Concentração na indústria de café ficará ainda maior

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A indústria de café no Brasil nunca esteve tão concentrada. As dez maiores empresas do segmento, que eram responsáveis por 43,1% do mercado em 2003, já dominam abastecem 75% do consumo doméstico. E a expectativa é que os elevados preços da matéria-prima acelerem esse processo de concentração, que acontecerá tanto pelo crescimento orgânico das líderes quanto por novas aquisições de companhias menores.

 

Em um corte um pouco mais restrito, as quatro líderes no país - Sara Lee, 3Corações, Melitta e Maratá - já representam 60%. Estimativas das próprias companhias indicam que o processo avançará até que as quatro maiores respondam por 75% de tudo o que se consome no mercado doméstico, ficando os 25% restantes divididos entre companhias que possuem atuação regional.

 

"A concentração da indústria já vinha acontecendo, mas a recente valorização dos preços do café verde acelerou esse processo. A margem da indústria no varejo ficou apertada e muitas empresas se viram obrigadas a deixar o negócio", afirma o consultor Carlos Brando, diretor da P&A Marketing.

 

A última grande aquisição da indústria foi feita pela 3Corações, que assumiu as operações do grupo mineiro Fino Grão por R$ 50 milhões. A principal responsável pela concentração da indústria, no entanto, foi a americana Sara Lee, que assumiu na década passada o controle de Café do Ponto, Seleto, Caboclo e Pilão. Em 2008, o grupo americano comprou o paulista Moka, então 9º no ranking, e no ano passado adquiriu, por R$ 100 milhões, a paranaense Damasco, até então a quarta maior indústria do país. Na lista de negócios fechados pelas líderes, entra, ainda, a compra do Café Bom Jesus pela Melitta, em janeiro de 2006.

 

Na avaliação de Brando, o principal motivo que estimulará a continuidade da concentração da indústria no Brasil nos próximos anos é o fato de que a perspectiva para os preços da matéria-prima ainda é de alta. "Cerca de 60% da produção de café arábica está concentrada em países que tiveram suas moedas valorizadas. Para manter o interesse dos cafeicultores em continuar produzindo, os compradores terão que pagar mais dólares", diz.

 

Além de adquirir as empresas menores e com dificuldades em sobreviver dentro das novas regras de mercado, as líderes da indústria de café decidiram, nos últimos tempos, adotar uma estratégia paralela. Apesar de o varejo ainda ser o principal canal com o consumidor, as grandes companhias estão buscando novas alternativas para agregar valor aos seus produtos, como já informou recentemente o Valor.

 

Segunda no ranking nacional com uma fatia de 20%, a 3Corações tem o plano de elevar o investimento no marketing e comunicação de suas marcas em 20% neste ano. Os quase R$ 50 milhões aplicados no ano passado devem chegar a R$ 60 milhões em 2011 e representar 3% do faturamento do grupo. A expectativa é que as vendas as empresa neste ano atinjam a marca dos R$ 2 bilhões ante os R$ 1,66 bilhão obtidos no ano passado. "Precisamos criar fidelidade com o consumidor. O que temos feito nesse sentido é investir em nossas marcas, qualidade e em comunicação direta", afirma Pedro Lima, presidente da 3Corações.

 


Com uma participação de aproximadamente 23% após a compra da Café Damasco, a líder Sara Lee tem no varejo seu maior canal de vendas, com mais de 90% da receita. A empresa não revela quanto investe e nem qual é sua estimativa de faturamento, mas lembra que já começaram a aparecer oportunidades em outros canais de vendas. "O varejo é se sempre será nosso principal foco, mas estão surgindo outras oportunidades que complementam nosso negócio", afirma Ricardo Souza, diretor de marketing da Sara Lee.

 

Para o executivo, o canal de food service é um dos que mais cresce, mas as vendas de monodoses tendem a fazer parte da rotina das pessoas ao longo da próxima década. "Aquisição é uma coisa de momento e oportunidade. Nosso portfólio de produtos é bastante completo e estamos com bastante projetos em casa", afirma Souza.

 

Dentro do movimento de consolidação da indústria do café no Brasil, a busca por novos canais de venda como o food service, monodoses e investimentos em alta qualidade era uma estratégia que vinha sendo adotada pelas médias empresas do setor. A ideia era fugir do varejo onde a concorrência de preços é maior para buscar alternativas para produtos com maior valor agregado.

 

"A escala das líderes é muito grande e dificultam a concorrência das empresas menores. Além disso, grandes grupos passaram a ter uma atuação mais forte no segmento gourmet e com grandes inovações. Com isso, grupos menores que tentavam se posicionar nesse segmento encontram pela frente uma concorrência que não existia há cinco anos", afirma Nathan Herszkowicz diretor-executivo da Associação das Indústrias de Café (Abic).

 

Lavazza aposta no consumo nos lares

 

Uma das mais tradicionais indústrias de café do mundo vai colocar na rua um plano para levar sua marca até as residências de seus consumidores. A partir do segundo semestre deste ano, a italiana Lavazza passará a comercializar café torrado e moído com a sua marca para o consumidor final. A estratégia do grupo é elevar de forma expressiva as vendas da empresa no Brasil, que no ano passado somaram R$ 27 milhões.

 

Não será, no entanto, na gôndola dos supermercados que o produto será posicionado. A empresa pretende fugir da selvagem concorrência do varejo e disponibilizar seu café moído nas cafeterias que já comercializam a bebida nas xícaras de expresso.

 

Até agora, a empresa vendia o café com a marca Lavazza apenas em grão nos canais de consumo "fora do lar". A ideia agora é ofertar o produto de uma forma que o consumidor possa levar o café para casa, mas apenas nos pontos de venda onde se comercializa o expresso. "Nosso papel é oferecer um café diferenciado e não disputar espaço no varejo. Não queremos ser mais uma marca na prateleira", afirma Mássimo Locatelli, diretor geral da Lavazza no Brasil.

 

A presença da Lavazza no segmento de café torrado e moído ao consumidor não é bem um estreia. Em 2008, o grupo italiano adquiriu o carioca Café Grão Nobre e o paulista Terra Brasil, que criaram a base para a empresa a passar a atuar a partir de agora com sua própria marca.

 

Segundo Locatelli, a empresa tem estudado o mercado brasileiro de café e identificado uma dinâmica bastante diferente da existente na Europa. "A demanda por produtos diferenciados está nascendo no Brasil apenas agora e nesse segmento temos algo a oferecer", afirma o executivo.

 

A estratégia acompanha o plano da empresa de construir uma fábrica no Brasil, na cidade carioca de Três Rios. A expectativa é que a unidade brasileira esteja produzindo café com a marca entre o fim de 2012 e o início de 2013. "O Brasil é muito grande e tem diferentes tipos de café, o que nos permite fazer diferentes blends e bem aceitos na Europa", afirma Locatelli. (AI)

 

Nova estratégia no Cerrado mineiro

 

Criada em 1992, a marca Café do Cerrado entra em uma nova fase, que passa a valorizar acima de tudo a identificação de origem de sua produção. A primeira mudança é que o antigo Conselho de Associações de Cafeicultores & Cooperativas do Cerrado (Caccer) deixou de existir e deu lugar à Federação dos Cafeicultores do Cerrado (FCC). A entidade já reúne sob um único guarda-chuva sete associações e oito cooperativas de cafeicultores do Cerrado mineiro.

 


A estratégia da federação é reforçar junto às indústrias torrefadoras e redes de cafeterias a ideia da identificação de origem da produção do Cerrado e tentar apagar a imagem de que o café do Cerrado é uma marca concorrente. "O que queremos agora é buscar junto aos consumidores o reconhecimento da região do Cerrado mineiro como origem produtora de cafés éticos, produzidos em terroir singular e garantidos pela indicação geográfica", afirma Francisco Sérgio de Assis, presidente da FCC.

 

O primeiro passo foi a contratação da Be Consulting para assessorar a entidade nos planos de atuação. Já dentro do novo conceito a federação terá um departamento de estratégia de mercado, que mapeará as demandas das indústrias com objetivo de atender o mercado consumidor e desenvolverá projetos de parceria com a iniciativa privada.

 

Na prática, a federação pretende trabalhar em conjunto com as indústrias para que, junto às marcas das empresas, seja estampado nas embalagens o selo "Região do Cerrado Mineiro", como a nova denominação de origem do produto. "Queremos entender a forma de pensar das torrefações e ajudar a levar os melhores produtos aos clientes finais", diz José Augusto Rizental, superintendente da FCC.

 

Os cafeicultores do Cerrado mineiro foram os primeiros a conseguir a identificação geográfico do produto, em 2005. A expectativa da FCC é que ocorra uma revisão de alguns processos de produção excluindo alguns pontos e incluindo outros, como forma de adequar o sistema às novas demandas do mercado e atrair mais produtores.

 

Hoje, a região do Cerrado mineiro produz aproximadamente 5 milhões de sacas, das quais apenas 2,5 milhões passam pela federação. A ideia é trazer para entidade toda a oferta da região, que engloba 55 municípios e abriga 4,5 mil produtores, sendo que 3,5 mil já fazem parte da entidade. "Nossa expectativa é que o projeto como um todo esteja completamente estruturado nos próximos três anos, para atingir um grau de maturidade nos próximos dez anos", afirma Rizental.

 

Entre os planos do projeto que começa a ser colocado em prática está a proposta de incentivo a outras regiões a buscarem a identificação geográfica. Além disso, do ponto de vista mercadológico, o plano é marcar presença tanto no mercado interno - por meio da parceria com as indústrias - quanto no externo, para onde já vai 70% de todo o café produzido no cerrado mineiro. "A marca própria está nos planos, mas isso é algo para o futuro", afirma Assis. (AI)

 

Veículo: Valor Econômico


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