Aumentar as exportações para marcas terceiras, mas com maior valor acrescentado do que no passado; encontrar espaço nos mercados internacionais para marcas portuguesas; e crescer nos têxteis técnicos, em particular através de investimento estrangeiro. A estratégia para o têxtil e o vestuário é assim traçada por Manuel Teixeira, diretor do CENIT, Centro de Inteligência Têxtil.
Já se deu como certa a morte do setor. Esteve prestes a desaparecer?
Nunca esteve quase a desaparecer. Havia dúvidas sobre o impacto que a China teria, mas o fator determinante foi a política cambial: um escudo caro e depois o euro forte, enquanto os produtos do Oriente vinham em dólares, mais baratos. Mas a indústria tinha de emagrecer.
A fase de emagrecimento acabou?
Parece ter terminado. O emprego está a crescer há dois anos. Falências haverá sempre e é um enorme drama para as pessoas, mas o importante é que, noutro lado, nasçam novas empresas, com melhor emprego.
Em muitos setores, estão a ser despedidos trabalhadores mais velhos e melhor pagos e contratados jovens qualificados, mas com salário baixo. É o que acontece no setor?
Não é tão visível, ainda que possa acontecer. Estamos a criar emprego com melhores condições. Se há coisa que as empresas procuram é que os trabalhadores estejam satisfeitos. É fundamental quando se trabalha com prazos apertadíssimos. Somos recordistas mundiais nos prazos de entrega. É o nosso maior fator de competitividade, até porque não somos baratos, no contexto mundial.
Hoje, ainda existem empresas a trabalhar da forma tradicional?
Empresas como tínhamos há 15 ou 20 anos, já não existem. Hoje, são muito flexíveis, com grande capacidade de resposta, de engenharia de produto.
O setor já não é um grande empregador no Norte. Que papel pode ter na economia da região?
Tem um papel importantíssimo, tanto em atividades imateriais, em soluções de carreia para os mais jovens (temos défice de profissionais nesta área, as empresas estão a ir buscá-los ao estrangeiro), quanto na consolidação dos territórios. Há novas empresas que não encontram mão-de-obra nas zonas tradicionais e estão a abrir fábricas entre Lousada e Baião.
Que inovações existem na indústria têxtil e do vestuário?
A fiação, a tecelagem, as tinturarias estão automatizadas, tal como o corte. A confeção ainda é manual, mas visitei uma fábrica em que cada costureira tem um tablet. O têxtil é o produto com grande capacidade de integração de informação. É possível fazer tecido a partir de fios com informação e transformá-los num dispositivo. O têxtil vai ter uma aplicação muito mais alargada do que tem hoje. Não faltarão muitos anos para termos um telemóvel integrado num casaco. A indústria tem capacidade para acompanhar estas inovações.
Qual é a estratégia do setor?
No vestuário, nos anos 80, não havia retalhista europeu que não comprasse em Portugal, mas saímos um pouco da rota dos compradores. Agora queremos voltar, não para fazer os produtos do passado, mas de maior valor acrescentado. A segunda linha de ação são as marcas próprias. Queremos que tenham maior presença nos mercados internacionais. Estamos conscientes de que a barreira à entrada é muito grande (o mercado de retalho está concentrado em grandes marcas), mas está a haver um esforço. Há essa ambição, eventualmente adquirindo uma rede já existente.
E os têxteis técnicos?
Falta pensar numa dimensão maior para os têxteis técnicos (usados no automóvel, na saúde, na construção civil, em material de segurança para proteção civil...) É um negócio em crescendo na Europa, falta uma política assumida de atração de capital estrangeiro. Deve-se bater à porta dos grandes operadores multinacionais. Em 2004, definimos metas ambiciosas para 2010, que incluíam atingir 20% das exportações em marca própria e 20% em têxteis técnicos. Ainda estamos um bocadinho longe, mas temos uma grande dinâmica.
Fala de capital estrangeiro. As maiores empresas são portuguesas?
A larga maioria das empresas é de capital português. As multinacionais saíram quase todas. É um setor familiar, uma das razões da sua resiliência. A maior parte das empresas passou por períodos com as contas no vermelho, mas a lógica familiar permitiu ter resiliência para dar a volta. Se fosse um estrangeiro tinha mandado fechar.
Findos esses períodos, agora o setor dá um contributo positivo ao país?
Estou otimista. Os grandes impactos externos já foram absorvidos e estamos a assistir a uma reestruturação das cadeias de retalho. Algumas estão a ser ultrapassadas por cadeias mais pequenas e, se for pelo fator novidade e não pelo preço, é o nosso negócio, é fantástico. E nos países mais desenvolvidos, os consumidores estão fartos das grandes etiquetas, iguais para todos. Querem coisas novas, o que cria uma dinâmica que também nos é favorável. Os ventos internacionais, dos mercados externos, são favoráveis à nossa indústria.
Fonte: Jornal de Notícias