Furtos, destruição e má conservação de mercadorias sugam receitas de lojistas, que repassam os prejuízos para os preços nas gôndolas. Nem mesmo o aumento dos investimentos em segurança inibe os desvios
Apesar dos pesados investimentos em segurança, os supermercados não conseguem fechar o ralo das perdas provocadas por furtos, destruição e má conservação de mercadorias dentro das lojas. Se as contas da Abras, a associação que reúne as empresas do setor, estiverem corretas, somente neste ano, os prejuízos chegarão a R$ 5,5 bilhões, totalizando R$ 15,5 bilhões desde 2012. Essa conta, entretanto, termina sendo paga pelos consumidores, já que o rombo é repassado para os preço dos itens expostos nas gôndolas.
Quem acompanha o dia a dia dos supermercados não tem dúvidas: no máximo, os mecanismos de segurança vão atenuar as perdas. Com grande fluxo de pessoas, não há clima nos supermercados para punir com rigor aqueles que são apanhados cometendo furtos ou destruindo mercadorias nos estabelecimentos. Os lojistas temem que escândalos recorrentes acabem expulsando a clientela de boa índole, que garante o faturamento. A punição mais efetiva só ocorre quando funcionários são flagrados desviando produtos — o que é mais comum do que muita gente pensa.
Vilões
Ainda que os repasses das perdas para os preços não sejam mensurados pelo setor, eles despontam, indiretamente, como vilões para o orçamento das famílias. “Os investimentos na área de prevenção de perdas nos supermercados são cada vez maiores. Mas, na falta de políticas públicas eficientes, que levem as pessoas a terem receio de roubar as lojas, os clientes pagam um custo embutido nos itens que levam para casa”, diz o gerente do Comitê de Prevenção de Perdas da Abras, Marcos Manéa. Ele ressalta, contudo, que o problema não é exclusividade do setor. Os furtos são generalizados. E, para surpresa de muitos, clientes que menos aparentam são os que roubam mais. Homens vestidos de terno e gravata e madames não se acanham em levar para casa itens pelos quais não pagaram.
Para os supermercadistas, parte significativa das mercadorias desviadas abastece o comércio informal. “Há pessoas que vão às lojas para furtar uma peça de picanha, que custa quase R$ 30 o quilo, para vender na informalidade. Recentemente, abordamos um homem que tentava sair da nossa loja com sete pedaços de picanha dentro de uma mochila. Meses antes, ele tinha tentado roubar bacalhau”, conta Givanildo de Aguiar, gerente do Super Veneza, no Cruzeiro.
Produtos de maior valor agregado costumam ser atrativos para o mercado informal. Itens de menores dimensões, fáceis de carregar, também são vulneráveis. Lâminas e equipamentos de barbear são alvos preferenciais de quadrilhas, conta Aguiar. “Algumas mercadorias ficam muito expostas, o que acaba facilitando o furto”, acrescenta.
Na avaliação dos empresários, as perdas bilionárias podem ser classificadas como “o inimigo dentro de casa”. “É um desafio diário, porque tudo que entra na loja foi pago a fornecedores. Trabalhamos sempre para otimizar o máximo possível nossas operações, de forma que tudo seja processado no caixa”, diz Aguiar. Mas, em muitas ocasiões, os prejuízos podem ser atribuídos aos próprios colaboradores da empresa. “O manuseio inadequado de alimentos e outros produtos compromete a qualidade. Não por má-fé, mas por falta de consciência ou atenção”, avalia.
Não à toa, os segmentos de padaria, confeitaria, peixaria e açougue estão entre os mais suscetíveis a perdas. “São áreas em que ocorrem processos de transformação, e os mercadorias são mais perecíveis. É preciso uma boa refrigeração, manuseio correto, exposição diferenciada e outras particularidades inerentes a cada seção”, explica Manéa, da Abras.
Mas o departamento campeão de prejuízos é o de frutas, legumes e verduras. Um dos itens mais problemáticos é a uva. “É comum o consumidor puxar um pedaço para degustar. Isso não é ético e, além disso, muitas pessoas deixam de levar o produto devido às condições em que ele fica exposto”, pondera Aguiar, do Super Veneza.
Na opinião dele, a conscientização dos consumidores ajudaria a diminuir os prejuízos. “Eles poderiam alertar os funcionários do estabelecimento sobre uma bandeja de presunto, queijo ou outro produto perecível que estivesse fora da área de refrigeração, por exemplo. Uma orientação simples que reduziria os custos”, avalia.
Prevenção
O gerente do Comitê de Prevenção de Perdas da Abras assegura que os supermercados vêm aumentando, expressivamente, os investimentos em tecnologias, processos e atividades preventivas para minimizar os problemas. Câmeras de segurança ajudam a evitar furtos. O sistema de circuito fechado de televisão é o recurso tecnológico mais usado para evitar esse tipo de ocorrência. Cerca de 87% dos varejistas o utilizam. Em 2012, eram 42,8%.
Dados da Confederação Nacional do Comércio (CNC) mostram que, embora representem 2,7% das despesas de hiper e supermercados — o que pode parecer pouco —, os investimentos em segurança vêm crescendo rapidamente. Em cinco anos, aumentaram 137,7%. “Se descontarmos a inflação do período, houve alta real de 80,3%”, afirma Fabio Bentes, economista da entidade.
Veículo: Correio Braziliense