Ação coletiva gera embate no novo Código do Consumidor

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Idealizada com o objetivo de focar o comércio eletrônico, o superendividamento e as ações coletivas, a atualização do Código de Defesa do Consumidor (CDC) já começa a causar polêmica. A ampliação do prazo de prescrição nas demandas coletivas é um dos principais pontos de discussão entre juristas e especialistas, além da possibilidade de condenação independente do pedido feito pelos autores.

 

Em evento realizado ontem pelo Centro de Estudos de Direito Econômico  e Social (Cedes), o professor Luiz Rodrigues Wambier fez fortes críticas aos anteprojetos elaborados pela comissão de juristas do Senado, que entregou as propostas em março desse ano. Para ele, os dispositivos que tratam da sentença condenatória (artigos 90-G, 90-H e 95-A, parágrafo 3º) trazem graves alterações e que atentam contra o estado democrático de direito.

 

Os artigos, segundo o especialista, mostram que em qualquer ação coletiva o juiz pode fixar, independentemente do pedido do autor, indenização por danos patrimoniais e morais não postulados nem discutidos no processo.

 

Além disso, o magistrado pode fazer com que o réu cumpra obrigações até então desconhecidas na ação. "Essa proposta institucionaliza o arbítrio e a imposição de vontades sem qualquer chance de defesa. As decisões devem ser dadas com base no objeto do pedido, o que garante o contraditório, a ampla defesa e a imparcialidade", disse Wambier.

 

Para o jurista Kazuo Watanabe, membro da comissão do Senado, a medida significa que a forma determinada para reparar os danos trazidos em uma ação coletiva será verificada na execução. "Dependerá da peculiaridade de cada caso, em que os juízes deverão verificar a aplicação do meio mais adequado", afirmou.

 

As prescrições também são alvos de intensa controvérsia. O projeto amplia os prazos em pretensões envolvendo interesses coletivos em pelo menos quatro dispositivos do projeto. O artigo 27-A estabelece que "as pretensões dos consumidores prescrevem em dez anos, se a lei não estabelecer prazo mais favorável ao sujeito vulnerável".

 

O parágrafo 5º do artigo 81 fixa que "as pretensões de direito material prescrevem, se for o caso, no prazo estabelecido por este Código ou pela lei, observado aquele que for mais favorável a seu titular".

 

O artigo 90-A, parágrafo 5º, diz que "a citação válida nas ações coletivas interrompe o prazo de decadência ou prescrição das pretensões individuais e coletivas, direta ou indiretamente relacionadas com a controvérsia, retroagindo a interrupção desde a distribuição até o final" da ação.

 

Para Wambier, o alongamento dos prazos vai na contramão do CDC. Além disso, a questão do prazo "mais favorável ao sujeito vulnerável" é inusitada e instável, e uma clara e violenta reação à jurisprudência do STJ, que fixou em 5 anos a pretensão para o exercício da ação coletiva.

 

"Os dispositivos flertam com a eternização das demandas, nivela em 10 anos o prazo para qualquer pretensão do consumidor ao invés dos cinco anos vigentes, isso se qualquer lei não estabelecer prazo mais favorável, o que pode levar a prescrição a 10, 15, 20 anos", afirmou. "Com a escolha da norma em cada caso o direito perde o componente de certeza e acaba a segurança jurídica. Além disso, pode haver uma regra para o consumidor e outra para o fornecedor", completou.

 

Para ele, a possibilidade de que o ajuizamento de uma demanda coletiva interrompa o prazo prescricional de qualquer outra pretensão, individual ou coletiva mantém um estado de litigiosidade e vai contra a desjudicialização proposta pela comissão.

 

O professor Nelson Nery Jr. afirmou que uma lei ideológica deve ser descartada e buscado o equilíbrio. "O aumento dos prazos vai na contramão da história e do mundo. As justificativas devem ser técnicas", disse.

 

Roberto Pfeiffer, integrante da comissão, afirma que a atualização pretende dar maior efetividade às ações coletivas, que terão prioridade de julgamento e integrarão um cadastro organizado pelo CNJ para evitar a repetição de demandas - a consulta a esse cadastro será obrigatória. Há ainda a ênfase no mecanismo de conciliação, inclusive no caso de superendividamento.

 

Veículo: DCI


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