BTG quer negociar sozinho com Casino

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Banco assume linha de frente para tentar salvar operação que cria megavarejista e diz que, se conseguir acordo, BNDES pode voltar a financiar a associação do Pão de Açúcar com o Carrefour.

 

O BTG Pactual ainda não jogou a toalha da proposta de combinação do Pão de Açúcar com o Carrefour. O anúncio feito ontem de que iria desistir da oferta para a união das empresas teria sido mais um "recuo tático", após a decisão do BNDES de retirar o apoio financeiro à transação.

 

O banco de André Esteves vai tentar, nas próximas semanas, uma negociação direta com o Casino, sócio de Abilio Diniz no controle do Pão de Açúcar. O grupo francês rejeitou a proposta.

 

Entretanto, há ceticismo quanto a viabilidade dessa iniciativa entre os assessores de Diniz. A dificuldade estaria em convencer Jean-Charles Naouri, controlador e presidente do Casino, de que essa nova proposta pode ser mais interessante para a rede francesa.

 

A negociação com o sócio francês do Pão de Açúcar teria sido mal conduzida, na opinião de uma fonte próxima ao negócio. Além de ter subestimado a reação da opinião pública por conta do uso de dinheiro do BNDES, o projeto não incluiu uma aproximação inicial entre Casino e Diniz, o que poderia ter evitado a caracterização a oferta como "hostil".

 

É a tarefa de trazer o Casino para a mesa de negociação que o BTG Pactual vai tomar para si, convencido de que a operação tem tantos ganhos que permite uma acomodação de interesses de todos os envolvidos.

 

Caso o BTG chegue a um acordo com o Casino, o BNDES voltaria para a operação, prevê a fonte. Assim, haveria apoio do governo brasileiro, uma vez descartado o caráter hostil da transação.

 

O BTG vai insistir na tese de criação de uma superempresa de varejo com capital pulverizado em bolsa e restrições que impediriam os grandes acionistas de tomar o controle da companhia.

 

As ações de Abilio Diniz, Casino e Carrefour que superassem o limite de 15% do capital não teriam direito de voto. Assim, estaria assegurada uma gestão profissional, que começaria sob a batuta de Claudio Galeazzi, encarregado de fundir as operações de Pão de Açúcar e Carrefour no Brasil.

 

"Todo mundo ganharia", diz a fonte, a começar pelo Casino, principal acionista, com o argumento de que, após a divulgação do negócio, as ações do Pão de Açúcar chegaram à máxima histórica.

 

A avaliação da fonte é que a rejeição da fusão vai ter reflexos sobre as cotações, o que pode ajudar na reavaliação do negócio pelo Casino. Ontem, as ações do Carrefour e do Pão de Açúcar fecharam em queda. As do Casino tiveram ligeira alta.

 

Nos últimos dias, o BTG tem mantido conversas frequentes com os minoritários que apoiam a operação. Eles já teriam se mostrado dispostos a se desfazer de suas posições, se não houver acordo. Também poderiam se articular para apresentar uma queixa à Comissão de Valores Mobiliários porque o Casino estaria mantendo uma posição que, na visão deles, seria contrária aos interesses do Pão de Açúcar.

 

Por outro lado, se vingarem as tentativas de diálogo do BTG, novos investidores, incluindo fundos soberanos, poderiam entrar na operação com o BNDESPar.

 

A manutenção do BNDES no negócio, mais do que pelos recursos, se justificaria pelo incentivo que daria ao mercado de capitais, ao fortalecer na bolsa brasileira uma grande companhia de varejo.

 

O BTG já vinha sendo sondado por fundos de investimentos soberanos interessados em entrar na operação com a BNDESPar. Portanto, com os fundos, a quantidade de recursos do BNDES no negócio seria reduzida. A permanência do banco funcionaria como aval de que a operação não seria hostil, e portanto não resultaria em guerra judicial.

 

A avaliação agora, passadas duas semanas do anúncio da proposta de fusão, o BTG não contava com a reação tão negativa da opinião pública à participação do BNDES. E muito menos com a falta de jogo de cintura de Diniz. Também não contavam com a sucessão de argumentos desastrados para justificar a participação do BNDES.

 

O lado positivo da operação teria se perdido numa série de declarações infelizes, como a alegação de um ministro de Estado de que a fusão beneficiaria a indústria nacional porque permitira a exportação de produtos brasileiros para a França.

 

Grupo francês deve resistir a novas propostas

 

Não restam dúvidas agora. O Casino quis mostrar não só que rejeita a proposta de combinação do Pão de Açúcar com o Carrefour como também que não há espaço para negociação. Os argumentos do grupo francês sócio de Abilio Diniz no comando da rede varejista brasileira, organizados em cinco tópicos, são contrários à fusão com o Carrefour. Qualquer revisão dessa posição no futuro seria, portanto, ir contra suas próprias avaliações.

 

Diniz, que começou essa operação em 27 de junho numa posição de colocar o sócio contra a parede, ao apresentar um negócio aparentemente atraente, de levar o Pão de Açúcar de um faturamento de R$ 36 bilhões para R$ 65 bilhões, termina esse primeiro round em desvantagem - e com a imagem publicamente desgastada.

 

O empresário foi abandonado pelo BNDES, que retirou o apoio de R$ 3,9 bilhões à operação. Após ser pressionado pelo Casino, o banco se comprometeu a só entrar no negócio se os sócios estivessem de acordo. Como o grupo francês não concordou com a transação, o BNDES se retirou.

 

A reversão dessa imagem dependerá agora do sucesso da tentativa do BTG Pactual, oficial formulador da proposta de combinação, de convencer o Casino a sentar na mesa para negociar um novo modelo de operação.

 

Segundo pessoas envolvidas na operação, o próprio Diniz, após a reunião do conselho do Casino ontem, onde a proposta foi unanimemente rejeitada, decidiu não levar o negócio adiante nas atuais circunstâncias. Ele teria ligado já de Paris para comunicar a decisão aos assessores financeiros.

 

Apesar de o Casino ter aparentemente vencido a batalha, o grupo ao lado de Diniz deixou a porta aberta para que se busque uma saída para tentar novamente a operação, em moldes diferentes. O comunicado do BTG assume que a associação com o Carrefour seria "excepcional para todos os públicos envolvidos" e que poderá ser "reavaliada no futuro".

 

Ninguém acredita que Diniz irá simplesmente desistir do projeto, que foi costurado durante cerca de dois anos. Entretanto, por hora, não são esperadas medidas hostis, como uma tentativa de levar a operação adiante - especialmente por conta da exposição gerada pelo afastamento do BNDES.

 

Diniz tem até julho de 2012 para tentar um novo negócio. Caso contrário, o Casino formalmente assume o controle do Pão de Açúcar, embora o empresário continue à frente da gestão.

 

Fontes ligadas ao Casino afirmam que o grupo vai honrar o acordo e que Diniz continuará com a presidência tanto do conselho de administração de Wilkes como do Pão de Açúcar. "Diniz não será publicamente humilhado", afirma uma fonte.

 

Contudo, ambos os lados admitem que a convivência não será amigável. "No mundo dos negócios ninguém rasga dinheiro e a hipocrisia impera." Portanto, se Casino e Diniz tiverem de conviver por um longo tempo por falta de opções, assim será. Mas não será um clima amistoso. Nenhum dos dois afirma ter interesse de vender sua participação no negócio.

 

O modo como esse primeiro capítulo terminou deve gerar expectativas no mercado, tanto de movimentos futuros dos sócios controladores do Pão de Açúcar como no setor. Agora, o caminho está livre para o Walmart partir para cima do Carrefour no Brasil.

 

Casino apresenta seis estudos contra fusão

 

A tentativa de aproximação não deu certo. O empresário Abilio Diniz, do grupo Pão de Açúcar, participou ontem, em Paris, da reunião do conselho de administração do sócio francês Casino, para "explicar os méritos" da proposta de fusão da varejista brasileira com o Carrefour, fortemente contestada pelo Casino. Mas no encontro para avaliar o projeto, que durou pouco mais de duas horas, se deparou com um arsenal de diferentes estudos realizados por inúmeros bancos que apontam diversas falhas na viabilidade econômica da operação.

 

Durante a reunião, o conselho de administração do Casino votou por unanimidade (menos um voto, o de Diniz, que se absteve) contra o projeto de fusão com o Carrefour. "O projeto é contrário aos interesses do grupo Pão de Açúcar, da totalidade de seus acionistas e do Casino", afirma um comunicado do grupo francês divulgado ontem.

 

Apesar desse "não" categórico, Diniz disse em Paris esperar que existam brechas para a realização de um acordo, embora não saiba se o Casino irá flexibilizar sua posição contrária à fusão. "Há 11 anos trabalho com o Casino e espero realmente uma negociação amigável e que se chegue a um bom acordo para todos", afirmou o empresário após a reunião na sede do Casino, na rue de l'Université, no elegante bairro de Invalides.

 

"Amigável contém a palavra amigo. Para isso, é preciso ter um amigo, alguém com quem exista uma relação de confiança", espeta uma fonte ligada às discussões e que prefere, no entanto, não se pronunciar sobre uma eventual amizade interrompida entre os dois sócios.

 

Com ar calmo após a reunião, Diniz chegou até a brincar com os jornalistas sobre a oportunidade de se morar em Paris. Seus comentários foram breves e ele adotou um tom moderado. Diniz afirmou que foi "muito bem recebido" pelo presidente do Casino, Jean-Charles Naouri, "como sempre", e preferiu não comentar a saída do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do projeto de fusão.

 

Ele também não quis criticar abertamente as análises de cinco bancos (Santander, Goldman Sachs, Messier-Maris e Associados, Rothschild e Merrill Lynch), além do estudo da consultoria Roland Berger, apresentadas na reunião do conselho de administração do Casino, que apontam inúmeros problemas em relação ao projeto de fusão da varejista brasileira com o Carrefour no Brasil.

 

"Não estou de acordo com os estudos. Acho que eles não representam a verdade, mas não quero fazer críticas", disse Diniz.

 

O grupo francês queria fundamentar em detalhes sua recusa ao projeto de fusão durante a reunião do conselho de administração e, por isso, solicitou "um amplo leque" de análises de diferentes instituições, disse uma fonte ao Valor.

 

E as conclusões não são nada animadoras para Diniz. No comunicado, o Casino afirma que o projeto "repousa sobre uma visão estratégica errada", por aumentar a participação dos hipermercados nas vendas totais, um modelo de varejo em declínio atualmente nos países avançados. No caso do Brasil, a entrada do Carrefour no negócio mais do que dobraria a participação dos hipermercados no faturamento, que passaria dos atuais R$ 11 bilhões para R$ 26 bilhões.

 

Além disso, diz o comunicado, a participação minoritária no Carrefour não corresponde a uma internacionalização adequada para o grupo Pão de Açúcar, "que deve ter o controle de tal desenvolvimento". Outro fator problemático apontado pelo Casino, com base nos estudos dos bancos, é que os mercados maduros (onde as vendas estão praticamente estagnadas) representam dois terços do faturamento do Carrefour, e que a expansão internacional do Pão de Açúcar deve ser voltada para países emergentes com fortes taxas de crescimento, estratégia amplamente adotada pelo Casino nos últimos anos.

 

O texto aponta ainda que as potenciais economias de custos são superestimadas pelo Pão de Açúcar e que haveria problemas de concentração excessiva nos mercados de São Paulo e do Rio de Janeiro, ressaltando que as duas redes (Pão de Açúcar e Carrefour) estão em concorrência frontal e seriam pouco complementares. O Casino ressalta ainda os riscos empresariais do projeto e afirma que ele irá diluir as participações dos acionistas da varejista brasileira.

 

Nas quatro páginas do documento, o Casino, sempre com base nos estudos, bombardeia todas as alegações feitas por Abilio Diniz em relação aos benefícios do projeto de fusão com o Carrefour.

 

O Casino também reitera "seu engajamento estratégico no Brasil, que constitui um eixo de desenvolvimento principal do grupo". Na prática, isso significa que o grupo francês não tem interesse de abrir mão do mercado brasileiro e da possibilidade de exercer o controle do Pão de Açúcar a partir de 2012, segundo o acordo firmado em 2006 com Abilio Diniz.

 

"Vamos conseguir continuar a aventura no Brasil e a desenvolver nossas atividades no país", diz uma fonte do grupo francês. Abilio Diniz, por sua vez, afirmou que embarcaria ontem mesmo de volta ao Brasil. "Às vezes não vemos brechas, mas continuamos tentando", afirmou.

 

Em um comunicado após a reunião em Paris, Diniz afirma que se absteve na votação do conselho do Casino e insistiu no fato de que a proposta de fusão "deverá, antes de tudo, ser submetida ao conselho de administração da Wilkes, a holding de controle do Pão de Açúcar".

 

Diniz afirmou ainda que os estudos realizados por bancos, a pedido do Casino, que foram apresentados na reunião do conselho do grupo francês ontem "não têm fundamento e não refletem a realidade do setor do varejo no Brasil e no mundo".

 

Veículo: Valor Econômico


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