trabalho em Minas este ano, segundo a FJP. Com uma previsão de retração entre 7% e 11,9% na sua atividade este ano com relação a 2019, o comércio varejista e atacadista (exceto veículos automotores) pode fechar de 94.538 a 160.227 vagas de emprego, sendo que o cenário mais provável hoje aponta para o corte de 126.797 postos de trabalho. Já a construção, que teve ter desempenho negativo entre 4% e 5,9% este ano deve reduzir os postos de trabalho entre 31.466 e 54.243, com o número mais provável de demissões, no cenário atual, fechando o ano em 42.446. Na indústria, o segmento mais afetado será o de confecção, arte-fatos do vestuário e acessórios, com redução entre 10.422 e 17.317 trabalhadores.
Fonte: Estado de Minas