Ambev terá apenas ações ordinárias

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Mais de uma década desde a criação do Novo Mercado e da reforma da Lei das Sociedades por Ações e o mercado de capitais brasileiro vive um marco: a maior companhia listada na BM&FBovespa, a Ambev, decidiu reformar seu capital e permitir que toda sua base acionária tenha direito a voto.

Avaliada em pouco menos de R$ 260 bilhões, a empresa de consumo vem disputando com a Petrobras o posto de líder da bolsa brasileira. Está também entre as cinco maiores companhias de bebidas do mundo, ranking que inclui, além da controladora AB InBev, as gigantes Coca-Cola e PepsiCo e ainda a Diageo.

Em 2012, a Ambev registrou receita líquida de R$ 32,3 bilhões e lucro líquido de R$ 10,5 bilhões.

A companhia de bebidas deu, na sexta-feira, o passo que faltava para a reorganização anunciada em dezembro. Convocou para 30 de julho a assembleia que tratará da aprovação da conversão de suas ações preferenciais em ordinárias.

Com isso, quer se igualar às cinco maiores fabricantes de bebidas do mundo e ter apenas uma classe de ação. A empresa não vai aderir ao Novo Mercado, mas adotará o conceito principal por trás do seguimento de governança da bolsa - uma ação, um voto.

A operação completa inclui uma reestruturação societária para eliminar uma holding intermediária entre a brasileira e sua controladora belga Interbrew. Como resultado, seu capital social será ampliado de R$ 30 bilhões para R$ 97 bilhões. A transação foi coordenada pelo banco Rothschild.

Ao final do processo, cada preferencial será convertida em uma ordinária, de forma que todos os acionistas - controladores e minoritários - mantenham sua participação no negócio inalterada. A Interbrew continuará com 61,9% da empresa, a Fundação Zerrenner, com 9,6%, e os investidores de mercado, com 28,5%.

A decisão final está nas mãos dos minoritários preferencialistas, detentores de 54,67% dessa espécie de ações da companhia - cerca de 24% do capital total. Eles terão uma votação separada. Os controladores não votarão com suas preferenciais - detêm 46,3% delas. Assim, se os investidores de mercado não aceitarem, não há negócio.

A despeito de o movimento ir na direção dos preceitos da boa governança, nem todos os investidores ficaram satisfeitos.

Entre os preferencialistas, há queixas. A reclamação é a perda do dividendo diferenciado a que têm direito - justamente quando a companhia poderá pagar ainda mais proventos por conta da ampliação de seu capital social.

A Lei das S/A prevê, desde 2001, mecanismos que tentam compensar o fato de as preferenciais não terem direito a voto e não terem acesso ao prêmio de controle em caso de venda - o chamado "tag along", de 80% do valor recebido pelo controlador. A Ambev escolheu compensar os preferencialistas com um dividendo 10% maior que dos ordinaristas.

Na visão de parte dos acionistas, essa vantagem será perdida em troca de benefícios teóricos. Isso porque não vislumbram nem a possibilidade de influenciar as votações da empresa, que tem controlador definido, nem a venda pela AB InBev - cujos maiores acionistas são justamente os criadores da Ambev, Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira.

Na visão desses investidores, seria necessário um prêmio para as preferenciais na conversão - que deveriam valer mais do que uma ação ordinária.

Nelson Jamel, diretor financeiro da Ambev, disse ao Valor estar confiante na aprovação da proposta. Segundo ele, entre o anúncio da aprovação e a convocação da assembleia, a companhia teve diversas interações com sua base acionária. Jamel afirma que apenas uma pequena parcela apresentou queixas ou questionamentos.

A convicção da Ambev no sucesso da reorganização e na conversão das ações vem - também - do desafio que representaria aos minoritários buscar uma mobilização para rejeitar a proposta.

Seria preciso que metade, mais uma ação, do capital preferencialista em circulação - e presente na assembleia - rejeitasse o negócio.

O valor do capital preferencialista na bolsa é de R$ 62 bilhões. Portanto, seria necessário que minoritários detentores de até R$ 31 bilhões aplicados em Ambev se mobilizassem para garantir o bloqueio da operação. Tudo isso no prazo de um mês.

Há apenas um minoritário relevante na empresa, a Previ, Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil, com 2,9% do capital - 0,9% das ordinárias e 5,4% das preferenciais.

A reação do mercado na sexta-feira foi positiva: as ações ordinárias subiram 4,14%, para R$ 82,58, e as preferenciais tiveram alta de 3,49%, para R$ 83,52. O valor da empresa fechou R$ 6 bilhões maior do que quando foi anunciada a reorganização.

De 2006, após o último grande evento sobre a base acionária da empresa, até maio deste ano, as ações da Ambev na bolsa subiram de R$ 18 para pouco mais de R$ 88. Nesse período, o acionista teria ganho R$ 70 com a valorização da ação. Além disso, teria colocado no bolso mais R$ 10 em dividendos pagos a toda a base nesse intervalo. No caso dos preferencialistas, teriam levado R$ 0,55 extras, fruto do prêmio legal sobre os dividendos. No cômputo geral, portanto, apenas 0,7% de todo o ganho (cerca de R$ 81, somando alta da ação e dividendos) teria vindo da diferença a que os preferencialistas têm direito sobre os proventos.

Junto com a reorganização, a Ambev vai elevar o dividendo mínimo obrigatório de 35% para 40%, embora historicamente já pague mais do que esses percentuais. O grande novo benefício virá da ampliação do capital social.

Jamel evitou quantificar, mas destacou que isso ampliará significativamente a flexibilidade da empresa de trabalhar as frentes de valorização para o acionista - juros sobre capital próprio, dividendos e recompras.

A AmBev gera entre R$ 8 bilhões e R$ 10 bilhões de caixa ao ano, segundo o executivo. Mas ficava limitada nos pagamentos tanto pelo lucro como pelo montante de seu capital. Agora, poderá pagar valores maiores aos acionistas.



Veículo: Valor Econômico


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