Maiores exportadores de açaí para os Estados Unidos querem investir no mercado brasileiro

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Comido junto com as refeições no Pará, a fruta tornou-se popular em outros estados do Brasil a partir dos anos 1980


Foi na última semana de 1999 que o americano Ryan Black desembarcou no Brasil. Apaixonado por surfe, escolhera o balneário de Porto de Galinhas para passar o réveillon. Tinha 25 anos e estava acompanhado do amigo Edmund Nichols, também americano, também surfista, também novato nos trópicos. Após alguns dias no litoral pernambucano, Ryan e Edmund foram apresentados ao açaí - fruta amazônica que até então desconheciam. Ficaram fascinados por aquela maçaroca roxa, gelada, servida em tigela, e muito benquista pelos esportistas. Então um jogador profissional de futebol americano - mas formado em Administração -, Ryan voltou aos Estados Unidos decidido a fazer da fruta o seu novo ganha-pão.

Em abril de 2001, após algumas visitas ao Pará - principal produtor de açaí no Brasil -, Ryan levou um contêiner com 20 toneladas de polpa congelada ao seu país de origem. Seria o primeiro de vários. Hoje ele é o maior importador de açaí dos Estados Unidos - e principal responsável pela ramificação comercial da fruta em outros países como Coreia, Japão e Austrália. De acordo com uma reportagem publicada pela revista americana "The New Yorker", sua empresa, a Sambazon (acrônimo de "samba" com "amazon") registra US$ 50 milhões anuais em venda. O grupo, encabeçado também por seu irmão, Jeremy, tem 200 funcionários, espalhados por Califórnia, Rio de Janeiro e Pará.

- Ainda contamos com dez mil famílias ribeirinhas que nos fornecem o açaí - lembra Ryan, de 38 anos, presidente da empresa. - Estão todos certificados, para sabermos exatamente de que fazenda vem a fruta.

Comido junto com as refeições no Pará, o açaí tornou-se popular em outros estados do Brasil a partir dos anos 1980. A "carreira nacional" deveu-se, em grande parte, aos preceitos alimentares instituídos por Carlos Gracie. Patriarca do mais importante clã do jiu-jítsu - e nascido em Belém do Pará -, Carlos usava o açaí como parte fundamental da dieta familiar. A fruta logo conquistou lutadores, surfistas e outros praticantes de esportes.

Nos Estados Unidos, no entanto, o açaí teve um começo penoso. Pelo aspecto exótico, a cor escura e o sabor que remete a terra, poucas distribuidoras se interessaram em comprar a fruta trazida do Brasil pelos irmãos Black. Apesar do esforço propagandístico de Ryan (que convenceu alguns chefs badalados de Los Angeles a fazerem receitas com seu produto), o açaí ficou relegado, por um tempo, à marginalidade nas casas de suco americanas.

Até que, em 2002, Jeremy Black recebeu uma ligação do dermatologista Nicholas Perricone, autor de dois best-sellers sobre tratamentos contra envelhecimento. Espécie de Augusto Cury do tratamento estético, Perricone buscava informações sobre o açaí para incluir em seu livro seguinte. No começo de 2003, "A promessa Perricone: três passos para você ficar mais jovem e viver melhor" foi lançado, contendo uma lista de comidas ricas em antioxidantes, fibras e vitaminas. No topo dos ingredientes citados por ele - alho, cebola e nozes incluídos - figurava a "zebra" brasileira.

O livro atingiu o primeiro lugar entre os mais vendidos nos Estados Unidos. O açaí alçou o estrelato - e não apenas entre jovens esportistas.

- É irônico que no Brasil o açaí seja visto apenas como um energético que engorda - alfineta Ryan, por telefone. - A fruta tem proteína, fibra, 30 vezes mais antioxidante que o vinho, por exemplo. É boa para a pele, para o cabelo. Quando as mulheres daí descobrirem o poder dela, vai ser uma febre.

Morador de San Clemente, na Califórnia, onde fica a sede da Sambazon, Ryan costuma vir ao Brasil quatro ou cinco vezes ao ano. Esteve no Rio no começo do mês, para tocar seus planos de investir no mercado brasileiro. Por ora, ele vende seu produto em algumas lojas da rede de supermercados Pão de Açúcar, sob a grife Tribal. No próximo ano, deve desembarcar por aqui com a marca Sambazon. Acha que o açaí vendido em casas de suco do Rio padece de exageros:

- Colocam muito guaraná e conservantes. E a polpa é sempre a mesma, porque é comprada dos mesmos produtores. Às vezes tomo açaí do Bibi Sucos e do Polis, mas, ainda assim, acho doce demais para o meu gosto.

O Ministério da Agricultura desconhece quantas toneladas de açaí são exportadas do Brasil por ano. Ryan tampouco revela números exatos, embora, de forma talvez exagerada, afirme que suas vendas se aproximam do centésimo milhar de dólar. A Sambazon tem dez produtos no mercado americano, dentre sucos, energéticos e suplementos. Há misturas de açaí com mate, chocolate e, claro, guaraná. Ryan também revende a fruta, sempre congelada, em formato de polpa, para multinacionais como a Anheuser-Busch e a PepsiCo, que desenvolveram refrigerantes a partir do açaí.

Desde 2005, Ryan e seus sócios (que, além de Jeremy, incluem o amigo Edmund, com uma participação minoritária) têm uma fábrica no Pará. É lá que toda fruta é transformada em polpa, até 36 horas após a colheita (período máximo que o açaí aguenta antes de apodrecer). De cada fruto recolhido, 95% são descartados, em função do tamanho do caroço. O que sobra é moído, congelado e enviado para os Estados Unidos.

Defensor ferrenho de sua fruta, Ryan afirma que, à diferença de outros produtos da agricultura, como a soja, o açaí não prescinde da degradação da mata virgem para ser plantado.

- A árvore do açaí é positiva para a floresta. Se nós conseguirmos fazer a árvore muito cara para ser cortada, nós poderemos salvá-la.


Veículo: Diário de Pernambuco


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