Plataformas conectam pequenas empresas à grandes varejos

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Produtores artesanais conseguem chegar aos supermercados maiores, assim como o pequeno comerciante tem acesso às indústrias

 

Sempre foi um desafio para as pequenas empresas venderem seus produtos a grandes varejos ou – numa perspectiva inversa – comprarem das indústrias maiores sendo um pequeno varejo. Essas empresas, no entanto, estão ganhando novos aliados: plataformas digitais cujo negócio é justamente conectar pequenos e grandes e facilitar as transações entre indústrias gigantes e varejos menores.

 

O avanço das novas tecnologias e a entrada dos negócios no mundo digital explicam em parte a criação de plataformas e marketplaces desse tipo. A demanda crescente por alimentos menos processados, com foco em saúde, também é outro fator determinante – o Brasil já é o quarto maior mercado de produtos saudáveis. Além disso, as pequenas empresas estiveram nos holofotes em 2020, quando foram muito prejudicadas pelas restrições impostas pela pandemia do novo coronavírus.

 

Exemplo de plataforma digital é a Local.e, criada em 2019 e que coloca em contato o pequeno produtor e os grandes varejistas. “Passei um tempo na Europa e, lá, notei que havia muito mais variedade de marcas nos supermercados que aqui”, conta Leila Okumura, cofundadora da empresa e profissional com experiência em inovação e consultoria a grandes marcas dentro e fora do País.

 

“Os pequenos produtores locais estão mais conectados com os consumidores, com as tendências, são rápidos e inovadores e, muitas vezes, até premiados internacionalmente pela qualidade dos produtos”, diz ela.

 

A Local.e não é um marketplace, ou seja, não ocorrem transações na plataforma. Ali, as marcas se cadastram e aquelas que quiserem mais benefícios (como destaque no site ou acesso a conteúdos exclusivos) pagam uma mensalidade que varia de R$ 320 a R$ 390. Há mais de 2,8 mil marcas e 7 mil produtos cadastrados. 

 

Os varejistas – cerca de 850 ativos atualmente – acessam e conhecem as pequenas indústrias e seus portfólios gratuitamente. Para engajá-los com as marcas da plataforma, a Local.e aposta em marketing digital e conteúdo, como relatórios de tendência e sugestões de curadoria.

 

Entre os varejos que utilizam a Local.e para encontrar pequenos fornecedores locais inovadores estão Quitanda, Natural da Terra, Hirota, St Marché, Supermercados Madri, todos de São Paulo, Angeloni (de Santa Catarina) e Muffato (rede supermercadista do Paraná, com lojas também em São Paulo).

 

Curadoria em feiras gastronômicas

A Local.e começou já com o propósito de colocar a experiência de Leila em inovação e consultoria a serviço das pequenas marcas. No começo, em 2018, atuava como representante comercial desse tipo de empresa. Nessa época, Leila visitava feiras gastrônomicas em busca de novos clientes.

 

Foi assim que conheceu, por exemplo, Lucas Pelisoli e sua mulher, Gabriela Mazzucatto, sócios na Troppo!, marca de geleias e compotas artesanais com sede em Santo André (SP), que está trabalhando com a Local.e desde o começo.

 

“Quando a Leila nos perguntou qual era nosso maior desafio, nem precisamos pensar muito: era vender!”, conta ele. No início, fabricando nos fundos da própria casa, Lucas e Gabriela conseguiam produzir cerca de 60 potes de geleia por dia, que vendiam para amigos e em pequenos comércios, como salões de cabeleireiro. As feiras também foram se tornando muito importantes na estratégia da empresa naquele momento.

 

Já na época, Lucas notava um crescimento de interesse em produtos locais e artesanais. Mas a procura cresceu exponencialmente, diz ele, durante a pandemia por dois motivos: a busca por alimentos mais naturais nesse momento de crise na saúde e a aposta do consumidor na qualidade superior do que é feito artesanalmente.

 

“Nossos produtos são feitos com matéria-prima de fornecedores locais. A família que nos fornece morangos produz organicamente. A nossa geleia tem bem menos açúcar que um similar industrializado, sendo composta por 75% fruta”, conta Lucas, que hoje comercializa em 18 Estados e em redes como St Marché, Natural da Terra, Eataly e Quitanda.

 

Pesquisa recente feita pela Local.e em parceria com a Toluna, empresa que estuda o mercado consumidor, aponta na mesma direção: 75% dos entrevistados afirmam que compraria produtos de marcas locais.

 

“Esse tipo de produto funciona como um diferencial competitivo para os varejos, porque cria um sortimento exclusivo (para o cliente final), com o qual a loja se diferencia pelo que valoriza: o local, o regional”, avalia o pesquisador do Mestrado Profissional em Comportamento do Consumidor (MPCC) da ESPM, Marcos Iazzetti, fundador da Nutritiva, marketplace de comercialização de produtos locais e saudáveis para o consumidor final, incubada pela própria ESPM.

 

Gabriela Matos, head de Produtos do supermercado Quitanda, em São Paulo, concorda. “O Santa Luzia ou o Eataly se diferenciam pelo sortimento importado. Queremos que o Quitanda seja voltado para o pequeno e o local.”

Quitanda é um dos varejos parceiros da Local.e, e Gabriela se diz entusiasta das marcas locais. “Praticamente todos os meses aprovamos em nosso comitê algum produtor novo”, conta ela.

 

Quando o pequeno é o varejo

A relação entre pequenos e grandes também precisa de apoio quando os pequenos são os varejistas e os grandes, as indústrias. Para intermediar e facilitar as negociações nesse caso, nasceu a plataforma Souk, pela qual gigantes como a Seara, por exemplo, vendem diretamente – e pelo celular – para a padaria de bairro ou o pequeno mercado.

 

Em 2018, quando começou, a Souk tinha um propósito diferente: resolver um problema da indústria de proteína animal com relação a produtos com “data crítica”.

 

“Passados 1/3 do período total de validade, grandes cadeias já não compram, mas o alimento ainda está longe de vencer”, explica Roberto Angelino Filho, CEO da Souk. Assim surgiu a ideia de oferecer esse produto a comércios em que o tempo de giro do estoque seja menor, como uma padaria ou mercado pequeno, que não compra com a mesma grande antecedência que uma rede grande e poderia aproveitar melhor a vida útil do alimento.

 

A indústria, no entanto, não tem toda a capilaridade necessária para atender o pequeno varejo, que é bastante pulverizado. A Souk faz a ponte e, ao contrário da Local.e, funciona como um marketplace: as compras e lances são feitos na plataforma, que se remunera com um porcentual da transação.

 

O processo de negociação é como num leilão, com preços mínimos e lances. O varejo pode propor valores também, e a plataforma está no ar em todos os dias e horários. Muitos aproveitam essa facilidade para negociar à noite e nos finais de semana: 27% das negociações são feitas fora do horário comercial.

 

O sistema da Souk está conectado com os das indústrias cadastradas na plataforma e conta com 23 mil varejos e serviços comprando pela plataforma. São açougues, padarias, supermercados pequenos (de até 9 checkouts), buffets, pizzarias.

 

Lojas e comércios (que são tradicionalmente mais difíceis de a indústria atender com um bom nível de serviço) são a maioria na Souk, caso dos varejos localizados no Nordeste, que respondem por 45% do volume transacionado.

 

Em 2022, a Souk quer dobrar seu tamanho: atender 50 mil varejos, ter mais 10 novas indústrias na plataforma e multiplicar por dois o volume atual de transações, que está na casa das 51 mil toneladas negociadas.

“Assumi a operação para liderar a expansão, que é também interesse da indústria. Nove entre 10 fornecedores querem aumentar sua distribuição”, avalia Roberto Angelino Filho, CEO da Souk.

 

Fonte: Estadão


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