Novo consumidor quer produtos sustentáveis

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Mais preocupado com questões como, por exemplo, a sustentabilidade, e de olho em inovações como vendas por celular, além da internet, o perfil do consumidor brasileiro tem mudado. Para acompanhar o setor, empresas como a Gouvêa de Souza & MD Desenvolvimento Empresarial trazem a empresários alternativas para desenvolvimento e fomentação do setor. Pela primeira vez o grupo aposta em pesquisas referentes ao interesse do consumidor brasileiro em comprar produtos sustentáveis. A tendência de mercado, já registrada nos Estados Unidos, onde o consumidor paga até 6% mais caro em um produto socialmente responsável, deverá se concretizar no Brasil, acredita a empresa.

 

Outro fator que tem mantido o mercado aquecido e que faz parte dos atendimentos realizados pelo grupo é o crescimento de restaurantes, fast-foods ou comidas pré-preparadas. Neste caso, o Brasil tem ido contra a tendência mundial, uma vez que países como os Estados Unidos têm visto a população voltar a comprar alimentos e prepará-los em casa. Em 2008 cerca de 31% dos brasileiros consumiram algum tipo de alimentação pré-feita - 7% a mais do que o registrado em 2004.

 

No programa "Panorama do Brasil" desta semana, Marcos Gouvêa de Souza, diretor-geral da empresa que leva seu nome, uma consultoria de marketing, varejo e distribuição, conta suas impressões sobre o mercado nacional, suas tendências e expectativas de crescimento. "O que está por vir é muito mais revolucionário", ressalta o executivo, aos jornalistas Roberto Müller, que comanda o programa e faz a entrevista na companhia de Milton Paes, da rádio Nova Brasil FM, além de Márcio Rodrigues, pelo DCI.

 

Roberto Müller: Há quantos anos vocês existem e como definem as necessidades do cliente?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Estamos no mercado há 21 anos e desde o início o nosso foco foi a atividade de varejo. Temos percebido crescentemente que as empresas despendem cada vez mais com serviços. E por conta disso temos trabalhado mais fortemente na área de análise, interpretações e projeções dos mercados ligados a produtos e serviços. Tudo que diz respeito ao crescimento de alimentação fora do lar, por exemplo. Tradicionalmente o que temos no mercado são as grandes redes de supermercados, as lojas de alimentos disputando a parcela da renda do consumidor destinada ao alimento, mas quase todos eles com foco muito grande naquilo que ele compra para levar para casa. E se nós olharmos a pesquisa de orçamento familiar do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) nós vamos ver que no período de 2004 a 2008 a parcela de dispêndio com alimentos fora do lar cresceu de 24%, em 2004, para 31% em 2008. Em apenas quatro anos, tivemos um crescimento de sete pontos percentuais. A competição está migrando do supermercado, da loja de alimentos para o universo dos restaurantes, dos fast-food, das diversas alternativas e formatos de lojas que vendem o alimento pronto para consumo no local ou para ser levado para casa. Isso redesenha o mercado todo de alimento no Brasil, acompanhando um processo que está acontecendo em outros países do mundo. Nos Estados Unidos o percentual de alimentos consumidos fora do lar chega a 48%; chegou a 51% antes da crise. Durante a crise houve uma reversão de processo. As pessoas voltaram a comprar mais no supermercado para consumir em casa, porque seria mais barato. No Brasil nós estamos no sentido contrário: aqui está crescendo fortemente essa parcela que adquire alimentos para serem consumidos fora de casa.

 

Milton Paes: A que vocês atribuem essa mudança?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Primeiro porque houve um aumento da participação da mulher na população economicamente ativa. À medida que ela participa mais ativamente do mercado de trabalho, menos tempo ela tem para realizar atividades domésticas, principalmente atividades que tenham uma alternativa mais conveniente. O segundo fator é exatamente a conveniência: o pensamento de que o consumidor moderno é cada vez mais focado na busca de conveniência. Porque eles multiplicam atividades, eles trabalham mais intensamente e, por causa de um mercado de trabalho competitivo, eles são incitados a cuidar mais de si. Eles usam também mais tempo para procurar divertir-se um pouco mais. Isso tudo faz com que a alimentação, assim como outros serviços, tenham de ser mais convenientes. Então, ao invés de ter de voltar para a casa depois de um dia inteiro de trabalho, e ir para a cozinha, a mulher seguramente quer dedicar mais tempo à família e a si própria, e por isso vai buscar o alimento pré-pronto ou parcialmente preparado para fazer a alimentação da família. Então, é a mulher que trabalha mais, é a busca da conveniência e é também o momento de oferta que acaba estimulando o mercado.

 

Roberto Müller: E você acredita que isso mexeu também com o mercado de restaurantes?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Muito. O setor de restaurantes, fast-foods, todos esses destinados a prestar serviço nessa área têm tido um crescimento muito grande, concomitante com alguns processos que também estão ocorrendo. Por conta disso está havendo uma consolidação desse segmento. Um aumento da presença internacional nesse segmento, uma profissionalização maior nesse segmento. E como resultado de tudo isso, a melhora da oferta do que é feito ao consumidor, que acaba estimulando a própria demanda.

 

Márcio Rodrigues: Você falou desse processo de consolidação do segmento, mas o que a gente vê é que cada vez mais o número de franquias de marca está surgindo. Isso se deve a quê?

 

Marcos Gouvêa de Souza: O processo de formação de grupos através de franquias também é parte do processo de consolidação. Aquele empresário que estava com dificuldade se manter sozinho, agora está partindo para uma rede, então essa rede passa a ocupar um maior espaço no mercado. E isso está acontecendo e tenderá a aumentar um pouco mais. Só que concomitantemente nós vemos alguns grupos de investidores que não eram do setor e estão comprando operações e consolidando negócios.

 

Roberto Müller: Quem são seus clientes? Como eles são orientados?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Nós trabalhamos com cinco frentes bem definidas. A primeira, de consultoria de natureza estratégica e de marketing; a segunda, uma consultoria focada na logística com uma área de pesquisa e estudo de mercado. Há também uma área de treinamento e desenvolvimento, além de um braço, através do Grupo Bittencourt, que enfoca exclusivamente o segmento de franquias. Além disso nós temos uma área muito atuante no setor de eventos: fóruns, viagens internacionais e seminários, onde nós vamos usualmente com os clientes e trabalhamos novos conceitos, visitamos operações bem-sucedidas no mercado internacional com o objetivo de trazer, adaptando-os, conceitos que são vencedores lá fora para a realidade nacional.

 

Márcio Rodrigues: Você citou esses eventos internacionais. Qual a importância disso para essas empresas? Isso tem ajudado no desenvolvimento do mercado brasileiro?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Creio que sim, e a prova é o número crescente dessas nossas viagens. No evento da associação norte-americana de varejo, que é o principal evento de varejo no mundo, em janeiro deste ano, cerca de 180 pessoas viajaram conosco. E em 2011 a expectativa é de que a gente vá chegar a 220 pessoas.

 

Roberto Müller: O que representa sustentabilidade na cabeça do consumidor?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Esse foi o ponto de partida das nossas preocupações. O tema sustentabilidade vem sendo de fato muito explorado. É presença constante na mídia e nos interessou muito discutir que impacto isso tem e terá no comportamento do consumidor: nos seus hábitos, nas suas atitudes, nas suas preferências. Nós temos um evento anual, que é o fórum de varejo da América Latina, que é considerado, do ponto de vista estratégico, o evento mais relevante que se faz na América Latina no setor de varejo. E este ano ele ocorreu nos dias 19 e 20 de outubro no hotel Transamérica, em São Paulo. Para tema central deste ano foi eleita a sustentabilidade. Para que não ficássemos no plano das opiniões, nós desenvolvemos uma pesquisa que envolveu 17 países -como Índia, Japão, EUA, Inglaterra, França, Espanha, México, Portugal, Chile e Turquia, entre outros- para entender como o consumidor vê o tema da sustentabilidade e como essa sua percepção e seu entendimento geram mudanças no seu comportamento e como isso é diferente do que ele fazia anteriormente. Nós estamos na fase de análise da pesquisa e é muito interessante perceber, em primeiro lugar, como sustentabilidade quer dizer tudo e quer dizer nada ao mesmo tempo. Porque é um tema que ainda é hermético para o consumidor. O outro aspecto que nós identificamos é que existe uma curva de aprendizagem e uma curva de maturidade daquilo a que chamamos de metaconsumidor. O metaconsumidor seria aquele consumidor que, além do benefício econômico, tem uma preocupação adicional com a origem desse produto, e nós percebemos que o primeiro momento dessa curva de aprendizagem é o estágio da sensibilidade. "Eu estou ouvindo falar nesse tema, e repito coisas mesmo que eu não entenda nenhuma profundidade sobre o significado real de tudo isso", é o que pensa o consumidor nessa fase, que é um estágio que estamos vivendo de forma ampla no mercado hoje. O estágio final -nós identificamos cinco estágios- é o estágio da advocacia em relação ao tema, que é quando ele se torna um defensor e o seu comportamento é fortemente influenciado pelo que ele percebe e pelo que ele comprova em relação a isso. E o outro aprendizado que temos nesse processo, usando os dados de uma pesquisa que foi feita nos EUA: o consumidor norte-americano aceita pagar uma média ponderada de até 6% a mais em um produto quando ele percebe benefícios ligados a consumo consciente, sustentabilidade. Esse estudo, estamos fazendo pela primeira vez no Brasil, e vamos ter esta medida a partir de agora, além de repetir este estudo a cada dois anos. A predisposição de pagar um pouco mais ainda é pequena, mas a atitude de rejeição é muito mais forte.

 

Márcio Rodrigues: A pesquisa foi feita em diversos países, alguns desenvolvidos, outros, emergentes. Há uma diferença muito grande de percepção de sustentabilidade dentro destes dois polos?

 

Marcos Gouvêa de Souza: a hipótese que nós temos trabalhado é de que essa consciência e atitudes ligadas a sustentabilidade são fortemente impactadas por variáveis e, de uma forma ou de outra, acabam definindo o nível socioeconômico do País. O nível de educação, a maturidade do consumidor, a competitividade do mercado, a renda per capita. Então, esses elementos acabam determinando, mais do que o nível econômico do país, o socioeconômico, e acabam criando as diferenças.

 

Milton Paes: No Brasil, apesar de toda a desigualdade há outras questões que contam. Na bolsa de valores, esse novo mercado é um paradigma sobre a empresa ser sustentável. É verdade a afirmação de que as empresas mais preocupadas com a questão da sustentabilidade passam a ter cada vez mais valor de mercado?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Sem dúvida nenhuma passam a ter maior valor de mercado, o mercado já está reconhecendo. A dimensão com que isso merecia ser considerado eu não saberia dizer ainda, mas é inegável que o volume de informações que se disponibilizam, o processo de informação que tem acontecido e o fato de que alguns fundos internacionais, por exemplo, têm hoje de avaliar práticas ligadas a sustentabilidade antes de definir em quais empresas investirão, faz com que se comece a desenhar uma nova realidade de mercado. São justamente esses os aspectos que nós estamos querendo trazer para discussão, para que se veja de forma mais abrangente o impacto da sustentabilidade nos negócios, não só a partir do que nos parece vital, que é o comportamento do consumidor, mas, de fato, e até de maneira mais abrangente, quais movimentos econômicos e de negócios isso precipita.

 

Roberto Müller: Nesse levantamento vocês devem ter identificado a questão da internet. Como está o consumidor com relação a essa questão? Como está o índice de confiabilidade dele neste canal?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Nós somos hoje no Brasil 88 milhões de internatuas, segundo os últimos dados disponíveis. Deste total, apenas 12 milhões tiveram experiência de compra via internet. Ainda é uma parcela limitada, mas o crescimento do canal para venda é explosivo. Então, o varejo do Brasil está crescendo como um todo, e no primeiro semestre de 2010 cresceu 11% sobre o mesmo período do ano passado. Na internet, o crescimento em vendas chega próximo de 30%. O que está por vir é muito mais revolucionário, porque para os 88 milhões de internautas nós temos 170 milhões de brasileiros que usam celular. São 190 milhões de linhas: 170 milhões delas são de usuários diferentes e eles trazem consigo uma experiência do canal celular que vai chegar rapidamente no varejo na forma de relacionamento, de vendas, de informação, ajudando a desenhar este mercado de uma maneira muito distinta do que nós conhecemos hoje. O impacto que estamos vendo nas vendas do comércio eletrônico será exponenciado à medida que se incorporem outras funções ao uso do celular no ambiente de comércio.

 

Márcio Rodrigues: Esse cenário vai pedir uma mudança da atitude das empresas. As empresas brasileiras estão realmente se preparando para isso?

 

Marcos Gouvêa de Souza: Fortemente. Se tem um legado positivo que o período de hiperinflação deixou é a agilidade, a flexibilidade e o quanto a empresa brasileira está antenada nas transformações que estão acontecendo. Em diversos setores, o Brasil está na dianteira em determinados processos que mudam e que inovam a produção de produtos e serviços. Vou dar um exemplo bem típico: esse universo de serviços financeiros dentro da loja de varejo é algo que nasceu aqui, no Brasil, e se espalhou pelo mundo. Dar crédito à baixa renda, é sabido, é algo que nasceu no Brasil. Este talvez tenha sido o único legado importante daquele período, e fez com que a empresa brasileira de forma geral, e particularmente o varejo, ficasse atenta a essas flutuações do mercado, fazendo com que as empresas que culturalmente sobreviveram ao período se tornassem mais dinâmicas, ágeis, antenadas, acessíveis como nenhuma outra no mundo.

 


Veículo: DCI


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