Reservas caem na Argentina e protecionismo deve voltar

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Sem conseguir conter a queda contínua nas reservas internacionais, a Argentina deve se tornar ainda mais protecionista nos próximos meses, encerrando a breve trégua que marcou o comércio exterior do país nos últimos meses. Segundo consultores especializados em comércio exterior em Buenos Aires, a reversão deve começar a se manifestar ainda neste mês.

A Argentina já é considerada o segundo país com mais medidas de restrições comerciais no mundo, atrás apenas da Rússia, de acordo com o monitor "Global Trade Alert", mantido por um centro de estudos britânico: são 230 restrições em vigor, ante 281 russas. No Brasil, são 134.

A Argentina flexibilizou o comércio nos últimos meses em função da perspectiva do aumento de 20% na safra de soja, a principal commodity exportada, e do reaquecimento do mercado de automóveis no Brasil, que impulsiona o comércio bilateral. Mas as vendas ao exterior subiram muito menos que as importações e a perspectiva de superávit comercial, que era de US$ 11 bilhões, foi cortada para US$ 8 bilhões.

Nos cinco primeiros meses do ano (o resultado de junho só deve ser publicado na terceira semana do mês), as exportações cresceram 4%, atingindo US$ 33,2 bilhões; enquanto as compras externas saltaram para US$ 29,5 bilhões, um aumento de 12,8%. As reservas internacionais, hoje de US$ 37,2 bilhões, cobrem apenas cinco meses de importações. Há um ano, quando estavam em US$ 48 bilhões, cobriam cerca de seis meses e meio.

"O problema é que o setor mais dinâmico das exportações argentinas é o de industrializados para o Brasil, sobretudo automóveis, que demandam muitas importações", comentou Jorge Vasconcelos, economista-chefe da Fundação Ieral, um centro de estudo ligado à indústria de Córdoba. Cálculos do próprio governo apontam que 80% do setor industrial realiza importação de insumos.

A perspectiva de mudança cambial também afetou o comportamento do comércio. "A desvalorização contida do peso fez com que muitas indústrias aproveitassem a brecha nas restrições para recompor estoques", disse Alejandro Ovando, da consultoria de comércio exterior IES. O peso se desvalorizou 19% nos últimos 12 meses, mas de maneira extremamente regular, perdendo cerca de dois centavos por semana em relação ao dólar. Como a moeda ficou com a cotação sobrevalorizada em 2010 e 2011, há um atraso cambial que fomenta especulações de desvalorização em 2014.

Em 2012, as barreiras comerciais foram generalizadas: basicamente criou-se um documento, a Declaração Jurada de Antecipação de Importações (DJAI), que deve ser enviada à Secretaria de Comércio Exterior para cada operação. A importação só é concretizada com a autorização caso a caso. Como não se tratava de uma barreira formal, pertencer a um bloco como o Mercosul foi irrelevante do ponto de vista argentino, que fez um corte linear. O Brasil foi o país mais atingido, porque os produtos que exporta são mais facilmente substituíveis.

"Se o mesmo modelo for adotado neste ano, o Brasil novamente será o país mais afetado. Se o governo for seletivo, quem sofrerá mais será a China e o Sudeste Asiático", afirmou Ricardo Delgado, da consultoria Analytica.

O setor automotivo representa 43% das vendas do Brasil para o país e 44% das importações brasileiras da Argentina e é regido por regras próprias, em processo de revisão. O problema está nas demais exportações brasileiras para a Argentina, que são predominantemente de insumos e bens intermediários e que continuam mostrando um desempenho ruim: elas caíram 5% nos primeiros cinco meses do ano, em comparação com o mesmo período de 2012, quando já haviam recuado 25%. No caso da China, prevalece a importações de bens de consumo final.

Nos primeiros cinco meses do ano, em que o governo autorizou as DJAI de maneira mais ágil, o aumento das compras externas da Argentina anulou a retração de 2012: a importação de pneus para automóveis cresceu 59% e a de software, 51%. As importações de eletrodomésticos subiram 40%, e as de calçados, 35,7%. Mas o que está ameaçando a balança são as importações de energia, que subiram 29% e atingiram US$ 4,6 bilhões em cinco meses. "De maneira geral, as importações subiram em todos os segmentos e em todas as origens. O que impressionou foi a debilidade do setor exportador", disse Vasconcelos.

As exportações da Argentina não cresceram por dois motivos: estatizada no ano passado, a petroleira YPF passou a direcionar sua produção de petróleo e gás para o mercado interno, para atenuar o déficit energético do país. E os exportadores da agroindústria passaram a conter suas vendas, apostando em uma alta do dólar ou esperando melhores preços internacionais. É o caso do trigo, de biodiesel e do óleo de soja. No caso dos derivados de trigo, o governo acusou os exportadores de reterem pelo menos 1 milhão de toneladas da commodity e suspendeu as vendas ao exterior há um mês.

Como forma de tentar conter a queda nas reservas, o governo argentino lançou um programa de anistia para quem repatriar recursos de origem não declarada. Na primeira semana em vigor, até ontem, os resultados eram modestos: apenas US$ 1,06 milhão ingressaram na Argentina. A expectativa do governo era trazer de US$ 2 a US$ 6 bilhões em três meses.



Veículo: Valor Econômico


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