O Judiciário só pode alterar o que foi livremente pactuado entre trabalhadores e empregadores caso haja flagrante inconstitucionalidade. Sem constatar tal hipótese no caso concreto, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal manteve uma decisão que livrou a Petrobras do pagamento de mais de R$ 40 bilhões em adicionais e gratificações cobradas por sindicatos na maior ação trabalhista da história da estatal. A sessão virtual se encerrou na última sexta-feira (10/11).
Em 2018, o Tribunal Superior do Trabalho garantiu que adicionais relacionados a condições especiais de trabalho — como periculosidade, adicional noturno e sobreaviso — não fossem descontados no pagamento de uma renda mínima paga a cerca de 51 mil funcionários ativos e inativos da empresa petrolífera.
À época, o impacto estimado para a Petrobras era de R$ 17,2 bilhões, sendo R$ 15,2 bilhões para corrigir os salários retroativamente. Em 2022, a estatal atualizou a conta e incluiu entre suas provisões o valor de R$ 46 bilhões.
O montante não chegou a ser desembolsado porque, ainda em 2018, o então presidente do STF, ministro Dias Toffoli, suspendeu a decisão do TST e todas as ações individuais e coletivas que discutem o tema.
Já em 2021, o relator do caso, Alexandre de Moraes, derrubou a decisão do TST. A ação foi, então, levada ao colegiado da 1ª Turma. O caso já tinha maioria formada desde 2022, mas, à época, Rosa Weber (hoje aposentada) pediu vista dos autos e interrompeu o julgamento.
De acordo com Francisco Caputo, advogado da Petrobras, e sócio do escritório Caputo Bastos e Serra Advogados, a decisão agora referendada pelos ministros “confere segurança jurídica às relações trabalhistas e reafirma o que o Plenário do STF já pacificou, no sentido de prestigiar as negociações coletivas, nos termos da Constituição”.
Histórico
O caso teve origem em 2007, quando a Petrobras, em acordo com o sindicato da categoria, criou a complementação da remuneração mínima por nível e regime (RMNR) — uma espécie de piso. A estatal deduzia os adicionais ao calcular o complemento da RMNR.
A partir de 2010, os funcionários passaram a exigir na Justiça que os adicionais fossem pagos em separado. Como a RMNR dava margem a mais de uma interpretação, os sindicatos envolvidos criaram a tese de que deveria prevalecer a mais benéfica aos trabalhadores, sem o desconto.
No caso paradigma, tanto o Juízo de primeiro grau quanto o Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região negaram o pedido. Ao receber o caso, o TST reuniu sete mil ações individuais e 47 coletivas movidas por trabalhadores, envolvendo cerca de 20 entidades sindicais. No julgamento, os ministros deram razão aos funcionários.
Fundamentação
Em seu voto na sessão virtual, Alexandre manteve sua decisão anterior, que restabelecia a decisão de primeira instâcia. Ele apontou que a RMNR foi estabelecida a partir de um acordo coletivo após amplo e longo processo de negociação. Assim, se havia dúvidas, os sindicatos e trabalhadores deveriam ter pedido esclarecimentos no momento adequado.
“Supor que a cláusula não foi devidamente compreendida pelos trabalhadores, por faltar-lhe a demonstração matemática das suas consequências é, no mínimo, menosprezar a capacidade do sindicato de cumprir o papel de representar a categoria e negociar os melhores termos do acordo”, destacou.
Na visão do TST, o acordo teria igualado os que trabalham em situações piores aos que não exercem função em condições especiais. Já para o relator do caso no STF, os critérios são isonômicos, razoáveis e proporcionais.
“Não houve supressão ou redução de qualquer direito trabalhista, pois, como admite o próprio TST, a instituição do RMNR não retirou os adicionais daqueles trabalham em situações mais gravosas; apenas essas parcelas são computadas na base de cálculo da complementação da RMNR, por tratar-se de verbas remuneratórias que têm o intuito de individualizar os trabalhadores submetidos a uma determinada condição, em relação aos que não se submetem à mesma penosidade”, concluiu.
Alexandre foi acompanhado por Toffoli e Cármen Lúcia. O ministro Luís Roberto Barroso se declarou suspeito.
A única a divergir foi Rosa Weber, que devolveu os autos para julgamento antes de se aposentar, em setembro. O processo só foi pautado no Plenário Virtual mais de um mês depois. Ela não constatou provas quanto à vontade das partes na época do estabelecimento do acordo e, por isso, validou o entendimento do TST.
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RE 1.251.927
José Higídio – Repórter da Revista Consultor Jurídico
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 13/11/2023