O Carrefour prepara um plano para expandir as operações no Brasil e China e vai divulgar os detalhes no início de 2014, segundo o CEO e presidente do conselho de administração da rede varejista francesa, George Plassat.
"Nosso índice de crescimento nessas regiões provavelmente é insuficiente", diz Plassat, em sua primeira entrevista a um jornal de língua inglesa desde sua chegada à sede do Carrefour, em Boulogne-Billancourt, oeste de Paris, em 2012. "Estamos trabalhando em uma estratégia; esses são grandes países e há muitas possibilidades, mas espero que o plano esteja pronto no início do próximo ano".
Brasil e China são, respectivamente, o segundo e quinto maiores mercados do Carrefour em vendas. Enquanto as vendas na América Latina, incluindo a Argentina, subiram 14% em 2012, caíram 10% na Ásia, incluindo Taiwan e uma pequena unidade Índia.
Plassat atribui grande parte do declínio à desaceleração da economia da China e à mudança na liderança. "A economia chinesa agora direciona mais o seu foco para o interior e é aí que está o futuro".
Desde que chegou ao Carrefour há um ano, o veterano do ramo varejista realizou um diagnóstico impiedoso dos problemas do grupo. Era um grupo desorientado, em que muitos executivos estavam "sedados" pela mão forte centralizadora imposta por seu antecessor, Lars Olofsson.
A rápida adoção por Plassat de uma nova estratégia, sua confiança, a maneira prática e direta e o histórico bem-sucedido na Vivarte - o conglomerado varejista francês que ele fez voltar a dar lucros antes de ir ao Carrefour - reanimaram as esperanças de que a segunda maior rede de varejo do mundo em vendas, atrás do Walmart, enfim estaria sendo recuperada.
Essa esperança de recuperação, depois do declínio de 25% no lucro operacional nos últimos três anos, e a previsão de melhores resultados levaram as ações a subir 60% desde julho, quando atingiram a pior cotação em 18 anos. Ainda é incerto até que ponto essa recuperação é sustentável.
Plassat, que fez 64 anos na semana passada, diz que fará tudo o que pode para criar valor real para a empresa, "mas não vai ser em dois minutos".
Críticos dizem que o Carrefour depende demais dos hipermercados, formato que a varejista reivindica ter inventado em 1963, mas que é visto como ultrapassado.
Plassat diz que o modelo de hipermercado não está morto e que apenas passa por uma crise da meia-idade. O executivo rejeita a ideia muitas vezes levantada de que a resposta é reduzir a área de venda. "Muitas vezes pode perder-se mais em vendas do que a proporção de espaço reduzido", diz.
As atenções também se voltam para saber como o Carrefour vai recuperar as vendas de produtos não alimentícios, que caíram 25% entre 2004 e 2011. Plassat diz que as vendas de produtos eletrônicos vêm caindo em todos os formatos e que "a ideia de que os hipermercados foram mais atingidos do que outros pela queda dos não alimentícios não tem sentido".
Admite, contudo, que, no passado, a varejista se empenhou muito para ficar dentro da moda e ficou muito direcionada a estoques sazonais. "As pessoas não vão ao hipermercado para comprar moda, mas para comprar coisas simples, básicas e práticas".
Até agora, sua estratégia, que inclui dar aos gerentes das lojas mais autonomia e a promessa de baixos preços em 500 produtos básicos, trouxe uma melhora encorajadora na margem de lucro operacional na França, para 2,6% - ainda a metade das do Walmart e do Tesco.
"As margens melhoraram porque reduzimos significativamente as perdas causadas pela má administração - principalmente ligadas a um excesso de estoques que era enlouquecedor - que foram interrompidas", diz.
Ele também promete que a queda nas vendas de produtos não alimentícios "vai se estabilizar" e que a margem de lucro operacional, que ele admite "não estar no nível adequado", vai melhorar nos próximos anos na França.
Ainda mais importante é a adoção de uma rede de abastecimento, integrando hipermercados, supermercados e lojas de bairro com um sistema de tecnologia da informação que será a espinha dorsal do grupo.
Analistas do Credit Suisse estimam que sistemas de tecnologia da informação inadequados levaram a desperdícios de € 350 milhões em 2012 e que conseguir cortar o desperdício pela metade "representa uma oportunidade de pelo menos 50 pontos-base [de melhora] na margem".
Outro problema estrutural é a forte exposição do Carrefour a mercados ocidentais de baixo crescimento - como Espanha e Itália, países afetados por programas de austeridade, que ao lado da França, são 70% das vendas do grupo em 2012, de € 77 bilhões.
Plassat é caracteristicamente áspero ao comentar as ideias de reequilibrar as operações em direção aos países emergentes, algo que ele considera indesejável e irrealista, a não ser quando se trata dos mercados principais do grupo, como Brasil e China. "Vamos ver por quanto tempo os mercados emergentes mantêm alto crescimento", diz, com irritação. "Estou pensando além do curto prazo".
Ele saiu da Colômbia, da Indonésia, da Malásia - sob o argumento de que o Carrefour era pequeno demais nesses países - e da deficitária Grécia, conseguindo levantar € 2,8 bilhões, mais do que se imaginava. Os recursos foram usados para reduzir dívidas e reinvestimentos, em especial, na Europa.
Eric Knight, executivo-chefe da Knight Vinke, um acionista ativista americano com participação de 1,5%, mostrou aprovação. "A saída da Colômbia e de outros [países] ajudou a mostrar que o valor de algumas operações internacionais do Carrefour é substancialmente maior do que o implicado pelo valor atual do grupo como um todo".
Outros veem pontos negativos. "As recentes vendas ajudaram o balanço patrimonial, mas também aumentaram a exposição do Carrefour a mercados mais saturados, nos quais os gastos de capital vão crescer", disse o analista Justin Scarborough, do Bank of America Merrill Lynch, em informe.
Plassat prefere ver a Europa Meridional, com 160 milhões de pessoas, como uma das áreas com maior renda per capita do mundo. "Seria completamente estúpido abandonar nossa posição de mercado [20%] apenas por que se está passando por uma crise no momento".
O executivo rejeita sumariamente a moda financeira prevalecente e diz não ter planos para colocar à venda o Atacadão, bem-sucedida rede no Brasil, nem para lançar ações da unidade chinesa.
Ele pretende demonstrar o valor dos ativos imobiliários do Carrefour - estimado por analistas em € 18 bilhões - desenvolvendo-os, o que pode incluir até projetos residenciais, em vez de vendendo-os ou lançando ações no mercado.
O Carrefour negocia alternativas com o Sabanci, seu sócio insatisfeito em empreendimento conjunto na Turquia, entre as quais a combinação das operações com o Migros, varejista controlado pela BC Partners, um grupo londrino de investimentos em participações. Ele considera "provável" que a situação seja esclarecida" em "várias semanas".
E quanto às relações com o poderoso acionista Blue Capital - empreendimento conjunto entre os fundos de investimentos em participações Colony Capital, dos Estados Unidos, e o Groupe Arnault, veículos de investimento do magnata Bernard Arnault, que detém participação de 16% no Carrefour - a quem Olofsson admitiu ter passado informes quinzenais?
"Sou deixado [livre] para trabalhar, não há interferência", diz Plassat. Seria divertido vê-los tentar interferir.
Veículo: Valor Econômico