Ao sancionar a Lei nº 12.529, que cria o Super Cade, a presidente Dilma Rousseff vetou o artigo 64, que facilitava a aprovação de fusões e aquisições de empresas. O artigo determinava que, se os prazos para o julgamento de uma fusão fossem descumpridos, o negócio seria aprovado automaticamente. Ou seja, as empresas nem precisariam esperar pelo julgamento.
Na avaliação do Ministério da Justiça, isso seria um risco. Se o Super Cade descumprisse qualquer prazo, como, por exemplo, de 48 horas para sorteio do relator do processo, a fusão teria aval automático. "Os vetos foram pontuais e adequados", afirmou o secretário de Direito Econômico, Vinícius Carvalho.
Outro exemplo, segundo ele, foi o artigo 114, que permitia às empresas pedir a imediata autorização da fusão, antes do julgamento final pelo Cade. Esse artigo também foi vetado, pois a ideia do Super Cade é que as fusões simples sejam aprovadas em menos de 30 dias. Segundo Carvalho, como as operações complexas já são suspensas previamente pelo órgão antitruste, não havia motivo para autorizá-las antes do julgamento.
O presidente do Cade, Fernando Furlan, explicou que será feito um novo regimento interno com orientações sobre os prazos de análise de fusões e aquisições. Pela nova lei, os negócios serão aprovados em, no máximo, 330 dias. "Nós discutimos essa questão e os conselheiros concordaram em fazer um regulamento para impor uma disciplina", disse Furlan.
O Cade também quer aprovar uma nova resolução sobre multas, porque a nova lei diz que a multa por cartel será de "20% do faturamento da empresa no ramo de atividade objeto da investigação". "A nossa ideia é definir para as empresas o que será considerado 'ramo de atividade'", ressaltou Furlan.
O órgão antitruste pretende abrir consulta pública para empresas e advogados se manifestarem a respeito do novo regimento interno e da resolução sobre multas. "Isso certamente vai gerar bastante discussão", disse o advogado Paulo Casagrande, do escritório Brasil, Pereira Neto, Galdino e Macedo.
Segundo ele, a lei estabeleceu que as fusões só vão valer no Brasil após a aprovação pelo Super Cade. Daí, a necessidade de as empresas saberem que, ultrapassados os prazos legais, os negócios seriam aprovados. "Sem o artigo 64, não haverá essa certeza e será complicado verificar qual a consequência do descumprimento dos prazos pelo Super Cade", disse Casagrande. Para a ex-secretária de Direito Econômico Mariana Tavares de Araújo, advogada do escritório Levy & Salomão, o veto ao artigo 64 "criou insegurança jurídica quanto ao que acontecerá se o Cade não observar os prazos da lei".
Outra questão que precisa ser definida é a data a partir da qual as empresas devem notificar as fusões e aquisições. A lei que vigora hoje (nº 8.884, de 1994) especifica que é o primeiro documento vinculativo entre as empresas. "Como a aprovação será prévia, a nova lei não define qual é o primeiro documento vinculativo, o instante que determina a hora de apresentar a operação", advertiu o advogado José Del Chiaro.
A nova lei vai entrar em vigor daqui a 180 dias. O texto estabelece que só vão ser analisadas operações em que uma das empresas tenha faturamento anual acima de R$ 400 milhões e a outra acima de R$ 30 milhões. "Na prática, a partir de junho não será possível fechar operações no Brasil sem a aprovação do Cade", constatou o advogado Francisco Todorov, do escritório Trench, Rossi e Watanabe.
Para Amadeu Ribeiro, do Mattos Filho Advogados, o Cade e as empresas "terão pouco tempo para se preparar para essa nova realidade". Pedro Dutra chama a atenção para outro problema: "Mais do que uma nova lei, a eficiência do novo Cade vai depender das verbas que lhe serão destinadas e da indicação de conselheiros técnicos."
Veículo: Valor Econômico