Movimento de downtrading, mais nítido entre os consumidores da classe C, se acentua neste final de ano. Varejistas estão preocupados com a redução das margens de lucro
O Yamato, supermercado localizado no bairro do Jabaquara, zona Sul de São Paulo, foi obrigado a alterar toda a sua rotina de compras e ainda buscar novos fornecedores para a sua loja. Acostumado a adquirir 30 caixas (cada uma com 20 unidades) de sabão em pó Omo por quinzena, agora compra apenas cinco.
O caso se repete com o café Pilão, o leite Batavo, o arroz Camil, os iogurtes da Danone, o feijão Guto, o leite condensado Moça e centenas de outros produtos considerados de primeira linha. As compras de marcas líderes foram reduzidas em torno de 35% neste semestre e o estoque das mercadorias de segunda linha, ao contrário, aumentou.
O fato é que, depois da Copa, o consumidor reduziu o volume de compras e também passou a trocar as marcas mais caras por mais baratas. “Esta situação me faz lembrar o período das remarcações, quando os preços subiam cada vez que chegava uma nova remessa de mercadoria à loja e quando o consumidor passou a adquirir produtos de marcas desconhecidas”, afirma Flávio Augusto Pandolfi, sócio-gerente do Yamato.
Assim como o Yamato, outras dez redes de pequeno porte espalhadas por São Paulo, que compram produtos em forma de pool - isto é, em conjunto, para tentar obter preços mais em conta das indústrias-, também cortaram as compras de marcas líderes. “Se eu não participasse deste grupo, provavelmente, já teria fechado as portas. As margens de lucro estão apertadíssimas”, afirma Pandolfi.
A situação exposta por Yamato e outros supermercados de pequeno porte expõe o que o Sincovaga (Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios do Estado de São Paulo) constatou em uma pesquisa realizada neste mês para identificar o comportamento dos consumidores, principalmente da classe C, formada por cerca de metade da população brasileira, neste final de ano, considerando, claro, a situação econômica atual do país: preços e juros em alta e famílias mais endividadas.
Das pessoas consultadas, 51% informaram que diminuíram as compras e trocaram de marcas neste ano e 53,1% passaram a comprar produtos de marcas desconhecidas. Em relação às compras específicas para o Natal, 58% disseram que vão diminuir e 50,5% que vão substituir itens --leia-se procurar produtos mais em conta, de segunda linha.
“O consumidor não tem alternativa, tem de se defender como pode”, afirma Álvaro Furtado, presidente do Sincovaga, entidade que representa cerca de 50 mil estabelecimentos no Estado de São Paulo. “O Natal deste ano será mais pobre, pois o consumidor vai preferir pagar as dívidas. Será novamente um Natal de lembrancinhas”.
Na primeira sondagem do Sincovaga, realizada em agosto deste ano, já havia sinais de que os consumidores estavam comprando menos e também adotando a prática de downtrading de marcas. Na época, 25% dos entrevistados informaram que estavam reduzindo o volume de compras e também trocando as marcas mais caras por mais baratas. Agora, este percentual dobrou.
A pesquisa do Sincovaga também constatou neste mês que as marcas próprias dos supermercados estão sendo mais procuradas por uma parte dos consumidores porque são cerca de 20% mais em conta do que as das empresas líderes.
Das pessoas ouvidas pelo sindicato que trocaram de marcas, 46,9% informaram que as próprias são alternativas para que o orçamento não fique tão comprometido com alimentação - a pesquisa revelou que, para a maioria das famílias (58% dos entrevistados), com renda de três a cinco salários mínimos, o comprometimento da renda com alimentação já representa de 21% a 50% do orçamento.
É bom lembrar que, muitas vezes, a marca própria de um supermercado é produzida por uma empresa líder de mercado. O que significa que o consumidor está comprando o mesmo produto da marca de primeira linha, só que com outra marca e embalagem.
Veículo: Diário do Comércio - SP