Lei de resíduos sólidos preocupa grandes empresas

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Pesadas sanções previstas na legislação levam companhias aos escritórios de advocacia


  
Apesar de comemorarem a sanção da nova política nacional de resíduos sólidos, grandes empresas estão preocupadas com as consequências jurídicas da "responsabilidade compartilhada" - entre fabricantes, comerciantes e consumidores - relativas à destinação ou reciclagem de produtos comercializados. A chamada "logística reversa", estabelecida pela Lei Federal nº 12.305, sancionada no dia 2, tem levado empresas a procurar os escritórios de advocacia, mesmo antes da regulamentação do texto. A apreensão das companhias está nas pesadas sanções impostas pela lei: possibilidade de multa administrativa de até R$ 50 milhões e pena de detenção de até quatro anos dos representantes da empresa, caso ocorra crime ambiental.

 

Normas administrativas estaduais ou municipais já impõem para alguns setores - pneus, baterias de celular, óleos lubrificantes e embalagens de agrotóxicos - a obrigatoriedade do recolhimento ou recompra de produtos já usados pelo consumidor para reciclagem. Esse mecanismo é chamado de logística reversa, ou seja, é a volta do produto das mãos do consumidor para o estabelecimento comercial e, em seguida, para o fabricante. Com a política nacional de resíduos sólidos, pela primeira vez, lâmpadas fluorescentes e eletroeletrônicos terão que se submeter ao procedimento. Por isso, apesar de a Lei nº 12.305 ter entrado em vigor na data da publicação, só valerá a partir da regulamentação por meio de um decreto. De acordo com declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o texto deve sair em até 90 dias a contar da sanção da norma. Mesmo com esse prazo, os escritórios de advocacia já receberam uma enorme demanda das empresas que procuram prevenção a problemas futuros.

 

A sistemática de logística reversa para pneus, pilhas, baterias e embalagens de agrotóxicos estão previstas em resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que são questionadas na Justiça por algumas empresas. Elas alegam que as normas do Conama não têm poder de lei. "Com a política nacional de resíduos sólidos, essa argumentação cai por terra", afirma o diretor do Conama, Nilo Diniz. A advogada Ana Luci Grizzi, do escritório Veirano Advogados, concorda e chama atenção para o fato de a lei deixar expresso que a lista de setores que se submeterão à logística reversa ainda poderá ser ampliada, abrangendo "produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro, e aos demais produtos e embalagens". "Ou seja, a logística reversa pode ser estendida a quase todos os produtos", diz a advogada.

 

A Philips trabalha com a política de logística reversa, mesmo antes da lei, desde 2009, segundo Walter Duran, diretor da área de sustentabilidade da Philips Brasil. Por isso, para a empresa, a sanção da nova política nacional também é um importante elemento de mercado. "Agora, nossos concorrentes também serão obrigados a implantar a sistemática e a ter que arcar com os custos da reciclagem", afirma o diretor. Mas quanto à responsabilidade compartilhada, Duran espera pela regulamentação, "que deve deixar a lei mais clara".

 

Sem a regulamentação da nova lei, os representantes de empresas sentem insegurança jurídica em relação à logística reversa. "Um decreto é importante para estabelecer em qual sequência, em quanto tempo e de que forma os produtos passíveis dessa logística deverão ser tratados", afirma Ralph Lima Terra, vice-presidente executivo da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib). Por enquanto, a recomendação do escritório Mattos Filho Advogados, por exemplo, é que fique estabelecido em contrato quem pagará a conta da operação logística. "Deverão ser estabelecidas as unidades receptoras dos produtos usados e as que vão processar os resíduos. As fábricas, por sua vez, poderão colocar nas embalagens como deve ser feito o descarte desses produtos após o uso pelo consumidor", afirma os advogados Lina Pimentel Garcia e Eduardo Leme. Em caso de descumprimento, fica estabelecida uma indenização a ser paga para o resto da cadeia.

 

A nova política nacional de resíduos sólidos também é comemorada pelo Ministério Público. Hoje, a ação civil pública por danos ambientais é ajuizada pelo órgão contra todos aqueles que, de alguma forma, direta ou indiretamente, contribuíram para o dano, com ou sem culpa. Assim, quando se verifica que um aterro é área contaminada, o MP entra com ação judicial contra o dono da área e todas as empresas ou órgãos públicos que são seus clientes. "Com a regulamentação da responsabilidade compartilhada, ficará mais fácil identificar quem é responsável pelo dano, o que vai acelerar a tramitação das ações civis públicas", afirma Cristina Godoy de Araújo Freitas, promotora do meio ambiente do MP do Estado de São Paulo. "Depois, conforme contrato firmado entre as partes, a empresa acionada pelo MP poderá entrar com ação de regresso contra os demais da cadeia e pedir indenização."
 


Setor de refrigerantes questiona norma paulista

 

O que as empresas mais temem em relação à regulamentação da política nacional de resíduos sólidos é que essa seja uma norma impossível de ser cumprida. As companhias têm levado algumas dúvidas aos escritórios de advocacia, como a possibilidade de um produto vendido no Brasil parar em outro país ou de qual forma obrigar o consumidor a devolver a embalagem. E ainda como as companhias podem ser responsabilizadas pela lei.

 

A experiência vivida em São Paulo pode ser um indicativo do que está por vir. Em 2002, o município editou a Lei nº 13.316, de 2002, que determina a recompra de embalagens pela indústria. De acordo com a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, entre 2009 e julho deste ano, 52 empresas do ramos de lubrificantes, bebidas, materiais de higiene e limpeza e cosméticos foram notificadas em razão da lei. Do total, 20 companhias foram multadas. A norma exigiu que no prazo de um ano as empresas desses setores recomprassem 50% dos resíduos descartados pelos consumidores. Para o secretário Eduardo Jorge, a lei - questionada na Justiça - pode ser cumprida. "Tanto que o setor de lubrificantes acertou um cronograma com a secretaria e cumpriu", afirma. "Estamos abertos a negociações, incluindo de prazos progressivos para o cumprimento das metas e para rever as autuações."

 

A Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes (Abir) foi uma das entidades que entrou com uma ação judicial. Ainda não há decisão. Segundo Paulo Mozart Gama e Silva, diretor executivo da Abir, vários associados foram autuados em milhares de reais por não fazer o recolhimento integral dos produtos, de acordo com a lei. "E o problema não é só o custo da autuação, mas também o problema de cadastro como inadimplente e dificuldade em participar de licitações", diz. "É impossível cumprir as metas estabelecidas pela Lei nº 13.316." O valor da multa é de R$ 250 mil por empresa, segundo a advogada Júlia Behera Rabinovici, do escritório Demarest & Almeida Advogados. "Agora, estamos ansiosos pela regulamentação da política nacional de resíduos sólidos para que o problema não se repita", afirma.

 

A Coca-Cola, por exemplo, vê a política nacional como um avanço, que vai acabar com as dificuldades das empresas em cumprir todas as normas ambientais regionais. "Essa política nacional vai harmonizar isso", comemora o diretor de assuntos governamentais da empresa, Victor Bicca. (LI)
 

 

Veículo: Valor Econômico


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