Um tique cinza significa que a mensagem foi enviada. Ou seja, saiu do aparelho de telefone celular ou do computador do remetente e chegou ao servidor do WhatsApp. Dois tiques cinzas significam que a mensagem foi entregue no aparelho do destinatário. Dois tiques azuis, a mensagem foi lida. Ou: você acaba de ser intimado pelo Poder Judiciário.
Se o réu não tem endereço ou trabalho fixos e há uma clara dificuldade de encontrá-lo, mas áudios e prints de conversas revelam que ele é usuário ativo do aplicativo de mensagens, a Justiça deve usar a tecnologia em seu favor para citá-lo oficialmente. Foi o que decidiu o juiz Guilherme Madeira Dezem, da 44ª Vara Cível de São Paulo.
De acordo com a decisão, tomada nesta segunda-feira (5/7) em ação de indenização por danos morais, se está demonstrado nos autos que o réu é vendedor autônomo ambulante, sem endereço fixo ou endereços oficiais atualizados, mas a advogada da parte contrária consegue contato com ele de forma fácil por meio de WhatsApp, permitir sua citação pelo aplicativo é uma maneira de tornar o processo eficiente e evitar desperdício de recursos públicos: "Qualquer forma de tentativa de localização de seu endereço seria perda de tempo e dinheiro, do autor e do Estado", escreveu o juiz na decisão.
A ação foi ajuizada pelo ex-proprietário de um estacionamento contra o dono de um veículo quebrado que, segundo alega o autor, abandonou o carro no pátio do local em novembro de 2019 e ignorou diversos pedidos para que fosse retirá-lo. Por conta da epidemia, o local foi fechado e o ex-dono do estacionamento teve de guinchar o carro e guardá-lo na garagem de sua casa. Agora, ele cobra danos materiais por conta das mensalidades que não foram pagas e dos custos com transporte e manutenção de um veículo que afirma ser imprestável. Pede também danos morais pelos transtornos.
A advogada Bianca Abdo Eckschmiedt, que representa o autor do processo, pediu a intimação por WhatsApp com a justificativa de que o réu tem residência itinerante porque trabalha como vendedor autônomo em praias e cidades similares. Logo, não seria possível fornecer à Justiça um endereço fixo para a citação. Também alegou que há prova, na ação, de que o número telefônico indicado ao juiz pertence ao réu. Para isso, anexou à ação áudios e prints de conversas que teve com o réu.
O juiz Guilherme Madeira Dezem anotou que o pedido feito pela advogada não é usual e que, apesar de o Superior Tribunal de Justiça já ter permitido o procedimento, não há lei nem regulamentação expedida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo ou pelo Conselho Nacional de Justiça sobre citação por WhatsApp. A ausência de lei, contudo, não é suficiente para indeferir o pedido feito pela advogada.
Para o juiz, os princípios da razoabilidade, da eficiência e da boa-fé devem se impor à falta de legislação sobre o tema. "As partes devem atuar em boa fé e a esta implica também na ausência de preconcepções sobre atuações de má-fé. Afinal de contas é bem conhecida a lição de que a má-fé não se presume".
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030291-25.2021.8.26.0100
Rodrigo Haidar – Repórter especial da revista Consultor Jurídico.
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 05/07/2021