Os índices que medem o aumento de preços ao consumidor têm sido unânimes em um quesito: o vilão onipresente é a categoria Alimentos. Os preços em trajetória ascendente puxam a inflação, que ameaça ficar fora da meta do governo, de 4,5% em 2010. Só em novembro, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE, registrou uma alta de 2,22% no grupo Alimentação e bebidas. No ano, a alta já é de 8,95%. Para manter a clientela mesmo com os produtos mais caros, os supermercados apostam em parcelamentos das compras em até dez vezes nos cartões de crédito.
A modalidade de pagamento começou com a venda de eletroeletrônicos e utilidades domésticas nas lojas do varejo, mas logo se espalhou para as demais categorias. Em 2009, os pagamentos em cartões de crédito corresponderam a 34,6% das vendas dos supermercados, considerando as administradoras de cartões e bandeiras próprias das lojas.
- No Brasil, a oferta de parcelamento de compras em supermercado não era uma tradição. Mas hoje é normal levar um espremedor de frutas junto com as compras. Parcelar as compras de alimentos não é o foco, mas para o supermercado não faz diferença. E hoje a família está mudando a gestão do orçamento. Não se separa os alimento de outros itens e os gastos no cartão de crédito acabam entrando na contabilidade geral do orçamento - diz Sussumu Honda, presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).
- O pagamento em cartão de crédito interessa aos supermercados porque é um recebível com garantia. E também interessa às operadoras de cartão de crédito, que querem oferecer crédito para todo tipo de consumo -acrescenta.
De acordo com levantamento feito pelo GLOBO, nas lojas da rede Extra, é possível parcelar as compras em até dez vezes sem juros, no Cartão Extra, dependendo da categoria dos alimentos. Nas outras bandeiras de cartões de crédito, o pagamento pode ser feito em até quatro vezes sem juros.
A rede Carrefour permite o parcelamento em até três vezes sem juros, no Cartão Carrefour, apenas para aves natalinas e bacalhau. Somente a loja de Niterói oferece o parcelamento de todos os itens alimentícios, em até três vezes sem juros, também no cartão da própria rede.
Nos supermercados Guanabara e Zona Sul, são aceitos todos os cartões de crédito, mas o parcelamento e os juros são os praticados por cada banco, em acordo com as operadoras.
A rede Prezunic parcela as compras em até duas vezes, no Cartão Prezunic Mastercard, mas com juros de 10,2% ao mês. Já o Mundial não aceita cartões de crédito.
O economista José Ronoel Piccin, presidente do conselho aministrativo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), acredita que parcelar as compras de itens de primeira necessidade pode arruinar as finanças pessoais.
- Isso é loucura. Só devemos parcelar os supérfluos. Alimentos nós devemos pagar em dinheiro. É o mesmo que ir ao sapateiro para colocar um saltinho no sapato e financiar o saltinho. Você perde o controle dos gastos e vai se endividando. Seria uma heresia com o seu planejamento financeiro pessoal se pagasse a prazo - enfatizou Piccin.
- É a mesma coisa em farmácias. Eles oferecem parcelamento em até três vezes. Eu acabo aceitando, mas não devia. Gastos do dia-a-dia têm que ser pagos à vista.
Nelson de Sousa, professor de Matemática Financeira do Ibmec/RJ, acha que o parcelamento pode ser uma boa opção.
- Se tiver dinheiro na mão, o ideal é pesquisar e pagar no lugar mais barato à vista. Mas, se o pagamento for em parcelas iguais, pode ser interessante. O bacalhau custa de R$ 40 a R$ 60. Pagar em três vezes o mesmo produto pelo mesmo valor vale a pena.
Mas opinião do professor muda completamente, quando o parcelamento embute juros, como ocorre, por exemplo, no Prezunic.
- Uma taxa de 10,2% é o mesmo que pagar 220% de juros ao ano. Significa pagar três vezes mais. Se você pegar R$ 1 hoje, daqui a um ano deve R$ 3,20. Se comprar um quilo de açúcar, depois de um ano vai pagar mais de três quilos - calcula Nelson de Sousa, professor de Matemática Financeira do Ibmec/RJ.
Independentemente da modalidade de pagamento, especialistas apostam que o aumento nos preços dos alimentos não deve preocupar os consumidores, nem justifica uma corrida ao supermercado no início do mês.
- O aumento não é tão grande e ocorre em itens pontuais. A carne, por exemplo, subiu muito. Mas o melhor é optar por consumir os produtos da época, que são mais baratos. Para economizar, o ideal é comprar de acordo com a sazonalidade - ensinou o professor Nelson de Sousa.
Segundo Sussumu Honda, o preço dos alimentos vem caindo ao longo dos últimos anos e não deve manter a atual trajetória ascendente.
- Os preços dos alimentos industrializados tiveram queda de 1,5% nos primeiros seis meses do ano. Esse aumento recente não preocupa, até porque antes vinha caindo muito. A produção está cuidando para atender a demanda. A oferta será mais abundante - disse Sussumu.
Veículo: O Globo