Por que a maior fabricante nacional de eletroeletrônico perde executivos, atrasa o lançamento de produtos e assiste aos rivais se aproximarem rapidamente
Afonso Antônio Hennel, o homem que comanda a maior indústria de eletroeletrônicos do País, reuniu nomes importantes do mercado para mostrar os últimos lançamentos da empresa. Num evidente bom humor, ele cumprimentou amigos, foi abraçado por executivos de várias redes varejistas e chegou a falar no microfone sobre a Semp Toshiba do futuro. Num anúncio surpreendente, o filho do fundador Affonso Brandão Hennel disse que o comando da empresa passaria a ser dividido entre três vice-presidentes recém-nomeados. Afonso Hennel, 57 anos, viu a Semp Toshiba crescer. Com fama de centralizador e hábil negociador, vira e mexe, ele compra umas batalhas e diz o que pensa. Pois o dono de 60% do capital da empresa de R$ 2,2 bilhões de faturamento achou que era hora de delegar mais. “Fale com eles, se quer saber da empresa. Eu não sei de nada”, dizia à DINHEIRO, em meio a risos, ao apontar para os novos executivos do grupo. A mudança foi o primeiro sinal mais claro de que estava sendo construída uma Nova Semp Toshiba, como a chamam internamente. Seria uma empresa mais ágil e com foco no setor de informática. Mas a construção dessa companhia tem custado caro. O problema é que a nova e a velha Semp se cruzam o tempo todo e, quase sempre, não se entendem. Nessa crise de identidade, executivos saíram da companhia, lançamentos são adiados e os concorrentes ganham espaço rapidamente.
Relatório da Suframa, obtido pela DINHEIRO, revela que, em 2006, a LG, por exemplo, ocupava a sexta colocação no ranking geral por faturamento. Em 2007, ela saltou duas posições e desbancou até a Philips. A Semp Toshiba, por sua vez, repetiu em 2007 a mesma receita de 2006, cerca de R$ 2,2 bilhões e manteve-se no sétimo lugar, mais distante da coreana. Segundo relatório inédito do Ipea, a Semp tinha 10% das vendas totais de eletrônicos em 1993. Quase 15 anos depois, essa parcela está um pouco acima de 11%. A Philips pulou de 17% para mais de 30%.
A estagnação sugerida pelos números e as mudanças conduzidas por Hennel provocaram reações. A DINHEIRO apurou que 16 pessoas pediram demissão desde abril. Grande parte são diretores de áreas como áudio e vídeo, informática e marketing – alguns trabalhavam há mais de 12 anos na empresa. A DINHEIRO conversou com quatro desses ex-funcionários na semana passada. Uma das principais insatisfações é com o estilo de trabalho do recém-empossado vice-presidente de marketing e vendas, Caio Ortiz, publicitário e ex-sócio de Roberto Justus e Eduardo Fischer. Ortiz, segundo fontes ouvidas pela DINHEIRO, é um homem sem muitos rodeios e de trato difícil. “Ele disse a um diretor que o que ele fazia qualquer estagiário faria melhor por R$ 1.000. O executivo pediu demissão no mesmo dia”, disse um interlocutor que assistiu à cena. A outro empregado, teria pedido que ele calasse a boca durante a apresentação de um projeto. A empresa diz que o que existe é um turn over natural nos cargos. Desentendimentos nos corredores do escritório da avenida João Dias, na zona sul de São Paulo, seriam reflexo, em parte, do excesso de pressão por resultados. Os três novos vice-presidentes (Sergio Barcellos, Ricardo Freitas e Caio Ortiz) chegaram com essa missão. Hennel cuidaria mais da estratégia. Na prática, porém, Hennel ainda interfere no dia-a-dia e a cobrança só cresceu.
Tudo isso acontece num momento em que os concorrentes, com muito dinheiro e imagem atrelada à idéia de inovação tecnológica, voam muito mais rápido. Até hoje, a Semp ainda patina para entrar no mundo da telefonia celular – que seria a coqueluche da Nova Semp. O anunciado CTV41, o primeiro celular da marca sensível ao toque, foi apresentado à imprensa pela primeira vez em dezembro. Em fevereiro, voltou à mídia, com a promessa de chegar ao mercado até maio. Logo, a data mudou para agosto, mês que a Vivo espera receber o aparelho de R$ 1.099 (pré-pago). A Semp Toshiba alegava atrasos na homologação da Anatel, a agência do setor. O certificado saiu no dia 27 de maio. A Vivo, operadora que venderá o produto com exclusividade, diz que espera recebê-lo neste mês. Nos bastidores, fala-se em problemas com o desenvolvimento de um software para o aparelho. A empresa nega. Enquanto isso, em abril, na data prevista, a Samsung lançou o badalado V820L, que, assim como o da Semp, era um dos poucos à venda com sinal de tevê digital. Sem rival nas prateleiras, o V820L tornou-se uma boa opção para o cliente, e a Samsung já prepara o lançamento de um modelo mais avançado.
Apesar das tensões, há um plano para fazer a Nova Semp sair da gaveta. A empresa quer tornar a área de informática a principal fonte de receita do grupo. É isso que Hennel tem repetido. Em 2007, a venda de notebooks da marca cresceu 300%. A receita subiu 63,5% A redução de R$ 3 mil para R$ 2 mil no preço de seu laptop mais barato deu fôlego ao negócio no ano passado. Mas a marca tenta ganhar a gôndola enfrentando não só os coreanos (dos celulares), mas os americanos e até os brasileiros. Neste ano, uma consultoria foi contratada para indicar como conquistar competitividade. “Uma das conclusões é de que a Semp precisa ganhar escala urgentemente se pretende brigar com Positivo e outras marcas nacionais”, diz um analista que esteve no grupo. Mesmo no mercado de tevês, a empresa se esforça para não se distanciar demais dos rivais. A venda de aparelhos de tela fina cresce mais na LG e Samsung. Quanto ao segmento de linha branca (refrigeradores, lavadoras), o plano não avançou. Em fevereiro, Hennel garantiu que detalharia os planos em julho. Nada aconteceu. Cautelosa, a Semp não dá passos maiores que a perna. É o jeito de Hennel fazer negócio. Mas talvez o ritmo da caminhada seja tímido demais.
Veículo: Revista Isto É Dinheiro