O Supremo Tribunal Federal rejeitou nesta quarta-feira (3/4) embargos de declaração na ação que discute os limites da coisa julgada em matéria tributária.
A corte analisa pedidos para modular a decisão de fevereiro de 2023 que permitiu o cancelamento de decisões definitivas (transitadas em julgado) a partir da mudança de entendimento do STF em questões tributárias.
O julgamento será retomado nesta quinta-feira (4/4) porque falta definir alguns pontos envolvendo, por exemplo, a exigibilidade de multas tributárias punitivas e moratórias aplicadas aos contribuintes.
A discussão sobre os embargos foi retomada nesta quarta já com maioria formada contra a modulação, prevalecendo o voto do ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo.
O caso concreto envolve a decisão transitada em julgado em 1992 que admitia o não pagamento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Em 2007, porém, o Supremo entendeu que a cobrança do tributo é constitucional.
No julgamento de fevereiro do ano passado, a corte decidiu, por unanimidade, que a cobrança passou a surtir efeitos desde 2007, independentemente de decisões anteriores que já transitaram em julgado e permitiram o não pagamento. Assim, contribuintes que não pagavam a CSLL deveriam recolher o tributo devido desde 2007.
Na ocasião, o Supremo também decidiu, por 6 votos a 5, não modular os efeitos da decisão. Na sessão desta quarta, o tribunal formou maioria contra os embargos de declaração que pediram a modulação de efeitos.
Modulação
Ao analisar os embargos, Barroso afirmou que o Supremo adota o entendimento segundo o qual as decisões produzem efeito a partir da publicação da ata. Assim, a cobrança da CSLL vale desde a data da publicação da ata do julgamento de 2007.
“Não encontra fundamento a alegada omissão quanto ao termo inicial da anterioridade. Conforme consta expressamente no voto condutor, o prazo da anterioridade conta-se a partir da data da publicação da ata de julgamento em controle concentrado ou controle difuso em repercussão geral, que, segundo entendimento da Corte, equivale ao primeiro dia de vigência da nova norma, originada do precedente judicial”, disse o ministro em novembro do ano passado, quando os embargos começaram a ser analisados.
Segundo Barroso, a partir de 2007, quando se entendeu que todos os contribuintes teriam de pagar a CSLL, a manutenção “da coisa julgada em favor de quem obteve a decisão (transitada em julgado) criaria uma posição concorrencial injusta para todos os demais. (…) A partir do momento em que o Supremo entendeu que o tributo era devido por todos, a coisa julgada cessou seus efeitos”.
A análise do STF era bastante aguardada devido ao impacto do julgamento na segurança jurídica e na forma de atuação do Fisco. Afinal, os ministros decidiram se é possível autuar um contribuinte que já obteve decisão judicial favorável caso haja mudança na jurisprudência.
A discussão envolve o interesse da União em voltar a recolher a CSLL de empresas que em 1992 obtiveram decisão transitada em julgado que lhes concedeu o direito de não pagar o tributo.
Seguiram Barroso contra a modulação os ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, André Mendonça, Cármen Lúcia e Rosa Weber, que votou antes de se aposentar.
Divergências
O ministro Luiz Fux abriu divergência. Para ele, a decisão deveria produzir efeitos a partir de fevereiro de 2023, quando o Supremo permitiu o cancelamento de decisões transitadas em julgado em caso de mudança de entendimento da corte.
“Um país que promete segurança jurídica e ao mesmo tempo desfaz a coisa julgada sem ação nenhuma, leva, evidentemente, às pessoas que têm interesse em investir no Brasil uma sensação de insegurança e imprevisibilidade”, afirmou Fux.
Também votaram pela necessidade de modulação os ministros Dias Toffoli, Edson Fachin e Nunes Marques. Mendonça votou contra a modulação, mas afastou a exibilidade de multas tributárias punitivas e moratórias aplicadas aos contribuintes. Esse ponto em específico ainda será votado pelos ministros.
Julgamento retomado
Os embargos começaram a ser analisados no Plenário físico em novembro de 2023, mas o caso foi paralisado por pedido de vista do ministro Dias Toffoli.
Na retomada do julgamento, Toffoli afirmou que não modular a decisão traria insegurança jurídica, já que o entendimento de 2023 foi inovador e atingiu contribuintes que, com confiança na coisa julgada, deixaram de alocar recursos para o pagamento de tributo então reconhecido como inconstitucional.
“Havia uma base de confiança em prol dos contribuintes, formada em sede de recursos repetitivos pelo STJ. Os contribuintes acreditavam nessa base, a qual vinha perdurando por mais de uma década, e em sua manutenção”, disse o ministro. “Realizaram atos concretos, acreditando naquela base, já com coisa julgada, deixando de provisionar recursos para o pagamento do tributo reconhecido com inconstitucional em decisão transitada em julgado e realizando programações de suas finanças ou gastos pro futuro, à luz desse quadro”, prosseguiu Toffoli.
Nunes Marques foi o último a votar, também pela necessidade de modulação.
“Quando o Supremo fixa tese que contempla o princípio da irretroatibilidade, acena em direção à boa-fé, à proteção da confiança legítima e à segurança jurídica. Demonstra que os contribuintes eximidos do pagamento de determinado tributo por força de decisão do Judiciário, e, além do mais, transitada em julgado, tinham motivo para estar seguros. Não seriam surpreendidos.”
RE 949.297
RE 955.227
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 03/04/2024