Um dos parágrafos excluídos é o que impedia o cancelamento do cadastro
Expectativa de lojistas é que consumidores e empresas incluídos no cadastro positivo paguem menos juros
A lei que cria o cadastro positivo -lista de bons pagadores- foi sancionada ontem por Dilma Rousseff com três vetos, atendendo pedidos de órgãos de defesa do consumidor.
Foram excluídos o parágrafo que impedia o cancelamento do cadastro, se houvesse alguma operação de crédito não quitada, o que limitava o acesso gratuito às próprias informações e o que liberava o compartilhamento de dados sem autorização.
A expectativa é que consumidores e empresas incluídos no cadastro positivo tenham acesso a juros mais baixos. Em tese, um bom pagador oferece risco menor de inadimplência, fator que influencia nos juros.
A criação do banco de dados ainda depende da edição de legislação específica. Haverá cadastros administrados por várias entidades, como já acontece hoje com as listas de inadimplência.
O cadastro positivo trará informações sobre pagamento em dia de empréstimos e de contas de serviço. No último caso, ficam de fora as contas de telefone celular, devido às reclamações de clientes em relação ao setor.
A inclusão do nome em um desses serviços requer consentimento por escrito do consumidor ou da empresa.
Uma só autorização permite a inclusão de vários tipos de dado. É possível sair da lista a qualquer momento, pedido que deve ser atendido em até sete dias.
Os gestores desses cadastros ficam responsáveis pela segurança e pela veracidade das informações, que podem ser compartilhadas com outros bancos de dados, desde que o consumidor autorize.
Só pode consultar os dados quem pretende ter com o cliente alguma relação comercial ou creditícia. O consumidor tem direito de saber quem acessou suas informações nos últimos seis meses.
JURO MENOR
Lojistas e administradoras de serviços de proteção ao crédito disseram que a implantação do cadastro aumentará o acesso a financiamentos e reduzirá os juros, como ocorre em diversos outros países.
Alguns consideram que os benefícios vão demorar a aparecer. Primeiro, é necessário formar um banco de dados abrangente. As empresas também terão de aprender a lidar com as informações e medir a redução de custos relacionada a elas.
O Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) afirmou que foram vetados os pontos que mais ameaçavam os direitos dos consumidores. O instituto defende, no entanto, a criação de uma entidade que supervisione o cadastro, como ocorre em outros países, e a aprovação de uma lei geral de proteção de dados.
A ProTeste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor) diz que o cadastro não trará danos ao consumidor, mas há dúvidas sobre o uso das informações e o benefício com a queda do juro.
O Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) afirmou que a medida também beneficia micro e pequenas empresas, pois vai baratear o crédito tomado pelos empresários e diminuir o risco de inadimplência de seus clientes.
Serasa vê queda de 50% na inadimplência
Empresas de proteção ao crédito dizem estar preparadas para operar o cadastro positivo de crédito no país
Propaganda ao público é estratégia para levar mais consumidores a autorizar o uso dos dados financeiros
Principal "operadora" do cadastro positivo brasileiro, a Serasa Experian já desenvolveu uma série de produtos e de ferramentas de análise de crédito prontas para manipular dados como histórico de pagamento dos consumidores para vender aos bancos e ao varejo.
Só falta a base de dados ser alimentada com informações devidamente autorizadas pelos consumidores.
Segundo Ricardo Loureiro, presidente da Serasa, o cadastro positivo deve reduzir pela metade a inadimplência do consumidor pessoa física, hoje de cerca de 6% do total de empréstimos, após um prazo de 12 meses de pleno funcionamento.
"Teremos a oportunidade de entender qual é a capacidade de pagamento e de distinguir o bom pagador. À medida que tivermos uma base de dados mais parruda, poderemos diminuir à metade a inadimplência", disse.
Para Loureiro, o novo cadastro deve beneficiar especialmente a população recém-bancarizada e os informais que trabalham por conta própria e não têm como comprovar renda.
A SCPC, serviço de proteção ao crédito do comércio, também está preparada para utilizar informações positivas dos consumidores.
Para Dorival Dourado, presidente da Boa Vista Serviços, gestora do SCPC, a ferramenta será fundamental para aperfeiçoar o sistema de concessão de crédito no país.
"A efetividade do cadastro positivo virá gradualmente, conforme a sociedade compreenda seu funcionamento, incorporando-o às necessidades e à cultura do país."
PROPAGANDA
Diferentemente do que ocorre em outros países, o cadastro positivo no Brasil só poderá ser formado e compartilhado com a autorização expressa do cliente.
A regra faz com que empresas como a Serasa, cujos clientes são os bancos e o varejo, tenham agora que se dirigir para o público geral.
Para isso, a Serasa foi fazer anúncio em estádio de futebol antes mesmo da sanção.
"Estamos diante de uma mudança cultural e a Serasa tem um trabalho para desenvolver.
O cadastro positivo é a oportunidade que as pessoas têm de fazer com que seu bom comportamento seja revertido em benefício próprio. O cidadão também vai querer saber como estão os seus dados. Estamos preparados para esse atendimento também", disse Loureiro.
"O cadastro tornará possível o registro de informações em benefício de todos os envolvidos, especialmente o consumidor", diz Dourado.
Veículo: Folha de S.Paulo