Reciclagem avança com parcerias

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Caixas de suco e leite aparentemente nada têm a ver com embalagens de curativos e muito menos com telhas para granjas. Apesar de finalidades tão distintas, os três produtos estão mais próximos do que se imagina, graças à construção de cadeias produtivas de reciclagem - estratégia que cresce no país como garantia de acesso à matéria-prima, preços viáveis e conquista de nichos de mercado para bens de consumo com apelo da sustentabilidade. "É uma excelente oportunidade para inovação e desenvolvimento de novos negócios", afirma Rodrigo Pestana, gerente industrial da Suzano, fabricante de papel que instalou em Embu das Artes (SP) uma unidade para extração das fibras das embalagens longa vida descartadas após o consumo dos alimentos.

O material reciclável, fornecido por cooperativas de catadores, é processado para a fabricação de cartão PCR. As instalações têm capacidade de absorver mil toneladas mensais, o que representa 37 milhões de caixas de suco e leite. Com objetivo de viabilizar o projeto, foi necessário identificar um parceiro industrial para fechar o ciclo, lançando produtos finais contendo o material desviado do lixo. "Logo surgiu o interesse da Johnson & Johnson para uso do papel-cartão na embalagem do Band-Aid e a perspectiva agora é ampliar a aplicação para outras linhas de produtos", diz. É realizado um trabalho junto a gráficas para adequação à novidade. Hoje 25% de papel reciclado na Suzano provem de embalagem longa vida, comprada junto a 40 cooperativas de catadores localizadas no raio de 200 km da fábrica. Após a separação do papel, a liga de plástico com alumínio, existente nas caixas, é vendida para produção de telhas.

"É preciso cuidado com a origem do papel", afirma Carlos Souto, diretor de embalagens da Johnson & Johnson. A empresa apoia as cooperativas fornecedoras para a certificação com base no padrão de normas SA 8000, que proíbe o trabalho infantil e em condições análogas à escravidão, além de exigir sistemas de saúde e segurança. A Cooperativa Futura, em São José dos Campos (SP), foi a primeira a receber o selo, depois conferido também para a Cooperativa Aguapé, em Manhumirim (MG). De acordo com Souto, a imagem do produto - no caso, o curativo - deve estar associada à redução de impactos ambientais e sociais. Das 1,3 mil toneladas de Band-Aid produzidas no Brasil para distribuição nas Américas, 30% contém cartão produzido com as caixas longa vida pós-consumo. A iniciativa evita o despejo de resíduos em lixões ou aterros e promove a criação de valor para materiais que antes não tinham uso.

Na Associação Vira Lata, organização de catadores fornecedora da Suzano em São Paulo, o pagamento de preços superiores aos de mercado tem estimulado a separação e o enfardamento das caixas longa vida. "Como falta coleta municipal, sem o incentivo fica difícil e demorado juntar uma carga no volume viável para comercialização", diz o tesoureiro José Antônio Miranda. A indústria papeleira paga R$ 0,37 por quilo, enquanto antes o valor era de R$ 0,25. Com 40 catadores, o galpão processa 150 toneladas de resíduos por mês, com receita de R$ 400 mil por ano. A renda média dos trabalhadores é de R$ 800 mensais.

Além das fibras para o papel-cartão utilizado como embalagem dos curativos, os demais resíduos das embalagens longa vida servem para produzir placas e telhas consumidas na construção civil. O material contendo plástico e alumínio é encaminhado para a recicladora Ciclo, em Araçariguama (SP), onde são produzidas 25 mil telhas por mês, principalmente para galpões de granjas. "Alcançamos melhores características técnicas e acústicas em relação às telhas convencionais de fibro-cimento", diz o empresário Arthur Goldemberg, que montou a fábrica ao lado do sócio João Agnelli para apostar no mercado de produtos ambientalmente corretos e aguarda as medidas práticas da Política Nacional de Resíduos Sólidos para crescer. "Teríamos condições de dobrar a produção se a coleta seletiva aumentar", diz Goldemberg.

"A aliança é pioneira na cadeia de reciclagem", ressalta Fernando von Zuben, diretor de meio ambiente da Tetra Pak, fabricante das embalagens longa vida que investe em tecnologias e novas aplicações para assegurar um destino adequado ao produto após o consumo. A união com a Suzano e a Johnson & Johnson reflete, segundo ele, a coligação de esforços entre diferentes setores empresariais para a implantação da logística reversa de embalagens no Brasil. "Reciclar embalagem longa vida passou a ser oportunidade competitiva na indústria papeleira", diz o executivo.

Além da Suzano, a Papirus, por exemplo, montou recentemente uma fábrica em Limeira (SP), apenas para processar as caixas de bebida descartadas após o consumo. O objetivo é produzir papel-cartão para embalagens de alimentos. De igual modo, a indústria Artevinco utiliza a matéria-prima reciclada para fazer caixas de papelão em Santa Rosa de Viterbo (SP). Já em Camaçari (BA), a empresa Pegada Ecológica processa 1,6 mil toneladas de embalagens por mês para a produção de papel e telha. No Brasil existem 35 recicladoras de caixas longa vida, com faturamento total de R$ 80 milhões por ano - e, segundo von Zuben, há espaço para crescimento. Hoje são recicladas 29% das 12 bilhões de embalagens deste tipo que entram no mercado anualmente. A meta do fabricante é aumentar a recuperação para 35% até 2014.



Veículo: Valor Econômico


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