Impenhorabilidade de depósito de até 40 salários mínimos não pode ser reconhecida de ofício

Leia em 3min

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.235), estabeleceu a tese de que a impenhorabilidade de depósitos ou aplicações bancárias no valor de até 40 salários mínimos não é matéria de ordem pública e não pode ser reconhecida de ofício pelo juiz. Segundo o colegiado, a impenhorabilidade deve ser apontada pela parte executada no primeiro momento em que lhe couber falar nos autos, ou, ainda, em embargos à execução ou na impugnação ao cumprimento de sentença, sob pena de preclusão.

Os recursos especiais e agravos em recurso especial sobre o tema, que estavam suspensos à espera da decisão do STJ, podem voltar a tramitar. O precedente qualificado deve ser aplicado em todos as ações semelhantes. O julgamento teve a participação, como amici curiae, do Instituto Brasileiro de Direito Processual, da Defensoria Pública da União, da Federação Brasileira de Bancos e da União.

A relatora dos recursos repetitivos foi a ministra Nancy Andrighi. Ela explicou que o argumento de que a regra da impenhorabilidade seria de ordem pública tinha por base, principalmente, a interpretação literal do artigo 649 do Código de Processo Civil (CPC) de 1973, que trazia as hipóteses de bens considerados "absolutamente impenhoráveis".

Segundo a ministra, embora a regra do CPC/1973 já fosse relativizada pelo STJ, o dispositivo correspondente no CPC/2015 (artigo 833) retirou a expressão "absolutamente". Essa mudança normativa – apontou – levou o STJ a estabelecer o entendimento de que o CPC passou a tratar a impenhorabilidade como relativa, permitindo que seja atenuada em algumas situações específicas, como já decidido pela Corte Especial nos EREsp 1.874.222.

CPC foi expresso ao regular atuação de ofício pelo juízo

Nancy Andrighi citou doutrina no sentido de que a impenhorabilidade é um direito do executado, sujeito a renúncia se o bem for disponível (a exemplo de valores depositados em contas bancárias). Ela também destacou que cabe ao executado alegar a hipótese de impenhorabilidade na primeira oportunidade que tiver para se manifestar nos autos.

A ministra apontou que esse entendimento já havia sido adotado pela Corte Especial no julgamento dos EAREsp 223.196, mas, a partir de 2022, sobrevieram acórdãos das turmas de direito público em sentido diverso.

A relatora enfatizou que, quando o CPC/2015 autoriza a atuação de ofício do juízo nesse tema, há previsão expressa no código, a exemplo do parágrafo 1º do artigo 854, segundo o qual ele pode determinar, mesmo sem pedido das partes, o cancelamento da indisponibilidade de patrimônio que ultrapasse o valor da execução.

"Ou seja, o código processual não autoriza que o juiz reconheça a impenhorabilidade de ofício, pelo contrário, atribui ao executado o ônus de alegar e comprovar tal situação de forma tempestiva, sendo claro que o descumprimento desse ônus pelo executado ensejará a conversão da indisponibilidade em penhora, nos termos do artigo 854, parágrafo 3º, inciso I, e parágrafo 5º, do CPC/2015", detalhou.

De acordo com a ministra, embora o CPC/2015 preveja a efetivação da penhora caso o executado não se manifeste sobre o bloqueio do bem no prazo de cinco dias, ele ainda tem à disposição o manejo da impugnação ao cumprimento de sentença ou os embargos à execução para alegar e comprovar a impenhorabilidade.

"Não havendo a alegação tempestiva em nenhuma dessas hipóteses, estará configurada a preclusão temporal da questão referente à impenhorabilidade, não podendo nem mesmo ser apreciada em exceção de pré-executividade, por não se tratar de matéria de ordem pública", à luz da interpretação sistemática dos artigos 833; 854, parágrafos 1º, 3º, I, e 5º; 525, IV; e 917, II, do CPC/2015 – concluiu a ministra.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

REsp 2061973

REsp 2066882

Fonte: STJ – 04/10/2024


Veja também

MEDIDA PROVISÓRIA nº 1.262, de 3 de OUTUBRO de 2024

Institui o Adicional da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, no processo de adaptação da legislação brasile...

Veja mais
INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 2.228, DE 3 DE OUTUBRO DE 2024

Dispõe sobre a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido no processo de adaptação da legislação brasileira às r...

Veja mais
Página de Repetitivos e IACs Anotados inclui teses sobre tributação no stock option plan

A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) atualizou a base de dados de Repetitivos e IACs ...

Veja mais
Projeto dispensa reconhecimento de firma nas assinaturas eletrônicas

O Projeto de Lei 2541/24 dispensa o reconhecimento de firma na hipótese de assinatura eletrônica qualificada – aquel...

Veja mais
TRT 4ª Região – Cancelada a manutenção no PJe neste sábado (5/10). Sistema estará disponível

O sistema Processo Judicial Eletrônico (PJe) e seus sistemas satélites permanecerão disponíveis neste sábado (5/10)...

Veja mais
CARF publica portaria com novas regras que harmonizam calendário de sessões com recesso jurídico

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) deu mais um passo em direção à modernização e à melhoria das ...

Veja mais
Reforma tributária: especialistas propõem melhorias no Comitê Gestor do IBS

A criação do Comitê Gestor (CG) do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), prevista no Projeto de Lei Complementar (PL...

Veja mais
Mais de 3 mil contribuintes poderão regularizar divergências de PIS e Cofins, evitando a aplicação de multa de ofício

A Receita Federal enviou 3148 comunicados para empresas que apresentaram divergências nas informações entre o declara...

Veja mais
Crédito presumido de ICMS não pode ser tributado pela União, reitera juíza

O crédito presumido de ICMS não integra a base de cálculo do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contrib...

Veja mais